sexta-feira, 6 de agosto de 2010

"The Tripped-Up Civilization" [Incompleto, por rever]




quinta-feira, 5 de Agosto de 2010

Algumas notas soltas:1.


Ainda a propósito do conceito de "solidiariedade funcional" [envolvendo a necessidade de uma profunda---de facto, tal como a vejo: estratégica---reconceituação por parte da própria globalização capitalista da ideia de solidariedade internacionalista integrada na sua própria ideia e no seu próprio modelo estável de desenvolvimento em substituição da velha noção, não-expressa mas amplamente praticada, de desenvolvimento unilateral]; ainda a propósito desse conceito, dizia, encontro no "Público" 04.08.10 duas referências interessantes---e significativas---que retomo aqui porque ajudam a explicitar ulteriormente algumas das ideias que defendo nesta matéria.

Uma tem directamente que ver com o tema que abordo imediatamente a seguir neste "Diário": aquele onde se referem [e se analisam] alguns aspectos da tensão existente em França, desta vez não imediatamente a propósito da "questão" do véu islâmico mas de uma proposta de lei envolvendo a possibilidade de, em certas condições, ser retirada a nacionalidade francesa aos perturbadores da ordem social.

A ligação entre esta lei e a inaptidão dos países da chamada 'União Europeia' de um modo geral para lidarem com as questões levantadas pela imigração maciça de gente oriunda sobretudo das antigas colónias é, a todos os títulos, evidente.

É mesmo esse o cerne da questão, de resto: o modelo de "desenvolvimento descentral" adoptado pelo capitalismo exo- e endo-colonial assenta nuclearmente na «desertificação tecnólogica e produtiva» "estratégica" [aquilo a que também chamo a componente-factor "carencialidade possibilitante de valor"] das nações fornecedoras de matérias-primas e/ou sociedades-mercado---o que arrasta inevitavelmente consigo, rompidos certos níveis de "estase ecoforme" ou "de segurança" entre capital variável e capital fixo dentro e fora das nações ou sociedades envolvidas, fenómenos de "ondulação social" transfronteiriça que acabam conduzindo ao afluxo mais ou menos desordenado de pessoas das economias frágeis para as outras.

Tradicionalmente, as potências colonizadoras foram, a dado passo, percebendo a conveniência de "desenvolver educada ou mitigadamente" as sociedades fornecedoras de matérias-primas mas sempre em função dos seus próprios interesses económico-financeiros e sempre sem que os níveis de investimento em "carencialidade estratégica" baixassem a ponto de permitir um verdadeiro desenvolvimento local e, portanto, pudessem envolver a ameaça de concorrência efectiva, real, por parte das nações colonizadas, fornecedoras de matérias-primas.

Os próprios padrões culturais e cultuais de desenvolvimento associados a factores de ordem política e político-jurídica [independência formal das antigas colónias co a não menos sobretudo formal ascenção do colonizado a cidadão, com direitos e exigências próprios] ou, por exemplo, climáticos assim como, centralmente, à ruptura dos valores 'de segurança' no âmbito da equação capital constante-capital variável levaram a que a partir de dado ponto se tornasse impossível reter na periferia de um sistema global que desertificara económica e social ou até politicamente as respectivas margens grandes massas humanas também perifericamente desaproveitadas pela e para produção.

É precisamente de toda esta situação atrás descrita que emerge a minha ideia de que, às potências que resultaram da reconversão política e obviamente económica das antigas nações colonizadoras; à "Europa" demo-capitalista, desde logo, se torne absolutamente imprescindível, por imperativos de sobrevivência objectiva, integrar no seu próprio paradigma de "desenvolvimento" [que pessoalmente, não aceito e não subscrevo mas estou por razões evidentes impedido pela própria realidade de negar] políticas de investimento incomparavelmente mais "avançadas" no desenvolvimento local a fim de reduzir a fuga de mão-de-obra desactivada ou não-utilizada para o centro, algo que a própria "liberdade" hoje-por-joje formamente garantida aos antigos colonizados torna particularmente difícil de impedir.

Só com recurso a "leis" discriminatórias e brutalmente invasivas como a que agora propõe o presidente francês para tentar fazer face à insegurança cívica suburbana pobre que rebenta constantemente nas mãos da "outra França" ["jovens franceses, cujos pais ou avós, eles sim, foram imigrantes, que não ultrapassaram o estigma da pobreza", diz a autora do texto "Acusado de deriva securitária e xenofobia, Sarkosi prepara nova lei de imigração", Clara Barata, in "Público" de 04.08.10].

No artigo que cito na "entrada" a seguir, fala-se de 40% de desempregados entre estes...

É, portanto um caso evidente em que a política tem de intervir, agora no plano externo, a fim de tentar atenuar os sobressaltos de uma economia que faz todos os dias novas vítimas---e hoje por maioria de razão uma vez que os anteriores mecanismos de "ressocialização estratégica do emprego" ou "uso recapitalizador e ulteriormente possibilitador" do chamado "Estado Social", o expediente keynesiano de enxertar emprego num modelo económico privado que, ligado ao uso significado, privado, da tecnologia o destrói regularmente, deixou, por várias razões, de ser possível com a liberalidade com que tradicionalmente o havia sido...

