Morreu João Bénard da Costa!
Era um homem que eu entendia perfeitamente, desde logo, porque gostava de Cinema como eu.
Era um homem que eu entendia perfeitamente, desde logo, porque gostava de Cinema como eu.
Mas foi, também, o tipo que dirigiu esse monumental "O Tempo e o Modo" de que guardo religiosamente vários números (que viajaram, de resto, comigo nesse irrepetível exílio bruxelense de '72) e onde se escreveram algumas das mais estimulantes e, a diversos títulos, mais reveladoras coisas que foi possivel publicar em ditadura.
Não gostava especialmente da área ideológica e especificamente política de onde um e outro, o Homem e a Revista eram originários: esse "catolicismo de esquerda" ou de... quasi-esquerda de onde saíram Lurdes Pintasilgo e o próprio Bénard e que, em ditadura, simulava muito bem--"à distância", pelo menos--a Discordância e, às vezes, mesmo a Revolução.
Preferia-o, porém, de longe (e respeitava-o sem chegar a "amar" qualquer deles) ao jesuitismo espesso e sempre muito viscoso da "Brotéria" para já não falar obviamente do histérico e repulsivo voluntarismo dos Nogueiras Pintos, Júdices e quejandos, representantes electivos do lado "viva-la-muerte", sombrio e trauliteiro, do Cristianismo "político" de que Bénard e a citada Pintasilgo, "salazarista crítica" esta última, eram, para sua relativa glória e mérito, a "ala inteligente".
Mas Bénard tinha a qualidade inquestionável de pensar--o que até não era (como, de resto, ainda hoje não é!) nada, como se sabe, habitual entre nós.
Era, também, um homem culto que, todavia, fui muitas vezes, quase involuntariamente, levado a associar, por exemplo, a outro homem da revista: Alçada Batista.
Tratou-se, num caso e noutro, de pessoas, de algum modo, «trágicas» porque nunca conseguiram libertar-se de uma espécie de evidente irrelevância final que marcou as suas diversas tentativas para alcançar a indisputável significação cultu(r)al e que determinou que, tendo alguns óbvios atributos aqui-e-ali, de um modo ou de outro, dispersos, acabem por não ficar ligados a coisa alguma de verdadeiramente importante e definitivo, que possa com inteira propriedade chamar-se, a partir daí, sua.
Claro que Bénard da Costa "foi" a Cinemateca (que nunca partilhou, porém, na realidade, como é sabido, integralmente com o resto do País).
Escreveu, também, coisas interessantes (umas: outras, nem tanto...) entrou em filmes, foi ouvido, andou "por aí".
A grande "tragédia", porém, insisto, é que lhe faltou sempre a Obra--uma Obra.
Talvez não a quisesse, de facto.
Seja como for, fica a faltar-lhe nesta vida.
Talvez, com essa ciência e essa experiência possa, todavia, agora, inverter a situação, na outra que é a sua a partir de agora e escrever, então, o tal livro, realizar o tal filme ou (que sei eu!) compor a tal sinfonia que há-de finalmente consagrá-lo e permitir identificá-lo então para sempre como o Homem que fez aquilo que mais nenhum foi capaz de antes dele fazer.
Por ele, por quanto, apesar de tudo, deixou feito mas também pela desconfortabilíssima impressão que a sua morte vem reforçar de que se vai gradualmente fazendo um inquietante vazio de referências e pessoas à minha volta, espero sinceramente que sim...
Mas ainda que, em qualquer dos casos, o não chegue a conseguir, paz, ainda assim, à sua, apesar de tudo, não ignorável, alma!...
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