quarta-feira, 7 de abril de 2010

"Pão e Pó: Pátria a Toda a Prova!"


Falemos franco oh deusa
disse ao sol o abismo
[abismo deusa láctea dos corpos]
sem primavera sem
destino

destino ou fado o destino anunciou
seu próprio sangue
seu volume destruído
[que o sangue
---o sangue mesmo, piedosa mentira!---
havia muito coagulara
num único ser
episódico e deserto preso à boca
toda a noite]
pelo sangue continuamente escarrado!

o sangue escarranchado no sorriso concêntrico---corrigiu:
"toda a sede
implantada una e louca na garganta veloz
desértica como uma crítica castidade cobrando continuamente
juros de solidão
---uma faca adormecida em vez de sombra"!...

um nome anunciado
um nome manchado
um nome desmanchado
um nome que era
a sua própria única primavera...

oh este olhar imenso perdido de insecto, disseste
coberto pela própria juventude!
o sangue que se desmancha desmorona
[funde? Dilui? Continuamente]
na [com a?] memória
o insecto ferida aberta da memória
a morte sem som percorrendo já o labirinto álgido da voz
o corpo imediato e impenitente que fala
[rosa púbica "obviamente estrangeira"...]
de um prazer que o corpo não soube libertar.

o dia ardendo de palha
de esquina em esquina
era o verão que se erguia como um corcel de crimes magoados
num silêncio completamente imóvel que era também
a sua própria cicatriz.

as suas próprias cicatrizes
de pão:
de pão era o diálogo sobre o pão e o pão
se erguia do cérebro todo aberto à esperança
brandindo a mão que o tingia de formas e odores
as veias/folhas os músculos da côdea
a solidão

diálogo e palidez
pó e pedras: o medo
a rampa intacta de tristeza
o ocasional grito inútil
do perder-se.

Era à tarde: o sol, preso ao papel onde morria,
lentamente iniciava a viagem intensamente pálida
do ritmo: ar água
mar mágoa
lar frágua
---a paisagem a toda a prova!

o grupo quase ilimitado dos ruídos prorrompendo
o desespero intenso do voo preso ao vento
descrevendo círculos de pura opala na espuma álgida da brisa
primaveril.

Os cabelos brancos da aurora completamente desfraldada
desfolhada
luz a luz pela mão sábia do silêncio:
silêncio vocação do peito prisioneiro
o corpo rouco de sentir em vão
abrindo maduro na espuma de um espelho
incessante que bate!

Ah! Voltou a pátria à pátria

de uma só primavera
oh saudade:
devias estar em casa, de novo, oh saudade!


[Na imagem: "Prometheus Unbound", colagem sobre papel de Carlos Machado Acabado]

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