segunda-feira, 29 de novembro de 2010

"Leslie Nielsen, 1926-2010"


É um daqueles actores condenados a um certo estatuto irregressivelmente secundário e menor porque excessivamente pop devido ao tipo de filme a que o seu nome é, a partir de dado momento, definitivamente associado.

No caso de Nielsen, actor canadiano nascido em 1926 e falecido a 28 de Novembro de 2010, o momento foi o ano de 1980, quando foi incluído no elenco de "Airplane", uma farsa baseada no ultra-famoso "Airport", um filme-catástrofe de enorme sucesso internacional realizado por George Seaton e protagonizado por um elenco de velhas estrelas de Hollywood, algumas delas já um pouco decadentes e francamente menos solicitadas [mas ainda capazes de conferir uma certa "respeitabilidade promocional" reconhecível a este tipo de filme] outras nem tanto como Dean Martin, Burt Lencaster, Van Heflin, Maureen Stapleton, Lloyd Nolan ou Jessie Royce-Landis.

Nielsen, que se estreara no cinema, como intérprete, em "Ransom" de Charlie Telfer, de 1955, protagonizaria, pois, a "charge" que Jim Abrahams dirigiu, como disse, em 1980 e, a partir daí, quando o género filme-catástrofe tendia já claramente para o esgotamento e se tornara mesmo já, sob inúmeros aspectos, uma espécie de caricatura involuntária e constante de si próprio, constaria do elenco de diversas paródias incluidas numa espécie de vago "contra-género" ou "trans-género" que incluiria "citações" paródicas, sempre assentes num registo de cómico muito físico e imediato, muito... "extremo", por vezes integrando uma assumida i/lógica de cartoon, do próprio filme-catástrofe mas não só estendendo-se, por exemplo, ao "gore" ou "extreme" ["Scary Movie"] ou à ficção científica ["2001 a Space Travesty"].

No entanto, os começos de Nielsen no cinema haviam sido perfeitamente "sérios", tendo, em minha opinião, atingido o apogeu da sua "primeira carreira", aliás razoavelmente discreta, ao lado de Anne Francis e de Walter Pidgeon, numa espécie de remota releitura espacial d' "A Tempestade" de Shakespeare, o clássico "Forbidden Planet" de Fred Wilcox [de 1956].

A partir daí, a carreira de Nielsen no cinema pareceu, durante vários anos, condenada a uma certa secundaridade e a um anonimato mais ou menos persistente [transferida de forma substancial para a televisão onde interveio em séries na sua época famosas como "Dr. Kildare" com Richard Chamberlain, "The Fugitive" com David Janssen, "Kojak" com Telly Savallas ou "M.A.S.H." com Alan Alda] quando, como disse, em 1980, é subitamente relançada, naquele registo completamente imprevisto para o qual Nielsen parecia estar tudo menos talhado.

A natureza do cómico por que ficará seguramente conhecido das audiências mais modernas---um cómico, como disse, muito físico, sem grandes complexidades técnicas ou intelectuais, caracterizado exactamente ao contrário pelo imediatismo facilmente identificável [e "consumível"] das referências, pela saturação intencional dos vários dispositivos cómicos, pelos excessos histriónicos e pela assumida improbalidade material dos gags apontando claramente para o desenho animado [interpretou mesmo, num filme de 1997, uma personagem directamente originária desse mesmo universo particular, 'Mr. Magoo']---não exigia muito do actor, jogando antes na desconstrução óbvia e extrema dos objectos fílmicos e cultu[r]ais que citava e sobre os quais cada filme ia incidindo mas, também, da própria imagem de galã que Nielsen trazia imediatamente consigo e que começava imediatamente a subverter mal entrava em cena.

Estava já há algum tempo internado com uma pneumonia e faleceu pacificamente, em Fort Lauderdale, na Flórida, enquanto dormia.

2 comentários:

São disse...

Foi bom poder ler esta resenha da carreira deum actor de que só conheço a segunda parte da carreira.

Que esteja em paz!

Um bom dia para si.

Carlos Machado Acabado disse...

Para si também, São, um bom dia e uma óptima semana.