sábado, 29 de maio de 2010

"Gostaria de habitar as várias esperanças ou Uma casa abrindo continuamente sobre a noite" [Repoetização de um Texto Anterior para E.]"


Gostaria de habitar um dia primaveras
oh meu corcel memória esposa anil majestade de cristal
colheita de consumíveis sombras paisagem infirmada luar indiferente

dá-me a tua mão

imperfeito firmamento ou arco em lágrimas
noite paralisada
[que as armas viram florir e logo depois expirar...]

dá-me a tua mão

hora morta por asfixia ou ausência verde
estrela corrompida fadiga infecta
cobardia inútil
ou passado
infecundo e nímio
incesto inerte

dá-me a tua mão

incerteza cilíndrica
fronteira de luz
natureza digital
auspício ou norma
desfortuna informe

dá-me a tua mão

velha natureza dorsal
empréstimo subentendido
de luz
ou rápida cor
ave ou indústria
sopro
respiração muito jovem
sol revolto
prisioneiro fatal do próprio
curso

dá-me a tua mão

ciclone em fogo
ou boca da cidade
quadrante em pó
peito berço flor da morte
por onde os silêncios invadem progressivamente o corpo
e o lavam dos sons que já não tem

despojo assinatura
cadência de luz
muito jovem incerteza
coração inconsútil
ou vento abandonado à sua sorte

dá-me a tua mão

alva árvore
ou braçado de esplendores
cálculo de sangues desfiados
numa mão de puro ónix
o corredor dos dedos eriçados

...................................................................

Eu gostaria de habitar as primaveras de um povo
onde se movessem sempre as aves
e as águas
um povo vagabundo
da aurora fazer corpo palavras e lugar
para viver

como uma árvore indulgente
ou um sol de alumínio
ao labirinto do tempo ir buscar
o sol para roer
e a boca para amar

e entre hemisférios
[os breves hemisférios da respiração...]
na demasiada juventude construir finalmente
a nossa casa de diurnos sempre espaços ou de estrelas
abrindo continuamente sobre a noite!...


[Na imagem: "A Realidade Existe?", colagem sobre papel e cartão de Carlos Machado Acabado]

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