domingo, 7 de março de 2010

"Falar de História Hoje é Falar Inevitavelmente de Esquerda---breves Reflexões Pessoais sobre o Papel Político e Civilizacional da Esquerda, Hoje"


Um texto de Teresa de Sousa no "Público" de Sábado, dia 6, fornece-me o ensejo adequado para completar uma linha de pensamento que vem de uma entrada anterior.

Tem a ver com aquilo a que a autora não designa expressamente deste modo [eu sim!] ainda que seja essa, "en fin de partie" a ideia que expressa: tem a ver, então, com uma "esquina" ou "vértice" possível da História que, imprevistamente, acha Teresa de Sousa se aspresentou, nos nossos dias, ao que chamo "World, Inc." e ela "mundo global de hoje" ou coisa que o valha.

A ideia, em síntese, é: após o colapso dos regimes de Leste, houve dois grandes movimentos ["tectónicos", na feliz expressão de um tal Farred Zakaria, editor da "Newsweek" internacional] que percorreram "Global" [ou... "Capital"?...] City", essa grande 'empresa privada' ou 'hipermercado transnacional com produção própra integrada" [versão funcionalmente liberalizada da velha ideia germânica de "totaler kapitalismus", outrora tentada, com os resultados que se conhecem, quando surgiu na História recorrendo a outros meios abertamente mais... "musculados] em que se tornou o mundo após-Berlim: um primeiro, envolvendo, ao que parece, um "ensaio de voo" autónomo de "uma tal Europa" que "não há, todavia, meio de" subir [esta última observação é exclusivamente minha: Zakaria, ao invés, parece achar que sim, que "subiu mesmo"---tenho de confiar em Teresa de Sousa, neste ponto: não leio a "Newsweek"...] a tentativa; um segundo disparo da tal tectónica de placas geo-políticas envolvendo um projecto de firme "fechamento económico-político" a partir de Washington; e, por fim [?] um terceiro com o eixo determinante recentrado "meio a Oriente, meio... não" num conjunto de economias "emergentes" que vão do Brasil à China e desta à Rússia e à ìndia.

Segundo o que está pressuposto na visão global de Zakaria [e de Teresa de Sousa, que descobre, aparentemente muito surpreendida, que, afinal, "o capitalismo é compatível com um regime totalitário"...] nada disto envolverá qualquer mudança verdadeiramente de "significado" na estrutura e no paradigma económico do mundo.

Mais "América", menos "Europa"; mais "China" menos Índia ou Rússia", tudo se passaria, segundo o que posso inferir estar subentendido nesta perspectiva de abordagem analítica e analítica, do mundo geo-económico contemporâneo, tudo ficaria na essência, tal como está em termos sistémicos e de relações de produção.

Ora, aquilo que eu acho é que não tem necessariamente de ficar---e aqui é que entra a tal ideia de levar um pouco mais adiante a reflexão que sobre estas [para todos nós, como sociedade e como História, relevantíssimas!] matérias faço atrás.

O paradigma de "desenvolvimento" desigual do "Ocidente", assente em duas vertentes básicas: re/produção contínua de capital ou de "riqueza significada" [a única verdadeira produção saída da estrutura industrial/producional do "Ocidente" é o capital] assente, por seu turno, na produção extensiva [e cada vez mais intensiva também!] de "empobrecimento estratégico" [matéria-prima essencial para a produção de "valor", no contexto da i/lógica específica do modelo] e no esgotamento cumulativo persistente dos recursos naturais do planeta [resultado da sua ideia de que é preciso inventar mercados para a produção em vez de adequar, de forma natural, uma produção a necessidades genuínas orgânicas das sociedades humanas]; esse modelo está tecnicamente esgotado, falido.

O próprio facto de ele ter tido de se desdobrar abrindo uma espécie de filial de si mesmo numa área virtual de si chamada "meta-" ou "sobre-economia" sedeada na especulação [algo que está longe de se encontrar inocente da presente "crise" global...] prova-o à saciedade se outros sinais não houvesse--e há.

A sociedade ou mesmo [por que não? A civilização] burguesa revelou-se uma péssima gestora do conhecimento---ela que o usou com particular astúcia e correcção para retirar o poder à aristocracia e justificar a sua própria "prise du pouvoir historique" [ela era, a partir de dada altura, a única classe social detentora dos meios técnicos, do saber na forma de técnica e tecnologia, capaz de gerar riqueza e potencialmente---sublinho: potencialmente!---continuar a alimentar satisfatoriamente a sociedade humana no seu todo]; a civilização burguesa, dizia, em resultado do modo significado como procedeu ao "encaixe de episteme" do Conhecimento na História conduziu esta a um bloqueio cada vez mais evidente.

Em termos marxistas, do que ela fez; do modo como "encaixou politicamente" o Conhecimento na História e, especificamente na Economioa, resultaram padrões objectivamente irrecuperáveis [na... melhoríssima das hipóteses: dificilmente recuperáveis] de disfuncionalidade orgânica no equilíbrio entre o capital constante [saber directamente concretado em tecnologia] e o capital variável [o Trabalho humano] que, reportando inevitavelmente sobre a componente mercado [um homem não pode deixar de se produtor e continuar a ser mercado sem que uma forma de deseconomia qualquer---o Estado "social" repossibilite contínua mas também exogenamente o modelo] acabaram por minar e, a prazo, inviabilizar [estádio presente do processo] a própria outra componente essencial do modelo, o tal "Estado contínua e funcionalmente recapitalizador", conduzindo, no limite, ao tal bloqueio sistémico... dificilmente recuperável, como se vê, previsível e anunciado, do conjunto do modelo.

É aí que entra a Esquerda---o tal "disparo tectónico" de que nem Zakaria nem o seu eco argumentastivo local, Teresa de Sousa, parecem sequer considerar.

Refuncionalizando e humanizando a "figura teórica e civilizacional" da propriedade na perspectiva e com o objectivo de refundamentar por completo o próprio objectivo final da produção humana no sentido de que este deixe de situar-se na exclusiva produção de capital, de "riqueza significada" e passe a operar histórica mas, sobretudo, civilizacionalmente, como uma componente ecológica crucial na possibilitação essencial da Vida que há muito deixou de ter.

É aí que entra a Esquerda colocando a Razão e espercificamente a Ciência, o Saber, o Conhecimento, a Inteligência, efectiva e estruturalmente democratizadas todas essas entidades humanas onde na natureza as forças que originalmente a regiam e/ou regem põem/punham a força física.

É que há, de facto, uma quarta possibilidade "tectónica" que é a da História e a realidade em geral, se tornarem não só habitáveios como, sobretudo, a prazo, possíveis.

O que eu digo, a minha tese, é que tal objectivo não se alcança com "mais do mesmo", mudando simoplesmente o "sítio às coisas" mas conservando intacta a i/lógica que conduziu ao presente/próximo futuro mais do que previsível "fechamento" [por alguns, durante breves instantes, erradamente tomado por "fim"] da própria História.

Por mais Fukuyama e mais Toynbee que a gente tente atirar aos olhos de quem passa...


[Imagem extraída da Net, porém ilocalizável e consequentemente inidentificável]

Sem comentários: