terça-feira, 30 de setembro de 2008

" O "meu" Benfica..."

Volto aqui a falar do "meu" Benfica: aquele que ganhava tudo mas que era, sobretudo, aquele que dava voz, no plano simbológico e ritual, ou mesmo totémico, do "ludus", às aspirações difusas, inexprimíveis (porque politicamente "dissolvidas" quando não formalmente reprimidas e proibidas de fazerem ouvir-se) dos extractos sociológicos mais humildes, menos esclarecidos e menos capazes de organização própria autónoma da sociedade portuguesa durante o fascismo: o "povo". O Benfica era, de facto, o povo como tal, com todas as suas glórias e coisas admiráveis mas, também, com toda a sua pequenez e as suas abjecções.

O 'povo' como tal por contraposição ao povo-que-julga-que-deixa-magicamente-de-sê-lo se se aproximar fisicamente dos "outros" que era, muitas vezes, o "lugar simbológico e cultu(r)al" ocupado pelo Sporting e hoje por uma não-eexistência sociológica e política absoluta chamada "P.S.D."...

...Do Sporting que tinha banho, duche, quente para os jogadores e campo relvado e, por isso, "nos" "roubou" a primeira grande vedeta que produzimos, o Artur José Pereira, lançando as bases de uma rivalidade que era e é (para mim, pelo menos) tanto competitiva quanto social, sociológica, cultu(r)al e até política.

O "meu" é o Benfica do Cosme Damião (que expulsou o Artur José Pereira, da sua própria equipa e o proibiu de sair do quarto da pensão, num célebre jogo na Galiza porque foi inconveniente com o árbitro); do presidente-operário, do presidente-tipógrafo, o Manuel Afonso; do Cândido de Oliveira (que é uma figura admirável de cidadão e de---verdadeiro---desportista que, até hoje, ainda não foi reabilitado como merece); do Guilherme Espírito Santo (um dos primeiros j0ogadores negros---juntamente com o Aníbal Paciência do Sporting e o Melão, do Benfica, que, uma vez, EM ÁFRICA (!) numa digressão do Clube não pôde ficar no mesmo hotel do resto da equipa o que diz qualquer coisa do salazarismo, santarrão e farisaico!...; Espírito Santo que era, de facto, um fulano extraordinário do ponto de vista ético que não quis, por exemplo, num jogo célebre, festejar um golo porque o havia marcado ao Azevedo que tinha o braço, a omoplata, partida; ou daquela direcção que protestou um jogo que a equipa de futebol tinha ganho porque achava que o tinha feito com um penalty inexistente a seu favor; e por aí adiante.

Já agora, é também o Clube que tem um presidente que em miúdo teve refeições só de sopa e não se envergonha de dizê-lo...

ESSE é o "meu" Benfica que aqui homenageio, mais uma vez, numa célebre equipa que "deu" sete-a-dois ao rival, ao... "clube do sr. visconde" como lhe chamou um dia o Octávio, que o treinou.

[Nota final: uma coisa que aqui---veementemente!---reafirmo é que é essencial que (como dizer?) "aprendamos a perder" definitivamente determinados preconceitos elitistas que supostamente nos "proibem" de misturar, na nossa reflexão incessante e orgânica sobre a realidade, Filosofia e, por exemplo, o Futebol. Não é o facto de incluirmos este último nas nossas reflexões que nos diminui e vulgariza: é o modo como o incluimos que pode, seguramente, minimizar-nos.]

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