sábado, 20 de novembro de 2010

"Von Clausewitz em Lisboa"


Numa altura de profunda crise económica e social---que promete, aliás, novos desenvolvimentos, mais gravosos ainda, logo que o Orçamento recentemente aprovado na A.R. entre em vigor e comece a repercutir, de forma directa e efectiva, no quotidiano dos portugueses, um tal sr. Anders Fogh Rasmussen, secretário-geral de uma tal N.A.T.O. vem a Portugal puxar discretamente as orelhas aos governos que arribam, por sua vez, a Lisboa num clima de generalizada [e compreensível e, sobretudo, desejável!] redução dos respectivos orçamentos militares.

Di-lo o "Público" na edição de hoje pela pena de Ana Fonseca Pereira [cf. "NATO aprova roteiro para a próxima década"] que acrescenta ainda que a personalidade em causa vem, de igual modo, anunciar um sistema dito "de defesa" antimíssil, escreve a articulista, "suficientemente poderoso para cobrir o território europeu da NATO e também os E.U.A.".

Defesa contra quê ou contra quem?

Contra o bom senso e as cada vez mais escassas perspectivas e esperanças das pessoas?

Que espécie de sinistra brincadeira vem a ser esta?!

Sempre segundo o "Público", o que está em causa vai envolver um dispêndio confesso de 200 milhões de euros e passa por "unir as capacidades que [os chamados "aliados"] já detêem [em matéria de arsenal de mísseis] e associá-las aos equipamentos que Washington possui".

Depois da ruinosa iniciativa de recapitalização extensiva e intensiva dos bancos privados com dinheiros públicos, envolvendo à força o conjunto da sociedade na "compra" de um sistema clamorosamente incapaz de auto-financiar-se e de auto-gerir-se e que escapa, além disso e como se isso já não fosse suficientemente intolerável, de forma verdadeiramente indecorosa, às obrigações de natureza "social" que vinculam ainda a generalidade das empresas privadas, a iniciativa da NATO de se reunir na capital daquela que é hoje uma das maisfrágeis e periclitantes economias do chamado universo institucional "europeu" assume foros de escândalo e de autêntica provocação.

A guerra é um "jogo" dispendiosíssimo, um tenebroso exercício e "passatempo" de "meninos ricos globais" sem demasiados escrúpulos de natureza ética e civilizacional: países à beira da falência como Portugal não têm dinheiro para "brincar" às guerras no "pátio" global dessas "crianças institucionais" mimadas e mal-educadas, cinicamente 'neo-clausewitzeanas' que são as grandes potências multinacionais, insensíveis aos múltiplos dramas pessoais e sociais que o presente nos traz, gente para quem a paz, quando existe... só atrapalha porque tem o péssimo hábito de estragar bons negócios...

É preciso que tomemos todos, de uma vez, consciência do verdadeiro papel dos exércitos, hoje como, afinal, em tempos passados e que os mais ingénuos creriam também, já agora completamente... ultra-passados.

Esse papel é, ainda e sempre, por baixo das excelentes e pacíficas intenções abundantemente publicitadas, o que potências assumidamente militaristas como o imperialismo britânico ou o expansionismo prussiano e depois nazi cometeram aos respectivos aparelhos militares, ou seja, o de abrir caminho à força para a pilhagem civil subsequente de matérias-primas e para a fixação forçada de mercados e esferas de influência comercial num conjunto de áreas e lugares do globo onde lhes "cheire" que elas podem existir.

Os pactos militares, por seu turno, mais não são, afinal, do que a institucionalização dessa visão sombriamente "funcional" da guerra [ou da ameaça potencial e latente da guerra] como guarda-avançada "estratégica", no caso desta NATO, do projecto neo-imperial de expansionismo comercial... "civilizado" e "pacífico", conduzido pelos grandes blocos económicos em articulação ou mais ou menos negociado quadro de, porém, implacável concorrência e constante partilha de áreas de influência.

É, pois, essencial, muito em particular num momento especialmente grave como aquele que vivemos hoje que tenhamos consciência das forças que estão, de facto, em causa e se movem na sombra por trás de "momentos históricos" como este que, na realidade, são apenas, por tudo quanto disse, outros tantos passos atrás na marcha, já de si titubeante e sempre extremamente irregular, da civilização e de unm modo mais geral do projecto humanista em direcção ao futuro.

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Um bloco militar "defensivo"?

Defensivo contra quê e contra quem?

Que espécie de sinistra brincadeira vem a ser esta?!

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