Há uma coisa, na política actual [e não apenas portuguesa---isto, claro, dando de barato que Portugal tem actualmente qualquer coisa que se assemelhe minimamente a política e que não seja, pois, apenas uma "economia disfarçada" mas enfim, essa é outra questão que não vem agora ao caso...] e que é o seguinte: que alguém de boa fé e de bom senso possa sequer pretender que vivemos numa coisa parecida com a "Gnoseotopia" que outros, armados com o espantalho da tecnologia que por aí circula copiosamente na forma de "produtos" múltiplos de si, anunciam com trombetas.
Uma "Gnoseotopia" não pode, por definição, assentar na negação básica [eu diria mesmo, tendo em conta certos "modelos civilizacionais" prospectivos ou mesmo supostamente actuais que se pretendem hoje, a todo o custo, impor à História: uma "Gnoseotopia" ou "sociedade gnoseotópica" não pode, por definição, assentar na negação sistémica e verticial] de princípios epistemológicos e metodológicos de ordem estruturalmente científica que têm sempre de constituir a base ou o "chão" epistemológicos da Política.
A Ciência---a rerspectivo conteúdo mas, de igual modo, a respectiva formas] não podem, em caso algum e em momento algum, operar na História das sociedades gnoseotópicas como um concorrente e muito menos como um adversário da Política.
Como muitas vezes tenho dito, é natural [de facto, é inevitável!] que quando o Conhecimento passou a ser consistentemente integrado na História dos povos e das civilizações como um proto-capital e uma propriedade privada legítima [protegida por um Direito próprio que serve de "quilha" angular sistémica na divisão das classes em possidentes e não possidentes relativamente aos 'meios de produção' de conhecimento, primeiro e de capital, a partir dele, depois]; quando assim é, dizia [e é de facto assim!] é inevitável que os modos comuns de conceber e representar a realidade não obedeçam aos mesmos princípios de rigor epistemológico, analítico e metodológico na formulação das representações básicas daquela que presidem aos modelos teóricos dela concebidos a nível genuinamente científico.
Co-existem hoje regularmente mesmo nas pretensamente gnoseoformes sociedadeas do "Ocidente" duas ciências ou duas "cienciações" pasralelas---dois modos de representar globalmente o real, conforme as classes sociais.
E nem o facto de hoje a escolarização das massas populares ser infinitamente mais ampla do que há um século altera esta realidade "esquizofrénica" e discriminatória na medida em que, constituindo os 'meios de produção de conhecimento' a referida propriedade e possuindo eles reconhecidamente o referido estatuto de 'matéria-prima' essencial no processo de transformação contínuas de saber em "valor", aos dispositivos e instituições educacionais, em geral, sobretudo de natureza pública, fica reservado apenas o património inerte [as escórias do mesmo] desactivado no contexto do referido processo.
Ainda não há muito, debruçando-me sobre esta mesma questão a partir da análise breve de um texto do "Público", eu aqui reflectia sobre essa mesma "esquizofrenia gnoseomórfica" da qual resulta e na qual radica a ficção [seria mais exacto dizer: o embuste político comum] de uma---muito apenas suposta, pois---"democracia cognicional", uma 'figura teórica' [e prática!] porém, na realidade e pelas exactas sistémicas razões que tenho vindo persistentemente a apontar, por definição, impossível nas sociedades ocidentais de hoje.
Na "base" destas, em geral, não circula topicamente [é a minha tese, pelo menos] nem ciência nem modos demonstravelmente científicos de aperceber e repreesentar em abstracto a realidade.
Circulam produtos inertes do conhecimento e circulam ecos avulsos [metodológicos, epistemológicos e por aí adiante: meros revérberos ou "silhuetas neo-platonizantes"] da verdadeira Ciência, "enclosed" económica, social e políticamente "mais acima na sociedade".
É isso que explica que um modelo civilizacional absurda---obsessivamente!---disfuncional e cegamente economocrata possa passar por representação teoricamente consistente e até mesmo inevitável nos dias de hoje.
Um paradigma civilizacional [houve quem, antes de reflectir uns instantes sobre o tema, lhe chamasse um "fim de História"] que assenta, por um lado, na subversão total , completamente absurda, do papel natural da propriedade [que é o de operar como uma variável funcional e funcionante crucial no processo ecológico de possibilitação da Vida, não o de agir, exactamente ao contrário, como uma constante de um anti-processo puramente arbitrário que se lhe antepõe e, no limite, opõe] e, por outro, na imposição de um conjunto ou teoria de "leis" meramente "económicas" àquelas que são, leis ínsitas ao funcionamento normal da realidade; pretender, dizia, que qualquer destas coisas ou mesmo ambas "fundamente" consistentemente um modelo ou paradigma civuilizacional é, não só absurdo como [e a própria realidade assim, de forma persistente, "teoreticamente subvertida" a cada passo o documenta] literalmente suicidário.
Pretender, para dar um exemplo no âmbito desta segunda completamente aberrante "epistemologização ou entroncamento epistemológico" básico do paradigma civilizacional que os homens como as máquinas sejam temporariamente---sejam estrategicamente--- "desactivados", sujeitando ritmos biológicos já nem digo apenas teoricamente correctos e adequados mas, na realidade, básicos, primários, como o comer e o abrigar-se das condicionantes ambientais [o frio, o calor, a chuva] a ritmos aleatoriamente económicos [as famosas "crises" que, como tantas vezes tenho dito, também, muito mais masis do que "crises" são circunstâncias cíclicas, ínsitas do próprio modelo e mais: são mesmo circunstâncias progressivas que apenas podem agravar-se à medida que as disfunções orgânicas crescentes, inevitavelmente resultantes do processo tópico de integração do Conhecimento---na forma de Técnica e Tecnologia---na História tornem o próprio modelo ulteriormente irrealizável e, por conseguinte, objectivamente impossível]; pretender coisas dessa natureza, dizia, e pretender que elas fundamentem sistemicamente o próprio modelo só pode ser pacífica e, sobretudo, passivamente aceite por uma sociedade que da Ciência como teoria da realidade e da sua utilidade orgânica [que é também especificamente política, claro!] possua um [des] entendimento pouco menos do que anedótico e, em última análise, quase exclusivamente "de ouvir dizer"...
[Na imagem: o túnel de Queensway, na Irlanda]
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