Revelador, importante para conhecer o modo como funciona realmente, a "máquina" da chamada 'democracia portuguesa' na segunda república reduzida 'laboratorialmente' à sua expressão técnica "pura", ao seu [digamos assim] "esqueleto operativo e operacional", á sua expressão mais descarnada e desencantadamente técnica---liberta, portanto, da necessidade de parecer política onde é, na realidade, simplesmente calculista, interesseira e premeditamente cínica...; interessante e revelador de tudo isso, dizia, o texto dado à estampa na edição de 29.10.10 do "Público", intitudo "Passos Coelho ganha destaque" onde se faz o [in?] discreto lançamento do movimento que há-de [conhecendo nós como conhecemos---e "de ginjeira"!---o modo natural de funcionar das privilegiadas cabecinhas do sempre acéfalo---e, portanto, sempre previsível!---eleitorado português] inevitavelmente levar a pessoa em causa, o tal Passos Coelho de que fala o título, ao lugar hoje ocupado pelo improvável [inefável e indesejável!] Sócrates e que devia, por isso, como agora se diz em "tecnocratês" [refiro-me ao tal texto] ser "case study" da "deriva demomórfica" sofrida pela "democracia" nacional [seja lá o que for que isso signifique mas enfim!...] de forma particularmente aguda de há uns tempos a esta parte no cumprimento da pós-moderna missão que lhe foi atribuída de "public relations" da infra-estrutura economocrata sobre a qual, "tant bien que mal", se encontra obrigada a [sistémica ou melhor: a-sistemicamente!] assentar...
Lendo-o é difícil, desde logo, não imaginar um relato de futebol dos antigos, daqueles feitos na rádio pelos Amadeus Josés de Freitas e pelos Nunos Bráses de saudosa memória, que relatavam os Benficas-Sportingues da época de modo, pelos vistos, quase... premonitório, quase profético, quase... como se lhes tivesse sido proporcionado [por algum "deus desconhecido", como titulava o Steinbeck mas também dotado de um cínico e árido sentido de humor, é preciso dizer] a possibilidade de um olhar sobre o seu próprio [profundamente desencantado(r)] futuro cívico e político, nosso desgraçado presente, afinal...
É, com efeito, para quem como eu colava regularmente, com o febril entusiasmo e a vibrante expectativa dos "verdes anos" [que eram, afinal, em mais de um sentido... vermelhos, mas enfim...] o ouvido [ambos os ouvidos e o coração também!] à rádio; é, dizia, hoje, escutando o relato das "conversações" entre esse tal "pê-ésse" e o tal outro "pê-ésse-dê" [Deus me perdoe mas vou citar Artaud: "Le Théatre et son Double", é outro nome que se podia, querendo ser generoso, aplicar àquilo, à "matéria" do texto, sobre que o autor do mesmo fez, aliás, tese nada menos do que de doutoramento!] para voltar a ter, quase fisicamente audíveis e integralmente exumadas do "cemitério emocional" da devastada memória lusa, as emoções futebolísticas de outrora, agora com pequenas alterações de forma do tipo... "Passos Coelho tem a bola, aplica uma finta num adversário, leva consigo um defesa contrário, agora, dois, ultrapassa a linha de meio campo, corre para a linha de fundo, tenta centrar, não consegue, passa então para um companheiro de equipa, corta a defesa, contra-ataque da equipa da casa, lançamento longo para a esquerda cujo extremo simula ir fintar mas, afinal, entrega a um companheiro do seu lado direito, boa jogada da equipa da casa que continua a vencer pela diferença mínima"...
E por aí fora, por aí fora...
O campo? As Amoreiras ou o Campo Grande de hoje?
O lugar?
O lugar, um qualquer 'ao Rato' ou nesse extravagante condomínio fechado que é a Lapa, essa "Corniche com batatas e grelos", ou noutro qualquer berço de empréstimo de tias semi-analfabetas oriundas "no seu tempo" das Berças beirãs ou alentejoas e entretanto convertidas às delícias do glamour citadino [esse "cosmopolitismo rombo e meio-zarolho" de que o sucatismo vigente é a expressão politiforme e cultu(r)al de eleição...] e de patos bravos com pronúncia enriquecidos a poder de obras públicas, conseguidas por obra e graça de cartão partidário "gold" e com a bênção indispensável de S. Offshore, o santo irlandês padroeiro dos espertalhões de carreira e dos desavergonhados por nascimento e inata vocação...
