sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

"Comentadores e Comendadores: a propósito de uma polémica recente envolvendo dois deles" [Texto em construção]


Colaborador mais ou menos regular das edições da antiga Editorial "Caminho", nviei recentemente para a prestigiada revista "Vértice" [que, sempre muito delicadamente entendeu não publicá-lo argumentando com a natureza demasiado temporal do assunto] um texto que eu acabaria por republicar aqui no "Quisto" envolvendo a figura do chamado "comentador político" nos "mídia" designadamente na televisão.

Argumentava eu [e continuo, aliás, a manter inalterado esse ponto de vista e esse posicionamento teórico de base] com o que entendo ser uma de várias perversidades ínsitas, ao menos de forma latente e potencial, ao dito "comentário"---a principal das quais é essa ideia implícita de que a informação deve vir de origem interiormente "significada" e, nessa forma chamemos-lhe "direccionada" chegar ao respectivo destinastário.

Até que me provem o contrário [e acho difícil que tal seja possível mas enfim] este princípio implícito no dito "comentário" tal como ér praticado entre nós, designadamente pela RTP, a televisão pública, de que cada notícia possui uma espécie de "significado" ou de "significação" prévias, últimas ["ultimativas", "ultimate", em inglês] e intrínsecas, no fundo, independentes da possibilidade de os indivíduos formularem livremente juízos sobre a realidade [ou direccionando e, desse modo, no mínimo tendencialmente restringindo] essa liberdade enquanto valor básico de cognicionalidade idealmente transmissível à consciência cidadã nas múltiplas formas que esta objectivamente assume, devendo os sujeitos da "notícia" e, em geral, da "informação" ser, neste qu7adro, na perática, de um modo ou de outro, sempre, por esta via, chamados a pronunciar-se não, de facto, objectiva e autonomamente sobre ela mas sobre ela e esse "significado... significado" que, na origem, lhe é "colado" atenta de forma perversa [objectivamente perversa, ao menos, repito] contra o princípio abstracto da liberdade intelectual dos indivíduos e não contribui, por isso [pelo contrário!] para comunicar à cidadania enquanto prática em si princíos teóricos abstractos de rigor e independência cognicional básica que norteiam o pensamento científico legítimo.

Algo que se me afigura, pois, especialmente grave, como posicionamento teórico ou epistemológico de base, volto a dizer, numa sociedade que se pretende precisamente "do Conhecimento".

Ligado a esta "perversidade objectual" do "comentário" como sucedâneo da do debate não-significado e não-mediado---não-capturado à partida---existe essa outra que está configurada na ideia tácita de que o conhecimento, para além de ter um significado opriginal que pode estar situado ao menos de modo objectivo para além da própria possibilidade de cada um aceder directamente ao real e a partir dessa leitura directa dos sinais que ele emite formular os seus próprios juízos e definir, assim, o seu próprio modelo ou inteligência autónomos um e outra da realidade; ligado as esta disfunção de episteme a que chamei "perversidade objectual" latente neste paradigma de "informacionalidade significada" em vez de "significável", dizia, existe um outro que é o de que o número de juízos que se podem formulçar sobre o real se achar também objectualmenten pré-definido, originalmente quantificasdo---e, por conseguinte, limitado.

Num modelo de "informação significada", eu sou levado a formular os meus juízos sobre o real de forma chamemos-lhe "materialmente oblíqua" não construindo a minha inteligência do real prpropriamente sobre ele mas reportando-a e fundamentando-a num conjunto de juízoa já existentes que, ao menos de modo potencial, constituem fronteiras possíveis à [e, sobretudo, da] liberdade cognicional dos indivíduos.

O perigo é o de eu não estar já, no contexto do paradigma de "informação" ou de "informacionalidade comentada", a produzir juízos efectivamente sobre o real mas sobre outros juízos previamente "plantados" no percurso material da minha liberdade de pensar e determinar, de forma autónoma e inteleccionalmente livre, representações críticas do real que objectivamente direccionam e "significam", desse modo, o conteúdo estrutural das minhas próprias representações e, num âmbito mais lato, do meu próprio modo de ver e de conhecer ou de 'cognicionar' o real ---o qual modo fica, assim, de algum modo objectivamente demonstrável, refém deles.

O próprio [e artificialíssimo!] "debate" [de que se faz mais recente eco o "Público" de 21.01.10] através de um texto do director de informação da televisão pública] em torno da ideias de determinar quem é verdadeiramente responsável pela término de, pelo menos, um desses programas ditos "de comentário político" serve para multiplicar esse efeito originalmente deformante que eu entendo estar sempre perigosamente em potência do modelo.

De facto, a questão... em questão não é a de saber se, terminado o programa onde um cidadão vinculado a um determinado partido e a uma determinada área do espectro político nacional, o 'respeito pela democracia' a que se encontra obrigada, em princípio mas, sobretudo, por princípio, uma televisão pública exigira ipso facto que terminasse outro programa a que se encontra associado o nome e a presença, a figura, de um segundo "comentador" [representando?] um ponto ou segmento distinto do referido espectro.

A questão remonta muito clara e muito determinadamente à própria ideia de que apenas duas daquelas áreas ou segmentos tenham acesso ao "comentário" político numa televisão paga pelo conjunto da população nacional.

O que mostra, repito, a diversidade de modos como pode ser feita a "significação" ou, como poderíamos, talvez, mais pomposamente chamar-lhe, a "ressignificação disfuncionadamente estratégica" da opinião numa sociedade que, mau grado tudo isto---todos estes "desvios" e estes mecanismos mais ou menos subtis de direccionação dessa mesma opinião---teima em chamar-se a si mesma, com toda a naturalidade, implícita e explicitamente democrática.

Eu notaria, aliás, que, quando falo em "subtileza" relativamente àqueles mecanismos factuais de direrccionação, estou seguramente a ser não só optimista como, sobretudo, generoso.

Há, com efeito, escassa subtileza num modelo de condicionamento objectual estr[e]itamente dual da opinião que admite que, pelo facto de ter saído um dos comentadores acima referidos, dever "democraticamente", sair ipso facto o outro.

Se, com efeito, eles enquanto "comentadores" se representam a si apenas mesmos e não a áreas ou até mesmo especificamente partidos políticos, que relação pode, em bom rigor e em boa fé, ter a saída de um com a do outro?

Por que há de ea primeira implicar "democraticamente" a segunda?

É fácil perceber a, no mínimo, possibilidade de à opinião dita pública chegar por aquela via e com aquela "disposição selecta e significada" dos termos da equação proposta, a "mensagem" tacitamente já direccionada de que a "democracia em Portugal está toda ali", naquele segmento duplo do espectro.

Algo que vem, aliás, ao encontro da velha [e absurdíssima! Falsíssima! Manipulatória!] "tese" de que, em Portuighal, existem partidos "de poder" e partidos naturalmente... "vocacionados para a oposição" a esse mesmo [desse modo supostamente inamovível e até mesmo "natural"] poder.

A perspectiva de consistente "fechamento democrático" prevalecente, de forma ao menos implícita, pressuposta em ambas as ideias parece-me a mim evidente.

Parece-me evidente e parece-me, mais do que isso, exactamente a mesma que preside, ao longo de todo o percurso onde ela adequadamente se integra, a tal ideia da "informacionalidade significada" como modelo referencial de comunicação mediática onde, por seu turno, tem lugar verdadeiramente "de honra", o tal tão falado "comentário político", chamado por alguns "independente".


[Imagem extraída, com a devida vénia, de cinemastrikesback.com]

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