[Nota: as imagens que ilustram esta "entrada" foram extraídas de http://www.africanidade.com/ e jpn.icicom.up.pt ] Um texto recente do "Público", assinado pelo Provedor dos Leitores (conjuntamente com uma intervenção do advogado Dias Ferreira num propgrama desportivo televisivo), fornecem-me o ensejo imediato para uma reflexão que há muito venho fazendo sem propriamente verbalizá-la sobre os limites e a natureza (senão mesmo, o fundamento, a epistemologia possível) da liberdade de imprensa, em concreto e sobre uma (a meu ver, inexistente, em termos genéricos mas enfim...) "cultura democrática" minimamente reconhecível, em termos mais amplos.
Começo por esclarecer que o texto do Provedor dos leitores do "Público" incidia sobre uma reclamação do partido "Os Verdes" (partido ao qual me liga a preocupação e, em geral, simpatia devida às questões ambientais, é importante que se precise, no contexto---adiante se verá por que exactas razões) relativamente à alegada exclusão de uma tomada de posição sua do âmbito de um conjunto de reacções partidárias a uma questão que não vem ao caso---nem francamente recordo qual fosse exactamente.
Julgo não trair substantivamente o espírito da resposta do Provedor se disser que esta assentava basicamente, de um modo ou de outro, nas seguintes alegações: que (i) um jornal é, na realidade, uma instituição de direito privado; que (ii) "vende" fundamentalmente um "produto" que são "notícias" e que o "comércio" das mesmas possui regras, pressupostos e imperativos específicos associados ao valor (ou à valorização) "comercial" de cada "produto" a colocar no "mercado" e que, por último, (iii) possui, de igual modo, órgãos próprios cuja função é precisamente triar o material a imprimir, daquela perspectiva essencial (ou daquela perspectiva essenciante) de valorização, respeitando, obviamente, todos os pressupostos de respeito pela verdade dos factos e pela possibilidade de demonstrá-la objectivamente que a lei exige.
Ora, embora... "verde", sou, em boa consciencia, forçado a concordar incondicionalmente se não com a realidade mediática descrita, certamente com o raciocínio do Provedor elaborado e sustentado à luz dela----o que não é de modo algum a mesma coisa mas enfim.
Ou seja: não se pode pretender ter o que usual (ou... tecnicamente) se chama "uma imprensa livre" (privada) e, ao mesmo tempo, desejar que ela deixe pontualmente de sê-lo sempre que estão em causa determinadas situações concretas que consideramos justificarem o que, na prática, colide frontalmente com a própria lógica de 'mercado mediático' (como conceito oposto ao de... "mediatismo monopolista de Estado") que, para muitos, constitui o próprio fundamento e a mais segura garantia da "liberdade" de imprensa, por via da "poliposicionalidade" (ou pluralidade natural e espontânea) do universo mediático como tal que pressupõe.
E eu (que, repito, até "gosto dos verdes" ou melhor da ideia da urgência de um "verde" estável e orgânico em política) não posso deixar de concordar.
O que eu defendo é algo bem distinto: é que (e digo-o com toda a clareza noutro ponto deste "Diário") aquilo por que cada partido e, de um modo mais geral, cada associação cívica com um mínimo de expressão e relevancia na vida comunitária deve lutar é por possuir órgãos próprios, uma imprensa própria (um jornal, uma revista, desde logo: aquilo a que chamo "uma saída comunicacional para o mar"...) por meio da qual os seus pontos de vista sobre a realidade possam, então sim, ser veiculados e a informação sobre as suas posições legitimamente exigida em todos os casos.
Eu, por exemplo, pessoalmente, acho o "Diário de Notícias" (como se sabe, um dos 'clássicos' do nosso pequeníssimo universo mediático) um jornal dificilmente suportável e profundamente antipático, pouco isento e com uma crónica vocação para "órgão oficial das situações, sejam elas quais forem" que o torna leitura literalmente a evitar. É um direito que eu tenho o de me considerar incomodado pelo que entendo ser a invariável falta de isenção de muitas das suas análises assim como ofendido pelo escasso gosto dos seus humores mais ou menos habituais ou mais ou menos dominicais...
Em consequência, não o leio (ou leio-o o menos que posso...) e pronto.
Não tenho é, em meu entender, fundamento material para lhe exigir que corrija, de acordo com o meu próprio conceito e/ou padrão de objectividade, o conteúdo pontual das notícias que publica assim como o ângulo de abordagem dessas mesmas notícias---e poderia citar várias recorrendo, desde logo, às vezes em que ocasionalmente o folheei nestes últimos tempos.
Não lho exijo, pois, nem, de um modo ou de outro, "quero" (como dizer?) realmente "mal" ao jornal: ignoro-o e mais nada.
Ah! E quando quero ler informação com outra isenção e outra qualidade (com aquilo que eu, no uso de um legítimo direito de que não tenciono, em caso algum, prescindir, entendo serem outra isenção e outra qualidade) recorro adequadamente a outra imprensa na qual reconheço, então, a existência de padrões de rigor e objectividade como os que defendo.
Recorreria, desde logo, ao jornal d' "Os Verdes" se estes o tivessem ou se mo tivessem dado a conhecer...
O ónus está, neste caso, a meu ver, portanto, claramente do lado das instituições que se sentem discriminadas: está na sua capacidade (ou na falta dela) para 'chegarem' à sociedade civil, à Cidadania.