Em volta, como aqueles melancólicos servos da gleba e mujiks madeirenses que espreitavam boquiabertos---"naturalmente" impedidos de entrar pelo protocolo que a caridade é uma coisa demasiado séria e importante para se deixar nela entrar o povo e começar logo a abandalhar tudo!...---a sessão solene de distribuição de generosas benesses de dadores que [talvez por modéstia, quem sabe? Em Portugal e especialmente nessa imensa colónia penal meio kafkiana semi-encalhada no oceano---naufragada, talvez, a caminho de melhor sorte...---que é a Madeira, tudo é possível!] não quereriam ser vistos distribuindo o produto da sua munificente generosidade; em volta, dizia, todos nós, expectantes, ansiosos por que chegasse ao fim o "jogo" para saber se "os da casa" aguentavam a "diferença mínima" e conservavam a liderança do campeonato ou se, pelo contrário, a equipa visitante lograva fora o triunfo que "não lhe sorria" há já várias "épocas" e ganhava assim o ambicionado acesso aos milhões da liga milionária, no fim de tudo...
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Lendo-o é difícil, desde logo, não imaginar um relato de futebol dos antigos, daqueles feitos na rádio pelos Amadeus Josés de Freitas e pelos Nunos Bráses de saudosa memória, que relatavam os Benficas-Sportingues da época de modo, pelos vistos, quase... premonitório, quase profético, quase... como se lhes tivesse sido proporcionado [por algum "deus desconhecido", como titulava o Steinbeck mas também dotado de um cínico e árido sentido de humor, é preciso dizer] a possibilidade de um olhar sobre o seu próprio [profundamente desencantado(r)] futuro cívico e político, nosso desgraçado presente, afinal...
É, com efeito, para quem como eu colava regularmente, com o febril entusiasmo e a vibrante expectativa dos "verdes anos" [que eram, afinal, em mais de um sentido... vermelhos, mas enfim...] o ouvido [ambos os ouvidos e o coração também!] à rádio; é, dizia, hoje, escutando o relato das "conversações" entre esse tal "pê-ésse" e o tal outro "pê-ésse-dê" [Deus me perdoe mas vou citar Artaud: "Le Théatre et son Double", é outro nome que se podia, querendo ser generoso, aplicar àquilo, à "matéria" do texto, sobre que o autor do mesmo fez, aliás, tese nada menos do que de doutoramento!] para voltar a ter, quase fisicamente audíveis e integralmente exumadas do "cemitério emocional" da devastada memória lusa, as emoções futebolísticas de outrora, agora com pequenas alterações de forma do tipo... "Passos Coelho tem a bola, aplica uma finta num adversário, leva consigo um defesa contrário, agora, dois, ultrapassa a linha de meio campo, corre para a linha de fundo, tenta centrar, não consegue, passa então para um companheiro de equipa, corta a defesa, contra-ataque da equipa da casa, lançamento longo para a esquerda cujo extremo simula ir fintar mas, afinal, entrega a um companheiro do seu lado direito, boa jogada da equipa da casa que continua a vencer pela diferença mínima"...
E por aí fora, por aí fora...
O campo? As Amoreiras ou o Campo Grande de hoje?
O lugar?
O lugar, um qualquer 'ao Rato' ou nesse extravagante condomínio fechado que é a Lapa, essa "Corniche com batatas e grelos", ou noutro qualquer berço de empréstimo de tias semi-analfabetas oriundas "no seu tempo" das Berças beirãs ou alentejoas e entretanto convertidas às delícias do glamour citadino [esse "cosmopolitismo rombo e meio-zarolho" de que o sucatismo vigente é a expressão politiforme e cultu(r)al de eleição...] e de patos bravos com pronúncia enriquecidos a poder de obras públicas, conseguidas por obra e graça de cartão partidário "gold" e com a bênção indispensável de S. Offshore, o santo irlandês padroeiro dos espertalhões de carreira e dos desavergonhados por nascimento e inata vocação...
