segunda-feira, 20 de julho de 2009

"Stop The «Europe»! I Want To Get Off!"

Algumas notas avulsas, hoje:

. Nota: uma notícia do "Público" de 09.01.08 intitulada "Leiria admite suspender aulas em casa mortuária" onde se começa por dizer que (e cito): "A Câmara Municipal de Leiria está a suspender as actividades extracurriculares dos Marinheiros, freguesia de Marrazes, depois de um grupo de pais ter protestado contra o facto de as aulas se realizarem na casa mortuária local" [sublinhado meu].

Só não percebo é porquê!

Não vivemos nós num autêntico "país de Marias de Lurdes" onde é, de facto, quase impossível (até a um cego!...) não ver que a coisa mais parecida com uma Escola (tal como tende a ser a "Escola" sucática típica, cada vez mais dirigida---ou cada vez mais "teleguiada"---à medida dos interesses de lobbies de poder económico e político local que na realidade nada têm a ver com Cultura, constituindo-se, isso sim, muitas vezes, como poderosíssimas redes de influência e empreguismo regional agora autorizados por lei a alargarem a sua influência directa aos próprios locais onde a Educação "é produzida" e adquirindo, assim, por força da própria Lei, a propriedade efectiva daquilo a que Marx poderia perfeitamente ter chamado "os meios de produção social dos paradigmas concretos, materiais, históricos, sociais e políticos de educatividade"...)?

Não vivemos nós num país "de pedreiras e pedreiros" onde, na realidade, o melhor simile para a própria Educação como tal é, afinal, um cemitério (um cemitério da qualidade pedagógica, do rigor e da idoneidade técnicos específicos, da democraticidade das práticas educativas---ou até sequer gestionárias e/ou administativas) lá levadas a efeito e, de um modo, geral da desejável autonomia técnica e científica dessas mesmas práticas como tal)?...

Então... por que cargas de água é que hão-de, agora, vir embirrar com a casa mortuária??!!...

Com a eclosão da gripe A até se pode considerar estarmos, afinal, perante uma notabilíssima economia de meios: se a "educação" no Portugal sucático nasce cada vez mais... já morta, por que não poupar-lhe no cortejo fúnebre, deixando que ela nasça, afinal, naturalmente logo no seu próprio leito-de-morte, poupando desse modo preciosos fundos, necessários para (sabe-se lá!) recapitalizar um banco privado qualquer em dificuldades ou para cobrir os prejuízos de um terminal portuário não menos... qualquer "proibido por lei" de ter prejuízo...

Vendo bem...

2ª Nota: Referente a um outro recorte do mesmo "Público" de 09.01.08 envolvendo o famigerado 'Tratado' vulgarmente designado como sendo "de Lisboa" mas parece que assinado um pouco por toda a parte---e por toda a gente... menos pelos principais interessados (os próprios europeus que nem direito a pronunciar-se sobre a "coisa", como é sabido, tiveram).

E não tiveram porquê?

Muitos de nós, portugueses---a quem a "coisa" foi impingida pela boca abaixo do mesmo exacto modo como as nossas avós faziam com o óleo de fígado de bacalhau quando, em crianças, tínhamos a pouca sorte de cair à cama com uma maleita insignificante qualquer...---muitos de nós, dizia, ignorávamos (muito compreensivelmente, aliás) por que exactas razões a "coisa" teve mais de pacto secreto do que de contrato social transparente e democrático?

Bom, pois, agora já não temos a mínima razão para ignorar.

Explica-nos a que suponho ser correspondente do jornal em Bruxelas (de seu nome Isabel Arriaga e Cunha num artigo intitulado "Referendo em Portugal teria sido encarado como uma traição") que (e volto a citar): "uma eventual opção de Portugal por um referendo ao Tratado de Lisboa teria sido encarada pelos parceiros da União Europeia (UE) como [sic] uma traição e a quebra de um acordo tácito [sublinhado meu] no sentido de assegurar uma ratificação rápida e sem sobressaltos do novo texto".

