Do Editorial do "Público" de 19.09.10 ["Toda a fome do mundo/Empreendedorismo e «falsos» Empresários", extraio um conjunto de desencantadíssimas reflexões sobre o "empresariado" no Portugal "crítico" [de "crise"] de hoje.
O problema parece ser o de convicção e fé no Estado.
Deixa-me atónito que as conclusões extraídas no texto sejam de natureza tão epifenoménica e casuística e não sejam reportadas a essa difuncionalização consistente da Política e da História e da própria Civilização que foi a extinção do modelo de "Estado Consciência" que era, no fundo, a alma ou o espírito de uma certa ideia [ou ideação de Estado, de "estaticidade"] a que comummente se deu o nome de 'Estado nação'.
'Estado nação' era o corpo do modelo: a sua "alma" e o seu "espírito" estavam nesse «Estado consciência» que era como que a imagem do anterior estavelmente devolvida pelo espelho-écrã da nossa identidade e da nossa consciência colectiva dela.
De cada uma das nossas consciência nacionais colectivas---mesmo nos casos em que estas pareciam oscilar um pouco onde engenharias nacionais forçadíssimas ou traumas recentes tinham feito a sua aparição na História.
A perda da referência do Estado consciência acarretou inevitavelmente consigo a des-integração da identidade e de uma consciência colectivas [da possibilidade de uma consciência estável e consistente do colectivo] onde radicava a confiança no próprio Estado.
[Atente-se, por exemplo, no seguinte: na obsessão neo-liberal com a "avaliação" dos funcionários.
A avaliação dos funcionários com esse carácter de quasi-obsessão programática para o partido da 'direita social' (ou da "esquerda"... "funcional") no poder é uma figura institucional pós-moderna (com aspectos, aliás, absolutamente caricatos como esse de "avaliar" no fim do ciclo de formação académica anterior à entrada na vida activa que não lembrava ao demo pelo desperdício que configura); a avaliação dos funcionários, dizia, com esse carácter de quase obsessão é um fenómeno moderno que substituiu já a velha representação comum da confiança institucional---do Estado nos seus funcionários, destes no "seu" Estado mas, em última análise, do Estado, como coisa pública, em si mesmo e na sua capacidade para formar) tudo isso expresso no sistema de progressão profissional por 'fases', 'diuturnidades' e por aí adiante.
O Estado usa, de facto, a "avaliação" basicamente a fim de pretextuar a desarticulação progressiva de si mas não deixa de ser significativo o modo como ele se vai naturalmente demitindo de formar e em seguida de se considerar vinculado a essa cada vez mais, pela sua parte, inexistente---porque privatizada---formação considerando os funcionários como "gente de fora" que entra e não já, reconhecivelmente, como parte naturalmente constitutiva e integrante de si senão mesmo, idealmente, tout court como outra forma de se referenciar a si mesmo]
Seja como for, a questão da perda de confiança no Estado decorre de forma natural do modo como o estado consciência se foi gradualmente erodindo arrastado na queda pela desarticulação maior do Estado Nação [de que essa outra perda histórica, a do Estado dito social, configura um aspecto cumulativo, a mais de um título, importantíssimo].
Aponta a editorialista do "Público" o dedo da falta de iniciativa ou de vontade dos desempregados e despedidos portugueses para passarem a empresários a "instransponíveis obstáculos" ligados, por exemplo, ao "endividamento" e aos "recibos verdes".
Um economista cujo nome sinceramente esqueci acusava ainda não há muito no mesmo jornal a que pertence o editorial que cito ["Empreendedorismo e falsos «empresários»" de deixar criar pequenas empresas para deliberadamente as sufocar com encargos a fim de provar a "Bruxelas" o seu "empenhamento" e o seu "rigor" na condução das políticas "europeias" ou coisa que o valha.
Sabendo o que sei, não me custa a crer que haja algo de substantivamente admissível em tão [literalmente] maquiavélico desígnio.
