Decide-se, hoje, ao que parece, no dia em que Tellexea Maya, refugiado basco em Portugal [com o estatuto de cidadania incompletamente definido, aliás, diga-se de passagem] vem lembrar a lei 'anti-trerrorista' espanhola, mantida em vigor pelo actual governo dito 'socialista' de Zapatero e afirmar expressamente a existência de tortura exercida sobre os detidos políticos no país vizinho.
Sabe-se como a ideia, o conceito, de tortura é, em última análise, algo 'volátil' e facilmente manipulável pelo poder político.
À semelhança da própria noção de "socialismo", aliás.
Ainda não há muito, num blogue 'irmão' deste se recordava a figura de Karl Bernstein, o "socialista" alemão que foi, durante algum tempo, a 'porta' oficial de entrada do grande capital financeiro germânico no domínio da política.
Aquele fez, com efeito, aí uma espécie de 'contagem de espingardas' social e política---um verdadeiro estágio ou 'tirocínio' experimental para o seu projecto de "capitalismo total" que atingiria o trágico apogeu que se conhece com Hitler e o nazismo.
A verdade é que os autoritarismos históricos dos anos '20 e '30 [as 'ditaduras tópicas', o projecto de 'capitalismo político' que, à época, vigorou e atingiu o poder em vários países europeus e até asiáticos] se encontram hoje---formalmente, ao menos---ultrapassados no "Ocidente" o mesmo não tendo, porém, demonstravelmente, acontecido com a tortura.
A tortura que, entretanto, por acção de um farisaico e meramente "decorativo" pudor "de superfície" mudou de nome---chamando-se, nos nossos dias, coisas francamente menos tenebrosas e, algumas, até aparentemente 'nobres' como "leis anti-terroristas" e/ou "defesa dos valores da democrcia e da liberdade"; a tortura, essa manteve-se, no essencial, intacta e incólume, indiferente à acção dos grupos de defesa dos direitos básicos da dignidade humana.
Em nome daqueles móbeis exteriormente incontestáveis [quem, com efeito, não é contra o terror exercido como arma política ou, em abstracto, pela defesa dos valores da liberdade, hoje em dia?] cometem-se [cometem-nas alguns estados como tal!] todavia, verdadeiras barbaridades inomináveis e exacções igualmente sem nome que deveriam merecer dos verdadeiros defensores da democracia e da autêntica liberdade a mais firme e veemente repulsa.
Estados há, com efeito, que aprisionam e fazem reféns povos inteiros e/ou "assassinam selectivamente", na abjecta linguagem com que mascaram hipocritamente a carniça a que confessadamente se entregam quantos a isso mais activamente se opõem, "protestando" indignados sempre que as selvajarias a que chamam políticas e [mais grave, ainda, Política, com maiúscula] são denunciadas e repelidas, com a repulsa que merecem, em qualquer parte onde haja pessoas realmente livres e com sentido de civilização e humanidade.
Agora, é Tellexea Maya quem vem recordar como, aqui mesmo "ao lado", o ciclo ou 'círculo de sombra' persistentemente existente por trás da aparência cívica e civilizacionalmente saudável e "limpa" de democracia e progresso continua activo a martirizar seres humanos, alheio às determinações do estado de direito completamente indiferente, ao que se pode crer [a sombra em causa é, pelos vistos, espessa] aos imperativos do Direito e da Justiça.
Os GAL, uma tenebrosa "invenção" socialista espanhola, foram oficialmente extintos, sabe-se; a verdade é que puderam existir, existiram mesmo e sabe-se, também, que os seus principais responsáveis estavam sedeados no próprio centro do poder político "democrático" espanhol.
Curaram-se, miraculosamente, quantos [e não foi apenas um---um sistema, ele próprio terrorista, de eliminação de inimigos como aquele não nasce nem vive da acção de um único indivíduo] nessa altura armaram e puseram em prática a arma de morte em causa?
É falso, infundado e até inverosímil o que afirma Tellexea Maya?
Mas, mesmo que possa, no limite, sê-lo, podem, por seu turno, os actuais poderes judicial e político português dormir descansados, com a consciência fundadamente tranquilizada, oferecendo até mesmo só à "simples" possibilidade avançada por Maya seres humanos que, pelo mero facto de sê-lo, merecem que não se "joge aos dados" a sua dignidade e não se "lavem pilatianamente as mãos" da garantia básica de que a sua integridade física e moral se encontra defendida e/ou inequivocamente assegurada?...
