sábado, 17 de abril de 2010

"Verdadeiramente inimaginável..."


... a aterrador o que está a acontecer aqui ao lado em Espanha, com o Juíz Baltasar Garzón!

Espanha nunca foi capaz de enterrar os mortos da sua recente Guerra Civil.

É natural, numa guerra para mais ainda tão recente.

Num certo sentido [sempre potencialmente desestabilizador e por isso perigoso, concedo] é até bom que tal nunca chegue a acontecer.

Quando, com efeito, alguma consequência subjectiva, individual mas também colectiva, histórica, do ódio não sobrevive ao próprio ódio o resultado é invariavelmente o regresso, a prazo, deste e é nesse sentido preciso que falo da necessidade cultu[r]al, civilizacional de interromper algures o trabalho de enterrar os mortos a fim de que alguns deles permaneçam como monumento mas, sobretudo, como memória de si mesmos e da Morte em geral.

Não em abstracto---em geral.

Eu sempre disse, no caso concreto da Guerra Civil espanhola que num sentido moral profundo a República nunca deixou de ser o governo legítimo espanhol.

Foi deposta---foi assassinada!---num levantamento sesdicioso nunca verdadeiramente punido como a traição que é [ao país e à democracia] e foi o próprio usurpador quem, tendo-se apoderado do poder e do próprio país, escolheu a quem quis entregá-lo---e entregou-o naturalmente a quem melhor lhe convinha.

Neste sentido, repito, a República espanhola permanece ainda hoje como regime moralmente legítimo do país.

E enquanto aos criminosos democraticidas não for expressamente reconhecido o seu papel de tumor politica e historicamente maligno enquistado no seio da História de um país que dele, tumor, fez depender todo o curso ulterior da sua vida pública e política não poderá dizer-se que quanto ocorrer em Espanha neste âmbito destá limpo de mácula e é politicamente mas sobretudo ética e civilizacionalmente inatacável.

É aqui que entra Garzon e é aqui que entra o lado negro, sombrio; o lado viva la muerte y viva la abjección" espanhol que Garzon tentou limpar definitivamente, numa arrojada iniciativa sobretudo simbólica e sobretudo catártica e colectivamente redentora.

Que o não tenho podido fazer impressiona, assusta---e, acima de tudo, deslegitima e e envergonha toda uma sociedade, todo um país!

A mim, impressiona-me e assusta-me---mas felizmente não me envergonha porque hoje e sempre estarei com Garzón.

Contra o "viva la muerte" pelo "viva la civilización y la dignidad"!

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