Pode-se, é claro (esse é outro aspecto, aliás crucial, da questão!), almejar um outro paradigma completamente distinto, incomparavelmente menos comercial ou mesmo menos industrial, de "Idade Mídia", como lhe chamo: um paradigma marcado pela exigência cívica que é como quem diz pela obrigatoriedade essencial de um serviço público de informação onde o negócio não fosse o único móbil reconhecível e o mercado o único (ou o verdadeiro!) destinatário dos "produtos" mediáticos.
Esse é, de resto, um combate político que passa exactamente pela condição de cada partido ou associação cívica que não se revê no actual modelo de "Idade Mídia" investirem estrategicamnte na hipótese de possuirem órgão ou órgãos ---se não mesmo uma editora---próprios como parte de uma estratégia ampla de intervenção cívica e política que não é sensato pedir à "indústria" como tal que tenha.
Mas eu comecei por falar também de um programa desportivo e de uma reivindicação de "isenção" aí feita pelo representante de um clube aí presente. Foi o caso de o Dr. Dias Ferreira, porta-voz do Sporting Clube de Portugal no programa se ter indignado com o modo como os órgão da chamada "comunicação social" alegadamente tratam o "seu" clube.
Dizia ele que os jornais não deviam concentrar as suas notícias no que ele considera serem "os aspectos negativos" da vida do "seu" clube; que, segundo ele, há quem apenas veja esses aspectos, os empole e por aí fora.
Ora, o problema é exactamente o mesmo d' "Os Verdes", com a única diferença de surgir agora muito mais... "visível" por se tratar de futebol e de clubes "de futebol".
A verdade, porém, é que não se entende muito bem (eu não consigo, com toda a franqueza entender!) com que fundamento sustentável (e acreditável) pode pretender-se que exista por parte de particulares o "direito" de condicionar ou mesmo de tutelar quer o conteúdo das notícias dos jornais, desportivos ou não, quer o ângulo pelo qual empresas privadas de "comunicação" devem supostamente estar obrigadas a abordar os temas dos seus noticiários.
Aquilo que (salvo se existir, obviamente, falsificação intencional de factos ou circunstancialidade comprovadamente difamatória, por exemplo---mas para isso há leis e há tribunais); aquilo que, ia dizendo, substancia, de forma estrutural, o conteúdo das notícias assim como o ângulo pelo qual são abordadas é a própria liberdade de expressão de pensamento expressa na Constituição da República.
Pretender tutelar, mesmo se sob forma indirecta e subtil, essa liberdade (leia-se: esse direito constitucional básico!) equivale, na realidade, a algo que não pode, no limite, em boa legalidade, salvo melhor opinião, por isso mesmo, pretender sequer sustentar-se.
Para escolher as notícias e o ângulo, há, no caso vertente, o jornal do clube (ou do partido).
Para isso é que ele existe.
O que o clube deve fazer (a única coisa que pode legitimamente fazer!) é promover a venda ou a sua difusão desse jornal (ou criar as condições para a propriedade de um canal de televisão, por exemplo, se a sua importância---medida desde logo em implantação popular---o justificar); não tentar influenciar indevidamente a política editorial de órgão independentes: independentes da sua vontade e (ou porque) dotados de vontade própria de legitimidade inatacável, dentro, obviamente, repito, do respeito devido à lei e à verdade demonstrável dos factos.
Diz o porta-voz do Sporting Clube de Portugal ainda que, se fosse poder ou se de/tivesse poder, baniria os jornalistas que dessem notícias que, em seu entender, não fossem as que ele próprio julgasse adequadas.
Francamente, o que eu penso neste ponto é que, tendo cada cidadão-jornalista legimidade constitucional para exercer o seu direito à liberdade de expressão, bani-lo exactamente por exercer esse direito equivale na prática (sobretudo se for esse o motivo expressamente invocado para bani-lo) a tentar coarctar-lhe o direito em causa o que há-de seguramente ter algum significado e algumas consequências em termos legais...
Mais grave: se, invocando ainda e sempre o mesmo motivo, o "banido" viesse a ser a instituição (o jornal, a estação de televisão) não o indivíduo (o jornalista) o caso seria o de uma (então obviamente grosseira!) discriminação ao pretender-se que todo um grupo, um colectivo, uma classe ou subclasse de indivíduos fosse punido pela "falta" cometida por um apenas----o que, volto a dizer, se no primeiro caso já era o que era, se me afigura, então, francamente insustentável como atitude.
Concluindo: também eu gostaria de ver "Os Verdes" mais vezes nos noticiários.
Também eu gostaria de não ver as pessoas que se preocupam com o ambiente e a sustentabilidade da Vida na Terra, apresentadas (tantas vezes ainda hoje sucede...) como "maduros" e "patuscos" que usam rabo de cavalo ou saias até aos pés conforme o sexo e gostam mais das alfaces e dos agriões do que das pessoas...
Também eu questiono o modo como as empresas que "vivem do comércio e da indústria das notícias" (às vezes até as que têm a obrigação formal e estrita do serviço público...) se contentam e contentam as (obviamente muuuuuito!) tolerantes consciências "ambientais" com o pomposo debitar diário de um veloz "minuto verde", passado a galope entre os sempre debatíveis gorjeios de um cantor pimba qualquer e as inavariavelmente originais e sumarentas "declarações" de um ponta-de-lança qualquer, acabadinho de chegar da Ucrânia ou do Brasil...
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