Em volta, como aqueles melancólicos servos da gleba e mujiks madeirenses que espreitavam boquiabertos---"naturalmente" impedidos de entrar pelo protocolo que a caridade é uma coisa demasiado séria e importante para se deixar nela entrar o povo e começar logo a abandalhar tudo!...---a sessão solene de distribuição de generosas benesses de dadores que [talvez por modéstia, quem sabe? Em Portugal e especialmente nessa imensa colónia penal meio kafkiana semi-encalhada no oceano---naufragada, talvez, a caminho de melhor sorte...---que é a Madeira, tudo é possível!] não quereriam ser vistos distribuindo o produto da sua munificente generosidade; em volta, dizia, todos nós, expectantes, ansiosos por que chegasse ao fim o "jogo" para saber se "os da casa" aguentavam a "diferença mínima" e conservavam a liderança do campeonato ou se, pelo contrário, a equipa visitante lograva fora o triunfo que "não lhe sorria" há já várias "épocas" e ganhava assim o ambicionado acesso aos milhões da liga milionária, no fim de tudo...
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Meu Deus! Assim, se faz "política" no estreito e acanhado Portugal de hoje!...
Os jogos de astúcia e de poder, os expedientes, as fintas, a técnica, a esperteza mesmo a saloia [ou sobretudo, a saloia!] substituiram já de todo [sobre eles até, pelos vistos, se fazem já teses de doutoramento, imagine-se!] a participação cívica, a responsabilidade política e a consciência social!
"A política não é para povos"---diz um...
"Em política, o povo atrapalha, só vem confundir e baralhar tudo!"---responde o outro.
"Sabe lá o povo o que é bom para ele!"---opina um terceiro.
"Se deixassem o povo entrar na consideração formal, efectiva, directa e activa, dos seus interesses, que seria, afinal, da democracia! Onde é que iríamos todos parar?!"---contesta um quarto.
Ou seja: à "democracia-chá canasta" e evento de tias inúteis em desespero para justificar a respectiva existência [o mirífico estado "social" que chegou ao ponto de não ter mais que Sócrates, Silvas Santos e Vieiras da Silva para "defendê-lo"!...] sucede-se, com efeito, a "democracia-condomínio fechado" que é também a "democracia-Liga dos Últimos", com os seus "analistas" e "treinadores de bancada" que parecem saídos de um filme de "terror social e cultural" e essa inimaginável abominação intelectiva e mental que são os "comentários" que acompanham---e "abrilhantam"---regularmente o programa...
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Meu Deus! Assim, se faz "política" no estreito e acanhado Portugal de hoje!...
Os jogos de astúcia e de poder, os expedientes, as fintas, a técnica, a esperteza mesmo a saloia [ou sobretudo, a saloia!] substituiram já de todo [sobre eles até, pelos vistos, se fazem já teses de doutoramento, imagine-se!] a participação cívica, a responsabilidade política e a consciência social!
"A política não é para povos"---diz um...
"Em política, o povo atrapalha, só vem confundir e baralhar tudo!"---responde o outro.
"Sabe lá o povo o que é bom para ele!"---opina um terceiro.
"Se deixassem o povo entrar na consideração formal, efectiva, directa e activa, dos seus interesses, que seria, afinal, da democracia! Onde é que iríamos todos parar?!"---contesta um quarto.
Ou seja: à "democracia-chá canasta" e evento de tias inúteis em desespero para justificar a respectiva existência [o mirífico estado "social" que chegou ao ponto de não ter mais que Sócrates, Silvas Santos e Vieiras da Silva para "defendê-lo"!...] sucede-se, com efeito, a "democracia-condomínio fechado" que é também a "democracia-Liga dos Últimos", com os seus "analistas" e "treinadores de bancada" que parecem saídos de um filme de "terror social e cultural" e essa inimaginável abominação intelectiva e mental que são os "comentários" que acompanham---e "abrilhantam"---regularmente o programa...
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É caso para dizer: "Se isto é um país, antes quero... vinho tinto.
A bebedeira é igual mas a ressaca cura-se em menos tempo"...
A bebedeira é igual mas a ressaca cura-se em menos tempo"...
[Imagem ilustrativa extraída com a devida vénia de pensamentos-dot-de-dot-tudo-dot-um-dot-pouco-dot-blogspot-dot-com]
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