segunda-feira, 27 de abril de 2009

"Eu nunca fui propriamente...«obamista» até porque..."

...até porque sou português e, sinceramente (aqui entre nós que ninguém nos ouve...) a minha empatia com os E.U.A. e aquilo que eu acredito que eles representam (aquilo que para mim representam, pelo menos...) é ("to say the least"...) mínima.

Por todo um vasto conjunto de razões que não vêm, todavia, neste momento, em pormenor, ao caso.

Respeito-os genericamente, claro, mas daí até me identificar mesmo apenas minimamente, volto a dizer, com uma certa... "americanicidade" genérica e consistente feita de pragmatismos vários e de todo um conjunto de valores estr(e)itamente materiais vai, de facto, uma distância considerável.

Sou demasiado europeu, acho eu, para poder identificar-me com o famigerado "American way", nas suas múltiplas (e possíveis, insisto) formas.

Gosto de "um certo Sandburg" (que conseguiu transformar a irremediável vulgaridade que permite credivelmente identificar a "Americana" num discurso de, por vezes, genuina genialidade) e de "um certo Papa Hemingway" ou de uma certa memória adolescente que dele gurado quando descobri que escrever não era só aquilo que a pena pesada e dura, hirta, de Herculano (que conhecia d' "A Abóbada" e do "Eurico") fazia.

Gosto do Fitzgerald (mas, muito em particular, por causa daquela edição dele que perdi numa mudança de casa qualquer, com prefácio do Miguéis, que reencontrei recentemente em Évora e que tentei, sem sucesso, comprar...) e gosto do Langston Hughes que tinha uma concepção jazzística fabulosa (porque natural e, sobretudo, selvagem) da poesia.

Abomino Thoreau e Emerson exactamente porque (lá está!) são demasiado simplórios e americanamente retóricos para o meu gosto europeu (há toda uma retórica da falsa simplicidade, como uma leitura atenta, mesmo breve, de ambos permite demonstrar à saciedade).

Bom mas a ideia aqui nem era falar propriamente deste aspecto mais literário ou mais artístico da "Americana") mas, de um modo específico, de Obama como parte do que para muitos será um projecto global de recuperação ou resgate (de redenção) de uma "América levada às últimas--mas também naturais...--consequências" com Bush e os "bushmen".

A propósito de Obama acreditam muitos que a América se está a lavar com água limpa da sujidade acumulada com anos de tenebroso "bushismo".

Seria (será!) seguramente interessante conhecer o que acreditam os que assim pensam da notícia recente (cf. jornal "Público" de 26.04.09, artigo "Agência militar norte-americana alertou contra o uso de tortura nos interrogatórios") de que Obama não vai responsabilizar os agentes da C.I.A. que "interrogaram" os presos acusados de pertencerem à Al Qaeda.

A ideia parece ser a de que responsáveis, para Obama e a "nova América" são, sim, os que deram as ordens para que as vítimas do "bushismo" fossem interrogadas "enérgica" ou "duramente".

Cá para mim, isto é apenas a América ou a americanicidade no seu pior.

Por um lado, glorifica, diz ela--pretende ela que nós acreditemos que glorifica--o individualismo e mesmo, com alghuma prudência e alguma reserva, a iniciativa autónoma dos indivíduos como tal: o "cowboy" solitário, o herói drifter e esse folclore todo de que John Wayne deu um rosto que chegou a parecer possível de ser acreditado.

Fizeram-se filmes verdadeiramente espantosos em torno desse mito que (em meu entender, pelo menos) está, aliás, para a "americanicidade" tópica como o "pensar tanatópico" está para a uma certa "portugalidade" ou uma certa "lusitanidade adquirida" (histórica e politicamente educada" de que falo, com algum maior detalhe, noutro ponto deste "Diário".

Foi, no fundo, uma espécie de "avesso redentor" (ou "redencional") do feroz materialismo típico da "Americana", a representação horizontal de uma "eto-topia" e/ou de uma "cosmotopia" puramente ideais que, no fundo, ninguém, na América, todavia, deseja para si embora adorasse, claro, ver nos outros, praticada por outros.

Isto, por um lado, como disse.

Porque a verdade é que, por outro, se contenta (ela e a Dra. Teresa de Sousa...) com este tipo de gestos vãmente simbólicos e farisaicos onde se podem ouvir (quem souber fazê-lo) ecos de uma coisa terrível que aconteceu há alguns anos à História e que se expressou topicamente pela arrepiantemente desresponsabilizadora máxima que dizia "Befehl ist Befehl".

Para quem era suposto "remir" décadas de abjecção, física e moral, é, temos de convir, francamente curto...

[Imagem extraída com vénia de bksschoolhouse.com]

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