Inevitáveis conclusões da leitura do excerto: o governo português tem um acordo [tácito ou não: não se percebe, aliás, muito bem como pode uma "Europa qualquer" basear uma matéria tão decisiva quanto esta---que é, de resto, 'fundacional' ou 'neo-fundacional: básica, em todo o caso---do ponto de vista da sua consolidação enquanto (digamos assim: enquanto) «objecto político» autónomo, em acordos não expressos, preferindo-lhes, vá-se lá saber porquê, uns nebulosos entendimentos "tácitos" 'inter pares' que excluem, de forma, aliás, grosseira, o recurso obrigatório e nuclear à Democracia...]; mas, dizia eu, o governo português tem ou tinha na altura---e acatou-o, de resto, escrupulosamente, como se sabe---um "acordo" com uma "tal" mais ou menos misteriosa e abstracta 'União' ("união" de quê? De quem? Obtida como? Com que transparência e idoneidade democrática?) com a qual se acha, aliás, vinculado de um modo, pelos vistos, tão forte e tão decisivo que se sobrepõe, desta forma escandalosamente anti-democrática, ao vínculo que esse mesmo governo (português?...) tem (ou devia ter) desde logo, com a sua própria Cidadania (visto que a esta não se importa---como não é, aliás, difícil constatar...---de "trair" exactamente para não... "trair" o outro)

Mas mais: o referido vínculo "tácito" com o poder ou poderes "europeus" é de tal forma condicionante e levado a sério que determina que o "acordo" em causa se sobreponha mesmo a imperativos básicos de honorabilidade, por parte do governo português que, pelos vistos, não se rala sequer de trair o respeito pela própria palavra, quebrado óbvia e, sobretudo, escandalosamente quando não cumpre aquilo a que se comprometeu em período eleitoral e que era, como toda a gente sabe, exactamente ao contrário do que fez, referendar democraticamente a "coisa"...

A explicação dada por Isabel Cunha para o carácter escandalosamente quase "secreto" da aprovação dada pela "Europa" à "coisa", se outro mérito não tivesse (e tem! Tem, pelo menos, esse de mostrar onde estão as verdadeiras fidelidades e com quem são subscritos os verdadeiros compromissos dos poderes "europeus", ditos "nacionais", hoje-por-hoje; como eles se formam e a quem se vinculam de facto) tem esse de mostrar aquilo que, na verdade, os defensores do tal "Tratado" pretendem a todo o custo que não se perceba, isto é, o modo como a autonomia dos vários países europeus, por um lado mas, sobretudo, a das pessoas, dos cidadãos, dentro de cada um não passam, em última instância, para estes "shotgun Europeans" oficiais de meros instrumentos e utensílios "estratégicos", sim, mas de "estratégias" de interesses pessoais e sectoriais que muito pouco ou nada têm a ver com os autênticos (e legítimos!) anseios dos povos europeus como tal.

Dos Europeus sem aspas...

3ª Nota: Ainda e sempre do "Público", desta vez do de 28.04.09 (Texto: "Opositores ao Tratado de Lisboa ganham terreno no referendo da Irlanda", trabalho noticioso de novo assinado por Isabel Arriaga e Cunha).

Outra vez, a "Shotgun Europe" desta vez num texto que termina desta forma perfeitamente esclarecedora: "Doze [sublinhado meu] países já ratificaram o Tratado por via parlamentar [sublinhado meu]: Hungria, Eslovénia, Malta, Roménia, França, Bulgária, Polónia, Áustria, Eslováquia, Portugal, Alemanha e Dinamarca".

, acrescentaria eu...

Mas mais curiosa ainda é a... "explicação" avançada agora para este verdadeiro arraial de inobservância e despudorado atropelamento de regras democráticas essenciais.

Segundo um deputado europeu (sem "papas na língua, como se pode facilmente constatar pelo depoimento---anónimo...---que presta à jornalista) ouvido por esta a propósito (e cito): "Toda a lógica do Tratado de Lisboa foi garantir que poderia ser ratificado sem recurso a referendos".

