quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

"Sobre a Alteração à Legislação dos Despedimentos"


Uma informação recentíssima diz-nos que sairá de uma percentagem descontada regularmente nos salários dos trabalhadores portugueses, à semelhança, parece, do que acontecia já aqui ao lado em Espanha a fim de custear o fundo de compensação para os trabalhadores despedidos ao abrigo das mudanças recentemente introduzidas na lei respectiva.

Não vou agora aqui pronunciar-me sobre o sofisma [para não dizer: o embuste...] que consiste em defender que despedindo, se emprega mais.

O princípio é manifestamente falso e só um rematado tolo deixa que o convençam de que possui um mínimo de substância argumentativa idónea e /ou fundamento mesmo só remotamente sustentável.

Na melhor das hipóteses leva às últimas consequências [ou até perto delas] a ideia de que compete ao aparelho económico, exactamente como está instalado e institucionalizado, em última instância, viabilizar a possibilidade material de existência dos indivíduos dentro de uma sociedade, consagrando na lei o princípio cientificamente aberrante [surpreendente numa sociedade supostamente estruturada a partir de um projecto ou de uma circunstância "gnoseotópicos"] que prevê a submissão praticamente integral dos ritmos biológicos dos indivíduos aos ritmos sistémicos completamente artificiais daquele mesmo aparelho económico.

Não é, todavia, esse aspecto [que serve, porém, é bom recordar, só por si para sustentar a minha tese da existência de uma economocracia---muito mais do que uma democracia---operando como sistema político real nas sociedades ocidentais de hoje] que aqui me traz agora mas o propósito de registar a nuance operada numa outra tese que venho há muito defendendo que é a que diz que o [impropriamente chamado] "Estado Social" [deveria, de facto, em bom rigor, designar-se por "Estado funcional"] é "comprado" ou "remido" ou "resgatado" com dinheiro do conjunto da sociedade que, em seguida, o coloca praticamente a custo zero [como se diz no futebol...] ao serviço das forças que lideram o aparelho económico e o conjunto do edifício económico-político que eles lideram e administram.

Desta feita, esse mesmo capital colectivo é, nas suas diversas formas, utilizado como um capital de suporte constante na compra, neste caso, do próprio desemprego gerado pelo funcionamento normal do sistema, evitando, desse modo, que os verdadeiros responsáveis pela emergência sistémica deste se vejam controntados com as consequências inevitáveis do modo intrinsecamente des-igual e des-funcional de operar económica, social e politicamente do seu modo de gerir o processo de transformação tópico do real em "valor".

No fundo, trata-se, ainda e sempre, de um velho dispositivo capitalista que está sempre, de um modo ou de outro presente nas sociedades onde ele vigora e que consiste em utilizar o Estado como um mero suporte instrumental, uma espécie de alfaia refinanciadora e recapitalizadora "estratégica" do modelo de economia privada que se encontra, por seu turno, na base, no centro ou no núcleo activo determinante de todo o sistema.

Aqui, no caso vertente, só varia relativamente à função primária de recomposição contínua do mercado pelo recurso prioritário à função complementar de garantir que não se verificam rupturas irregressíveis e insolúveis ou, pelo menos de muito difícil solução, de carácter abertamente social e político no modelo, que assim pode, em termos práticos. continuar a funcionar apesar dos gravíssimos sobressaltos sistémicos que o seu funcionamento de gforma regular está condenado a gerar.


[Imagem extraída, com a decida vénia, de cominidad-dot-elpais-dot-com]

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