Outro exemplo, vem do Afeganistão e é a versão militar deste mesmo aspecto em tese conducente à revalorização chamemos-lhe: "educada" ou mitigada do papel da política no Ocidente demo-capitalista e neo-liberal.

É o caso de um texto envolvendo recentes fugas [?] de informação sobre algumas práticas particularmente contestáveis pela sua violência e arbitrariedade da intervenção norte-americana no Afeganistão---fugas essas para a chamada "Wikileaks", uma espécie de "enciclopédia de exacções" ou actos mais ou menos "negros" da actividade militar, desconheço se exclusivamente norte-americana se desta e dos seus... "aliados" militares.

O pormenor, do ponto de vista da atenção humanista que me meve, é irrelevante: exacções e abusos são exacções e abusos e, embora o atutor do artigo "O significado dos Wikileaks e a guerrilha no Afeganistão", Bruno C. Reis, procure manifestamernte "desdramatizar", vulgarizando-os como actos frequentes em todo o género de guerras umas e outros ["Não existem guerras sem crimes de guerra", escreve ele acrescentando, mais ou menos, tranquilizadoramente que "o número de civis mortos (desta) é baixo" entre, calcula ele, 12.000 e 32.000] a verdade é que conforta pouco quem da política [e da geopolítica] possui a visão humanista que aqui se defende e pratica, mesmo 12.000 pessoas, comparadas com as entre 62.000 e 2. 000.000 da guerra do Vietname ou o milhão/milhão e meio da invasão russa é gente demais é demasiada gente civil; são um número dificilmente imaginável [e seguramente intolerável, verdadeiramente imperdoável!] de mulheres, crianças e velhos abatidos "por acidente" no decurso de uma guerra que, diz ainda o articulista, "está a ser difícil" de ser ganha no Afeganistão.

E por quê?

O autor do artigo cita duas condicionantes: a vitória sobre a insurgência guerrilheira exige "boas informações" mas cumulativamente "requer o quase completo isolamento das guerrilhas do apoio exterior".

E interior, permitir-me-ia acrescentaria eu.

Sucede que esse "apoio" interior é muitas vezes [a História recente do colonialismo português, para não irmos mais longe, testemunha-o amplamente] o das próprias circunstâncias objectivas que desencadeiam e/ou potenciam ulteriormente, por seu turno, as de natureza subjectiva que com elas concorrem para reforçar e consolidar e até 'legitimar' na prática, em última análise, a própria guerrilha.Essas condições objectivas podem ser o nacionalismo mas são seguramente também condicionantes de ordem económica, social e política conduzindo, directa ou indirectamente, ao subdesenvolvimento.

Nem de propósito, o mesmo "Público" de 04.08.10 inseria, no suplemento P2, uma reportagem com o carmelita norte-americano Peter Hindle o qual, sendo entrevistado por Alexandra Lucas Coelho sobre o narcotráfico no México diz, a dado passo, com todas as letras:"A verdadeira guerra aqui é a dos ditos "países do primeiro mundo" com os do terceiro, e a guerra do narco é em função dessa, porque o narco entrava em colapso, se não houvesse uma tremenda desigualdade de salários, o empobrecimento do México. Os 'narcos' não poderiam recrutar o exército, ou a polícia, ou os miúdos que não têm trabalho nem oportunidades de estudo".

E acrescenta: "É o que acontecia com as ditaduras apoiadas pelas empresas norte-americanas nos anos 70. E eles estão dispostos a limpar zonas inteiras de gente de forma a garantir os interesses dessas empresas. Portanto, essa é a guerra: as grandes empresas contra a maioria das pessoas [...]

É difícil [de facto, não é: basta procurar na literatura independente...] ter-se um retrato mais fiel das causas profundas do tipo de disfuncionalidade social e política [tendencialnmente política, ao menos] que minam as sociedades-fortaleza do Ocidente de hoje e, ao mesmo tempo, mais eloquente ilustração da minha própria tese da "solidariedade funcional" que, a breve trecho e se esse mesmo Ocidente pretender sobreviver a si próprio ainda algum tempo mais, vaio ter inevitavelmente de substituir o pasradigma de "desenvolvimento unilateral" que tem sido apanágio do paradigma de capitalismo moderno industrial e pós-industrial.

Basta mudar a designação dos países e o tipo exterior de perturbação para se perceber como é, na realidade impossível dissociar o conjunto de ameaças bem reais que, no plano económico, social e político, impendem sobre e ameaçam as sociedades ocidentais do próprio paradigma económico-político sobre o qual assentam as respectivas concepções "desenvolvimentistas".



[Na imagem: Carl Roberts, "The Tripped-Up Man"]

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