domingo, 21 de novembro de 2010

"«Manifestemo-nos Uns Aos Outros!», «La Contamination Au Noir» ou «Se Calhar Sou Mesmo Anarquista Sem Saber»..."


Começo por dizer que não estive fisicamente na manifestação anti-NATO que decorreu recentemente em Lisboa.

Logo-logo, quando soube que tinha havido uma tomada de posição pública contra a imoralidade e o autêntico escândalo que é o envolvimento directo de um governo português [aliás, manifestamente incapaz de... governar-se a si próprio, atafulhado em problemas e que devia, por isso, estar mas era concentrado no combate às grandes questões internas com o desemprego à cabeça de todas elas mas também, de um modo mais lato, da Saúde, da Educação, da Justiça que são as coisas que interessam verdadeiramente às pessoas e que ele, governo, deixou chegar ao estado deplorável a que deixou]; logo que soube, então, dizia, da manifestação de protesto cívico contra o envolvimento do governo numa iniciativa que, para além do seu carácter indesejavelmente agressivo e que [como se isso já não bastasse!] tem custos elevadíssimos, directamente [através dos encargos financeiros que facilmente se imaginam com a iniciativa em si] mas, de igual modo, indirectamente [segundo a imprensa, o secretário-geral da NATO veio, com efeito, a Lisboa "pedir" que fossem repensados os cortes nos diversos orçamentos nacionais eufemisticamente designados por "para a defesa" e patrocinar---ou anunciar...---um qualquer escudo anti-míssil euro-americano no valor de 200 milhões de euros]; logo que soube, pois, que tinha havido uma demonstração de protesto contra tudo isto, não pude esconder a enorme pena que experimentei por não ter sabido dela a tempo de poder participar.

Devo desde já dizer que perdi, porém, parte substancial dessa mesma pena perante as imagens da manifestação em si.

Segundo as televisões, sem que se perceba muito bem, aliás por quê nem com que fundamento legal e democrático, um conjunto de cidadãos foi impedido de se juntar ao protesto.

Terá sido uma iniciativa policial [permanece a questão de saber quem deu à polícia instruções para tal ou quem lhe cometeu o poder objectivo para decidir ela que devia fazê-lo mas permanece, sobretudo, a questão do fundamento in/existente para um comportamento objectivamente discriminatório que, devo dizer, repudio da forma mais veemente e que, além de tudo o mais, me inquieta, com toda a franqueza, profundamente].

Não vi os tais cidadãos [referidos na informação por "anarquistas"] fazer outra coisa que não fosse manifestar o seu legítimo desejo de juntar a sua às vozes que protestavam contra a iniciativa que virou Lisboa e a vida em Lisboa "da cabeça para os pés" e custa e há-de custar aos seus habitantes [como aos das restantes capitais e cidades europeias em geral] "os olhos da cara" em material de guerra quando não---pior ainda---mais cedo ou mais tarde, em vidas humanas.

Mas, sobretudo, não vi [antes pelo contrário e é isso, acima de tudo, o que me leva a, "en fin de partie", lamentar francamente menos o não ter podido estar presente na manifestação] da parte desta, das pessoas que a lideravam, pelo menos, um gesto de repúdio pelo afastamento dos tais "anarquistas", cidadãos como os outros que apenas pretenderiam manifestar-se engrossando o número dos que faziam questão de tornar público o seu repúdio pela iniciativa---tal como não vi a mínima demonstração de solidariedade para com os objectos da discriminação praticada pelas autoridades.

Vi, mesmo, isso sim, um "steward" identificado pelo colete vermelho que vestia e que, entrevistado por uma das televisões presentes, se demarcou formalmente do incidente e, por conseguinte, do grupo de cidadãos excluídos que---não sei se para justificar as contínuas invocações mediáticas do fantasma de um tal "Black Block" que era suposto invadir Portugal e talvez arrasá-lo de vez [mas em cima do qual, curiosamente, ninguém conseguiu pôr a vista...] teve direito a tratamento "especial" por parte das autoridades [o que, de resto, devo dizer, não me surprende nem no fundo chega própriamente a escandalizar-me: incomoda-me, sim, e preocupa-me ainda mais mas apenas isso---e já não é pouco...]