Eu sou frontalmente contra a extradição dos bascos detidos recentemente em Portugal para um país onde demasiadas coisas sugerem que pode, afinal, existir violação objectiva, prática, não declarada mas real, de direitos humanos que defendo como pressuposto essencial de dignidade e civilização [afinal, temos ou não uma Justiça própria??!] e não hesito em assumir a responsabilidade pessoal, cívica e política, de vir afirmá-lo publicamente, em nome da defesa da democracia, da liberdade e dos direitos humanos.
Eu sou contra: e tu?
[Na imagem: "Abu-Ghraïb Is A Place On Earth", colagem sobre papel de Carlos Machado Acabado]
4 comentários:
Tudo é, aliás, facilmente manipulável pelo poder político. Neste caso, é a questão da justiça, da paz, da democracia e, em termos gerais, a questão da verdade e dos direitos humanos. Direitos sim, mas uns têm mais do que outros; humanos sim, mas só na medida em que uns é que são humanos. Os outros lá terão outra definição, neste caso serve a de terrorista. Quanto à verdade, como há os que se arrogam donos da mesma e há outros a quem interessa que assim seja, não tenho muita fé nessa necessidade de tranquilizar a consciência…Direi mesmo que, no caso de certos poderes, aquela terá uma constituição diferente, ou talvez seja à prova de intranquilidade… Quanto a mim, porque ainda não empenhei a consciência (e espero não estar a faltar à verdade), obviamente que sou contra a extradição desses presos. Se há justiça, se temos justiça, que cumpram a sua pena aqui!
Manuela
Pelo menos até ao dia em que vir um português, suspeito de "terrorismo", preso nos EUA, ou mesmo em Espanha,ser extraditado para Portugal... sou contra.
Depois, só nessa altura, poderei rever a coisa.
Abraço.
Ezul: pois e é precisamente esse tipo de "coisa" que amarga diariamente a nossa percepção típica da realidade em volta e torna a consciência, a da nossa própria impotência para mudar, no fundo [com blogues ou sem blogues, com blagues ou sem blagues...] o que quer que seja e a que vamos tendo da própria realidade como tal, um autêntico e, por vezes [demasiadas vezes!] insuportável produto tóxico que temos de respirar regularmente... se queremos continuar a respirar.
Mas o "se" com que acaba o seu comentário dá que pensar, não dá??
Tudo leva a crer que DEVIA ser o começo de uma coisa qualquer, se [outro "se"...] "as pessoas", como agora se diz, quisessem verdadeiramente que alguma coisa deixasse de ser o que desgraçadamente é para que outra coisa diferente e bem melhor pudesse começar.
Mas isso...
"A porcaria é tão quentinha, não é mesmo?!---perguntou o escaravelho" ["a muck bed can be so cozy, don't you think?, the bug asked"] poderia ser uma frase tópica de uma qualquer "Alice no País da Canavilhas" neo-socrática e pós-moral passada neste fétido Portugalzinho menor, cavacudo, tarambana e embezerrado de hoje, alimentado a colheradas atrás de colheradas de TVI e doses sólidas de José Lello, quando as primeiras falham....
E, olhe, "lá vamos, cantando e rindo, «levados», «levados», sim!..."
[E COMO somos---e gostamos de ser!---«levados», meu Deus!...]
Samuel: "Perish the thought, old chap!"
Um português terrorista??!!!
"Jamé!"
"Pel' amor de Deus!", como diz uma tia minha.
Um português terrorista??!!
Isso é ainda mais improvável do que uma ministra da educação competente ou um "socialista" de esquerda!!!
Nós ainda somos um país de brandíssimos costumes, valha-me Deus!
Brandimo-los orgulhosamente na nossa relação regular com a consciência e a moral em geral.
Pois, que raio há-de uma pessoa fazer com os costumes se não for brandi-los??!!
Para que raio serve um costume, sobretudo se for bom, diz-me lá!...
Se calhar, íamos estragá-lo, usando-o, não??!!
'Tá bem, 'tá!!...
Saudações cordiais aos dois!
Ocorreu-me, a propósito da "não justiça": o que é feito de um tal I. Morais? Já "voou", não?
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