A verdade, porém, é que a questão me parece ir bastante além disso---como, aliás, perceberam os homens generosos e cândidos que "fizeram" o 25 de Abril---ou que tentaram fazer dele o que poderia ter sido se houvessem sido percebidos e acompanhados como mereciam quando pretenderam centtrar num corpo bancário estrategicamente nacionalizado o curso ulterior do desenvolvimento económico nacional.
Ou seja: aquilo que eles perceberam e a maioria de nós não percebeu ou não quis perceber foi que com este sistema bancário de agiotagem descontrolada não há economia que resista.
Que vivemos hoje e que protagonizamos, no fundo, passivamente hoje um paradigma economocrata dis e desfuncionalmente "terciarializado" onde a banca não alimenta nerm sequer funcional e secundariamente o desenvolvimento---mesmo o muito des-igual modelo de "desenvolvimento significado" capitalista típico---mas exactamente ao invés se alimenta dele, o preda, consumindo e devorando tudo à sua passagem [os "exemplos" são às dúzias!] criando áreas cada vez maiores de "desertificação estrutural" económica e social que acabaram por conduzir à actual "crise" e pior ainda ao status quo igualmente estrutural completamente desarmado para reagir à tal "crise" de outro modo que não seja através da aceitação do "back kick" ou "coice recessional" que as formas de "combate" atabalhoadamente divisadas pelo poder político para lhe fazer face no imediato anunciam [e preparam!] sem margem para dúvidas.
O problema da confiança é, pois, um problema sistémico: política mas, sobretudo [tendo em conta a natureza inessencialmente ancilar e instrumental da política no Ocidente neo-liberal de hoje] economicamente sistémico---um problema que decorre inevitavelmente das formas de meta-economicização e mesmo de, a vários títulos, des-economicização encontradas pelo capitalismo contemporâneo para sobreviver.
Tudo o mais não passa de "folclore epissistémico" ou mera epifenomenologia.
Enquanto o não percebermos vai ser muito difíccil mdar o que quer que seja na sociedade à nossa volta.
O problema parece ser o de convicção e fé no Estado.
Deixa-me atónito que as conclusões extraídas no texto sejam de natureza tão epifenoménica e casuística e não sejam reportadas a essa difuncionalização consistente da Política e da História e da própria Civilização que foi a extinção do modelo de "Estado Consciência" que era, no fundo, a alma ou o espírito de uma certa ideia [ou ideação de Estado, de "estaticidade"] a que comummente se deu o nome de 'Estado nação'.
'Estado nação' era o corpo do modelo: a sua "alma" e o seu "espírito" estavam nesse «Estado consciência» que era como que a imagem do anterior estavelmente devolvida pelo espelho-écrã da nossa identidade e da nossa consciência colectiva dela.
De cada uma das nossas consciência nacionais colectivas---mesmo nos casos em que estas pareciam oscilar um pouco onde engenharias nacionais forçadíssimas ou traumas recentes tinham feito a sua aparição na História.
A perda da referência do Estado consciência acarretou inevitavelmente consigo a des-integração da identidade e de uma consciência colectivas [da possibilidade de uma consciência estável e consistente do colectivo] onde radicava a confiança no próprio Estado.
[Atente-se, por exemplo, no seguinte: na obsessão neo-liberal com a "avaliação" dos funcionários.
A avaliação dos funcionários com esse carácter de quasi-obsessão programática para o partido da 'direita social' (ou da "esquerda"... "funcional") no poder é uma figura institucional pós-moderna (com aspectos, aliás, absolutamente caricatos como esse de "avaliar" no fim do ciclo de formação académica anterior à entrada na vida activa que não lembrava ao demo pelo desperdício que configura); a avaliação dos funcionários, dizia, com esse carácter de quase obsessão é um fenómeno moderno que substituiu já a velha representação comum da confiança institucional---do Estado nos seus funcionários, destes no "seu" Estado mas, em última análise, do Estado, como coisa pública, em si mesmo e na sua capacidade para formar) tudo isso expresso no sistema de progressão profissional por 'fases', 'diuturnidades' e por aí adiante.