Terá o [até que provem o contrário, discriminatório] "round up" dos "anarquistas" servido, adicionalmente, para ajudar a sustentar, junto da opinião pública de um país martirizado pela crise interna e externa, a compra dos tais blindados que, afinal, parece que não eram mas que, tão-pouco, alguém pode confirmar se são ou não pela simples razão de ninguém lhes ter ainda conseguido pôr [também a eles!] a vista em cima: comprados para a Cimeira, decidiram... não chegar a tempo--- tendo, pois, começado da melhor maneira, como se vê, a demonstração pública da sua oportunidade e da sua, tantas vezes apregoada, utilidade...

Ora, eu não sou propriamente anarquista---pelo menos, no sentido formal e militante do termo.

Li [e tenho na minha biblioteca] Proudhon, Bakunine, Kropotkine cujo pensamento conheço medianamente e ao qual dedico uma atenção que é, de facto, muito mais intelectual e, por várias razões, algumas delas... boas, distanciadamente crítica do que propriamente empática e/ou ideologicamente próxima tout court.

Não gosto, por outro lado, demasiado do poder [ao actual, abomino-o e desprezo-o, pura e simplesmente!]; voto sempre [aliás, responsavelmente!] por princípio, contra o poder instituído, pelo menos no plano nacional--- e educado naquela espécie de meio-francesa cultura que vigorava nos liceus dos anos '50, não morro de amores pela polícia [seguramente não pela imagem tópica extremamente pouco lisongeira do polícia médio desses tempos que Stuart tão bem "retratou" a poder de paus de fósforo queimado...] nem espero demasiado dela embora reconheça, obviamente, a sua necessidade objectiva, concreta, em termos gerais a fim de assegurar a habitabilidade global do mundo violento em que temos hoje, em geral, de sobre/viver.

Apanho as fezes dos meus cães, não deito papéis para o chão, separo o lixo, não assalto casas, não roubo carteiras, tirando moscas e mosquitos nunca matei ninguém---duvido francamente que precisasse da polícia para conduzir a minha existência diária típica dentro de uma certa ordem que me parece minimamente necessária, em termos de tolerabilidade cívica geral.

Respeito-a, exijo-lhe que me respeite e garanta dentro da medida das suas capacidades a minha segurança pessoal e a dos meus [afinal de contas, sou eu quem lhe paga e pago-lhe exactamente para isso] mas, como digo, não espero demasiado dela.

Espero, isso sim, da Cidadania---da sociedade civil [não... servil] dos partidos de Esquerda, dos verdadeiros Sindicatos [não da fantochada que surgiu na sequência de uma tal Carta Aberta que procurou legitimar a acção de sapa levada a cabo no interior do sindicalismo nacional pelo poder que por via de um conjunto de "ficções sindicais" "quisling" logrou infiltrar-se com evidente sucesso, é preciso reconhecer, no mundo do trabalho] e por aí adiante.

Chocou-me por isso ver como dentro da própria manifestação acabaram por surgir... duas: uma "permitida" pela polícia do mesmíssimo poder contra o qual ela tinha sido organizada, a outra, pelos vistos, vá-se lá saber por quê... nem por isso...

Uma excluída e a outra "protegida", ao menos, simbolicamente da contaminação do "lado negro, mais marginal, da força" pela polícia e que aceitou sem aparentemente pestanejar essa espécie de bizarra "protecção" da ordem que estava ali a contestar---o que fez ao demarcar-se implicitamente dos "outros" optando, i.e. fazendo escolhas e opções para mim perfeitamente reconhecíveis, no próprio momento de aceitar não fazê-lo enquanto organização relativamente ao comportamento de quem aos "outros" discriminava.

...E querem saber? Se lá tivesse estado, provavelmente teria saído da manifestação e teria mesmo acabado por vir mais cedo para casa.

Teria sido, aliás, incidindo muito claramente sobre um conjunto preciso de formas perversamente subtis [ou subtilmente perversas] de violência intelectual e cívica, essa a minha própria manifestação anti-abuso e anti-opressão, anti-intolerância, anti-NATO---anti-tirania---pessoal...


[Imagem ilustrativa extraída com a devida vénia de contadoresdehistorias-dot-wordpress-dot-com]

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