Pode-se ser mais claro?

E já agora: sabê-lo-ia já o governo quando se comprometeu com os portugueses a fazer... precisamente o contrário?...

Conhecendo o que dele (e do tipo de pessoa que genericamente o compõe) sei hoje não me espantaria nada, devo dizer...

Mas não fica por aqui o texto do "Público": sempre citando fontes mais ou menos oficiais (agora é alguém descrito como "um diplomata europeu") dá conta da escandalosa chantagem exercida por aquela mesma "Europa" sobre o governo português quando declara (e ainda uma vez, cito): "[...] se o país que fechou o acordo sobre o texto do tratado e lhe quis dar o nome da sua capital [se posicionasse relativamente à questão da sua aprovação reclamando que ele] merece ser referendado, com que cara é que os outros líderes por essa Europa fora dizem que não é preciso referendar?"[mais uma vez, sublinhado meu].

Espantoso, não é?

Espantoso que a questão não se ponha em termos de saber por que credível motivo um tratado que nos vincula (e de que maneira!) a todos não há-de---pelos vistos, em caso algum: é essa a sua... "lógica" fundacional, não?...) ser aprovado apenas se essa aprovação corresponder à vontade democratica e livremente expressa das pessoas para quem---mas não não por quem...---vai ser "aprovado"!

Pois, mas isso é impossível porque (lá está!) seria a violação óbvia da tal "lógica-shotgun wedding" segundo a qual foi confessadamente concebido e que tem sempre na sua base o singularíssimo princípio que diz (ou não diz mas impõe) que país algum (e muito menos, aquele que se prestou à indecorosa farsa de subscrevê-lo em sua própria casa) abra o "saco dos ventos"...

A pressão sobre Portugal é evidente---e verdadeiramente escandalosa!

E repare-se na "delicadeza" e na "diplomacia" da explanação que acompanha a reflexão do tal diplomata anónimo: "Se fosse a Estónia a fazê-lo, talvez não fosse muito grave. Mas se fosse o país que... etc. etc."

Realmente... que valor e significado tem uma "Estónia" qualquer!...

Quase se poderia com propriedade dizer, parafraseando um título famoso que falava de um "país que não é para velhos" que... "esta Europa não é para Estónias".

E vai, pelos vistos, "tant bien que mal", sendo... para Portugais enquanto estes se prestarem a manobras e manipulações indecorosamente anti-democráticas como esta da "aventura jurídico-política" envolvendo a sinuosa aprovação do tal "Tratado"...

Quanto à Irlanda... bem, quanto à Irlanda diz-se, no artigo do "Público" esta coisa verdadeiramente espantosa: não que ela foi a única a agir de forma democrática e leal para com o seu próprio povo ao referendar a "coisa".

Não!

Dela se diz que... "tem o hábito" (Juro! É exactamente assim que diz o artigo! Que a Irlanda "tem o hábito de"!...) "referendar os tratados europeus!"

Estranho, bizarro... insolitíssimo "hábito" este da "transparência" política entendida e constitucionalmente consagrada como um dos pilares básicos da Democracia, não?...

É caso para dizer como num título célebre de comédia ou de farsa, levada em tempos, entre nós, à cena: ao qu'isto chegou!

Não admira que muita gente para quem os valores da transparência democrática e da honestidade política mais elementares constituem, como para este V. Amigo, referência capital de posicionamento cívico e político básico, pensem (tal como, repito, o modestíssimo signatário destas notas) que, e parafraseando, outra vez, um título (desta vez, o de uma peça inglesa dos anos '60 ou '70, à época muito falada) clamem, justamente indignados: "Stop the Europe: I want to get off".

Que é como quem diz: "Parem lá esta "coisa" da "europa" que eu vou mas é a pé para o futuro!"

Pois...

[Imagem extraída com a devida vénia de cartoonstock.com]

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