Quando eu era 'puto' queria ser guarda-redes. Guarda-fredes de futebol, claro! Guarda-redes "é" ("era"!) de futebol. Era-se guarda-redes com aquelas joelheiras "às tiras" (cheguei a ter UMA que arranjei já não sei onde nem como com aquelas fascinantes tiras de uma coisa esponjosa e seca, a cair) e uns calções acolchoados...
"Como" o Costa Pereira!
Pois... eu era do Benfica, via jogar o Costa Pereira, queria ser o Costa Pereira. O pior é que, lá no fundo, o meu ídolo inconfessável era, nem mais nem menos, do que o guarda-redes da "oposição", o Carlos Gomes, o "maluco". Acho que era o ser maluco que me enfeitiçava. O tipo tinha aqueles beiços improváveis (começava logo aí: o Costa Pereira era atiladinho, penteado, certinho, tinha aquele aspecto de menino bem que não parte um prato, o Gomes era maluco e ainda por cima vestia-se de preto, era qualquer coisa 'de outra dimensão'). Soube mais tarde que tinha muitas namoradas, que metia os outros 'putos' no Estádio "à borla" ("Se os putos não entrarem, arranjem outro guarda-redes que eu não jogo!...") e tinha "ido à cara" (ou quase...) a um PIDE que o chateara. Enfim... Era o fulano ideal para enfeitiçar um miúdo que vê filmes de cowboys e tem no Audie Murphy o seu herói...
Pobre Carlos Gomes! Não sei, francamene, se aquela história com a menor foi real ou se, como ele diz, se tratou de um "truque" sujo da PIDE. Teve de se exilar, era pitosga, jogou em Marrocos e em Espanha (em Oviedo) tornou-se uma figura quase lendária. Morreu com Alzheimer, suponho. Na Áustria. Recordo-o aqui, comovido.
Quanto a mim (voltando a mim...), como não podia (não era "justo", não era "leal"...) "ser" o Carlos Gomes nos jogos no Jardim dos Anjos (eu era do Benfica, caramba!), "era" o Bráulio porque achava que "ser" o Costa Pereira podia "chatear" o Carlos Gomes: era demasiado manifesto e excessivamente hostil...
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