Passsou, um dia destes, por minha casa alguém que vinha questionar-me para uma sondagem sobre a "Europa" e, de uma forma muito particular, sobre uma instituição hoje-por-hoje, muito falada chamadao Banco Central Europeu.
Do inquérito em causa, uma das questões era: "Confia no Banco Central Europeu"?
A minha resposta deixou o inquiridor visivelmente perplexo, perturbado mesmo: Não! Começo, aliás, logo por não confiar na própria «Europa»"...
É verdade que não confio nesse indefinível "produto de síntese económico-financeira"; essa coisa inessencialmente geométrica, traçada em labotarório económico a régua e esquadro económico-político como muitas das antigas colónias europeias a que muitos se obstinam em chamar "Europa".
Sobre esta multiplicam-se os equívocos e as indefinições---essas inúmeras e perversas florestas macbethianas que tapam, no fundo, a toda a gente [incluindo o próprio Macbeth] a visão minimamente clara da fortaleza onde a cupidez e a pusilanimidade encerraram, como é do conhecimento geral,o trágico par shakesperano.
Ainda recentemente, Álvaro de Vasconcelos vinha defender [contra Badiou, por exemplo, que desta "Europa" tem uma visão que de tão óbvia se impõe aliás naturalmente por si própria: nem sequer é a de Badiou---é a minha, também. É a de qualquer pessoa minimamente informada...]; ainda recentemente, dizia, Álvaro de Vasconcelos vinha defender a tal "Europa-ideia" diáfana, supra-real e gloriosamente impossível, a meio caminho entre Platão ou Santo Agostinho e Thomas More que para Vasconcelos, por uma razão qualquer, permanece teimosamernte viável.
"Somos todos gregos, hoje", escreve ele, falando da crise grega e da necessidade de uma rápida e [talvez...] ao mesmo tempo generosa e espontânea resposta "europeia" às dificuldades sentidas, de forma cada vez mais aguda, pela sociedade grega em resultado da má cabeça de quem fingiu dirigi-los nestes anos mais recentes---e "europeus".
Pelo menos nesses.
Ora, é preciso, a meu ver, que percebamos todos muito clara e muito activamente o seguinte:
nenhum de nós "é grego" enquanto não for, no nosso caso [no meu, seguramente!] logo em primeira instância, português.
nenhum de nós "é grego" enquanto não for, no nosso caso [no meu, seguramente!] logo em primeira instância, português.
Mas que também ninguém é português [verdadeiramente português---ou francês ou... chinamarquês ou outra coisa qualquer] enquanto for sistemática [e---mais grave ainda!---cada vez mais sistemicamente] considerado já um mero instrumento, uma impura circunstancialidade teórica funcional sem vida própria ou um simples utensílio mais ou menos insubstantivo e sempre desumaniza[dor]amente abstracto de "desenvolvimento" considerado este, por sua vez, de uma perspectiva tão disfuncional quanto perversamente 'teológica', como o "sol teorético" de um pré-copernicianismo económico-financeiro cegamente argentocrata de que todos estamos obrigados a ser crentes e devotos; já algo que se pode [se deve!] exactamente por se achar sistematicamente... "em estado gasoso" nas aéras formulações teóricas dos euro-devotos, "apagar" periodocamente sempre que a monstruosa "felicidade" central do "Sistema" assim o imponha e lho exija, renascendo, apenas, e ainda potr cima desejavelmente como mero 'mercado', a nova exigência deste, logo que ele, alimentado por estatísticas arrepiantes de dois-dígitos-por-cento de desemprego ou "des-empregamento" funcionais se considerar saciado e pronto para nova "arrancada" em direcção ao "pays où l'on arrive jammais" da felicidade e da realização colectivas.
Ora, a Europa [sem aspas] é, como tudo o mais, uma questão de propriedade, esse terceiro pilar da economia de que "todos" se esdquecem sempre que se trata de reformar [eu digo: repossbibilitar continuamernte] o próprio sistema.
A Europa não se reforma [ela começa logo, como uma célebre não-personagem do meu autor de cabeceira, o genial Beckett] por nem verdadeiramente se criar!] se continuar a fingir pensar que toda a economia "é apenas receita e despesa".
-Ou seja: como tantas vezes tenho dito, que a propriedade é uma constante sistémica estável, des/estruturalmente sacra e absolutamente imóvel num universo epistemológico-teórico em que apenas a receita e a despesa estão autorizadas a operar como variáveis funcionais.
-Que economia "é produzir efectiva e ininterruptamente capital" e não servir uma sociedade humana e, por isso, efectivamente humanizada.
-Que economia "é" produzir "riqueza limpa", i.e. sem recurso à geração necessária de "resíduos tóxicos económico-sociais" perigosíssimos [tão perigosos quanto inevitáveis] de toda a ordem de que é trágico exemplo a produção nuclear de "carencialidade possibilitante" onde o sistema vai buscar a sua des-igualíssima e sistemicamente descentral ideia de "valor".
Pergunta-se: uma "Europa" onde [Vasconcelos dá o---terrível!---"exemplo" da Letónia] 22,5 % da população está desempregada à espera do mirífico Godot da retoma pode ser grega, num momento como o actual?
É ela sequer letã?
É uma Estónia onde o des-emprego atinge praticamente, sempre segundo Vasconcelos, um quarto [!] da população estónia?
Uma Espanha a braços com uma crise laboral que ultrapassa os valores estónios [19,7% contra 195, diz Vasconcelos] é espanhola?
Quem lá vive sente-se espanhol?
Pode sentir-se assim, nessa natural condição?
Tal como ninguém parece preocupar-se, na tal "Europa-de-Alice-in-Wonderland" [ou "Through the Loooking-Glass" em que se pretende vejamos o noosso próprio futuro económico, social e político reflectido] em questionar o papel e a natureza im/puramente ancilares e sempre instrumentalmente funcionais da "Política" relativamente à "Economia" [Vasconcelos repete aliás tacitamente, afirmando questioná-la, a defesa desta inversão/perversão de valores básicos, primários, de humanismo e de civilização...]; tal como assim sucede, dizia, ninguém parece, de igual modo, verdadeiramente interessado em perguntar e, sobretudo, em que perguntemos se o que está em causa é, por exemplo, o futuro do Estado Social [que até aqui ainda foi permitindo a muitos europeus sentirem-se mais ou menos implícita [ou conformadamente?] "europeus" ou se é, na realidade, a viabilidade de todo o modelo político, histórico e civilizacional de que ele, Estado Social, operou nestes últimos decénios sistematicamente como muleta [dispositivo de segurança social e política "inset" e recapitalizador funcional contínuo do Mercado] e de que a "Europa" pretendeu ser a expressão institucional electiva que estão verdadeiramente em causa e que precisam de ser radicalmente reequacionados mas desta vez "com as pesdsoas dentro" e, sobretudo, "no centro e à frente".
Não "Draussen vor dem Tur", como no título célebre de um autor alemão mas dentro.
"In, in, in"...
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