quarta-feira, 8 de abril de 2009

"Confirmação (chamemos-lhe:) «teórica» de algo muitas vezes repetido"


O "algo" muitas vezes repetido é a afirmação (a tese--a minha tese!) de que em POortugal não existe hoje uma verdadeira democracia, senão que um sistema meramente "demoformal" usado "estrategicamente" pelo núcleo economocrata do 'regime' para se "justificar" politicamente a si próprio perante a comunidade.

Esta tese propriamente dita, digamos assim.

A "demonstração" tem, por seu turno, sido amplamente feita neste "Diário".

O que hoje aqui trago é uma espécie de tácita mas firme confirmação dela.

É o caso de o "Público" de 08.04.09 trazer um texto de Adão Carvalho, Professor universitário em Évora ("Apostar nas energias renováveis") onde se propõe o louvabilíssimo regresso ao uso destas em detrimento do in-sustentável petróleo.

Até aqui, tudo certo, pois: os combustíveis fósseis e toda uma "civilização" no fundo assente neles têm dado literalmente cabo do planeta, revelando-se cada vez mais vital a urgência em substitui-los por fontes alternattivas limpas.

Incluindo o nuclear?

O Professor Carvalho acha que não--e não serei eu que sou professor mas não universitário quem discorde.

A questão começa com o modo como o Professor Carvalho argumenta as suas opções nesta matéria.

Diz ele: "É consensual que o paradigma de desenvolvimento económico das últimas décadas, assente nas energias fósseis, não é viável no futuro [...]", acrescentando mais à frente que, para que a referioda mudança de paradigma possa ocorrer deve vencer "obstáculos de natureza económica e política" "consideráveis" o que "exige vontade política, determinação e capacidade efectiva para implementar políticas públicas cuja orientação estratégica seja a alteração da base energérica da economia, com prejuizo para o uso de energias de origem fóssil".

Evidente?
Evidente!

Mas, se é assim tão «evidente» por que razão acho eu que isto deve ser citado e abordado quando está em causa demonstear a ausência de democracia do 'regime'?

Mas... não é evidente?!

Se é preciso--se é vital!--inverter radicalmente o paradigma energético actual por que tácita razão se coloca o foco da mudança no poder político e não na cidadania, de onde esse poder político emerge e a qual ele deve representar, sendo, de resto, daí precisamente que lhe vem a designação comum de poder representativo?

Não está implícita na formulação, a ideia de que muito mais o que activar aquela que é a base mesma da acção realmente democrática--a consciência cívica ou cidadã que é o próprio motor da Democracia--a tónica está toda posta no poder político como tal?

Como algo que de forma subentendida e objectual mas perversa se pode conceber como algo des/estruturalmente independente da tal base cidadã de onde vem a legitimidade, o fundamento, democráticos aos governos?

Ao dizer: "é precisa coragem para mudar" não se está por absurdo a meter subliminar (ou subconscientemente) "entre parênteses"--a "empocher", como diria Husserl--a formulação democraticamente correcta e genuína que é obviamente esta: "aquilo que é urgente é esclarecer a cidadania sobre a tragédia dos combustíveis e fósseis e chamá-la a pronunciar-se, em seguida"?...

E o professor Adão Carvalho acrescenta ainda: "é fundamental uma acção política determinada que transmita aos agentes económicos [sublinhado meu] a necessidade de diversificar as fontes energéticas, diminuindo progressivamente a dependência do petróleo".

Ou seja: mais uma vez, o motor da sociedade é visto como andando decididamente "lá por cima", solto da base social e cívica sobre a qual devia assentar mas obviamente não assenta.

É, diria eu, um discurso absoltamente revelador e característico este.

Nele está, com efeito, implícito o "nosso" modo democraticamente pretextual de ver a realidade das relações individual/institucionais, das relações cultu(r)ais típicas, da democracia funcional ou, como prefiro dizer: da demomorfia instrumental.

Tem pessoas "dentro"?

Tem, claro.

Tem de ter.

Agora o lugar que elas ocupam é que é singular e, de modo evidente, democraticamente descentral e atípico.

Elas não determinam nem, realmente, decidem: resistem, na melhor das hipóteses.

Resistem o que tem implicitamente contida a ideia de que estão fora do centro decisional da própria realidade política, social, cultu(r)al, civilizacional.



[Na imagem: tela de Vieira da Silva]

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