O Estado usa, de facto, a "avaliação" basicamente a fim de pretextuar a desarticulação progressiva de si mas não deixa de ser significativo o modo como ele se vai naturalmente demitindo de formar e em seguida de se considerar vinculado a essa cada vez mais, pela sua parte, inexistente---porque privatizada---formação considerando os funcionários como "gente de fora" que entra e não já, reconhecivelmente, como parte naturalmente constitutiva e integrante de si senão mesmo, idealmente, tout court como outra forma de se referenciar a si mesmo]
Seja como for, a questão da perda de confiança no Estado decorre de forma natural do modo como o estado consciência se foi gradualmente erodindo arrastado na queda pela desarticulação maior do Estado Nação [de que essa outra perda histórica, a do Estado dito social, configura um aspecto cumulativo, a mais de um título, importantíssimo].
Aponta a editorialista do "Público" o dedo da falta de iniciativa ou de vontade dos desempregados e despedidos portugueses para passarem a empresários a "instransponíveis obstáculos" ligados, por exemplo, ao "endividamento" e aos "recibos verdes".
Um economista cujo nome sinceramente esqueci acusava ainda não há muito no mesmo jornal a que pertence o editorial que cito ["Empreendedorismo e falsos «empresários»" de deixar criar pequenas empresas para deliberadamente as sufocar com encargos a fim de provar a "Bruxelas" o seu "empenhamento" e o seu "rigor" na condução das políticas "europeias" ou coisa que o valha.
Sabendo o que sei, não me custa a crer que haja algo de substantivamente admissível em tão [literalmente] maquiavélico desígnio.
A verdade, porém, é que a questão me parece ir bastante além disso---como, aliás, perceberam os homens generosos e cândidos que "fizeram" o 25 de Abril---ou que tentaram fazer dele o que poderia ter sido se houvessem sido percebidos e acompanhados como mereciam quando pretenderam centtrar num corpo bancário estrategicamente nacionalizado o curso ulterior do desenvolvimento económico nacional.
Ou seja: aquilo que eles perceberam e a maioria de nós não percebeu ou não quis perceber foi que com este sistema bancário de agiotagem descontrolada não há economia que resista.
Que vivemos hoje e que protagonizamos, no fundo, passivamente hoje um paradigma economocrata dis e desfuncionalmente "terciarializado" onde a banca não alimenta nerm sequer funcional e secundariamente o desenvolvimento---mesmo o muito des-igual modelo de "desenvolvimento significado" capitalista típico---mas exactamente ao invés se alimenta dele, o preda, consumindo e devorando tudo à sua passagem [os "exemplos" são às dúzias!] criando áreas cada vez maiores de "desertificação estrutural" económica e social que acabaram por conduzir à actual "crise" e pior ainda ao status quo igualmente estrutural completamente desarmado para reagir à tal "crise" de outro modo que não seja através da aceitação do "back kick" ou "coice recessional" que as formas de "combate" atabalhoadamente divisadas pelo poder político para lhe fazer face no imediato anunciam [e preparam!] sem margem para dúvidas.
O problema da confiança é, pois, um problema sistémico: política mas, sobretudo [tendo em conta a natureza inessencialmente ancilar e instrumental da política no Ocidente neo-liberal de hoje] economicamente sistémico---um problema que decorre inevitavelmente das formas de meta-economicização e mesmo de, a vários títulos, des-economicização encontradas pelo capitalismo contemporâneo para sobreviver.
Tudo o mais não passa de "folclore epissistémico" ou mera epifenomenologia.
Enquanto o não percebermos vai ser muito difíccil mdar o que quer que seja na sociedade à nossa volta.
[Na imagem: foto de Dorothea Lange sobre a Grande Depressão nos Estados Unidos ]
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