quarta-feira, 29 de setembro de 2010

"Arthur Penn, 1922-2010"


Morreu Arthur Penn.

Com ele, morre um dos mais importantes e brilhantes cineastas norte-americanos que foi também um dos mais europeus.

Em termos cinematográficos, foi, basicamente, um homem da "década política" de '70 embora a sua carreira no cinema tivesse começado em 1958 com "The Left-Handed Gun" com Paul Newman [não por acaso, durante algum tempo visto como uma espécie de Marlon Brando menor] um filme onde era evidente um espírito que Penn partilhava com cineastas como Nicholas Ray, por exemplo ou até com Elia Kazan, o Kazan 'dessa altura', o Kazan do desconforto e das personagens stanislavskianas e inadaptadas; Kazan, o "revolucionário" cuja contestação começava logo na própria técnica de representação e, pelos vistos [ao contrário de Penn] acabava também, em larga medida, aí, como posteriormente se comprovaria.

Foi, dizia eu, um homem da "década política", marcusiana, do Cinema Americano e em geral da História do mundo [com a guerra do Vietname "lá" e toda uma série de conflitos de libertação anticolonial "cá", i.e. envolvendo várias potências europeias entre as quais Portugal] e diversos fenómenos de guerra social em Itália, na Alemanha e em França, por exemplo; foi, dizia, um homem da "década política" do Cinema Americano, mau grado a estreia [e logo com esse excelente western humanista e psicológico que foi o citado "The Left-Handed Gun"] e mau grado aquele que foi, sem dúvida, o seu filme mais determinante e icónico, a sua obra-prima servida por uma montagem absolutamente fabulosa [e fabulosamente revolucionária] de Dede Allen, "Bonnie & Clyde" datar já da década de '60.

"Bonnie & Clyde" é o "À Bout de Souffle" e até um pouco, [ressalvadas as devidas proporções] o "Pierrot le Fou" de Penn: um filme esteticamente muito "europeu", muito... godardiano, desesperadamente louco, lucidamente niilista e esplendorosamente apocalíptico: um suicídio político verdadeiramente arrebatador e absolutamente inesquecível, de uma beleza desesperadamente final e absoluta.

Depois dele, Penn faria ainda em 70, um relevante "The Little Big Man" com Dustin Hoffman e um terceiro "western", "The Missouri Breaks", com Marlon Brando e Jack Nicholson.

A partir dos anos '80, Penn dirigiria ainda uma curta série de filmes que ficaram, todavia, sempre, muito aquém do êxito [e do interesse, da relevância] dos seus maiores sucessos e, no final da carreira regressaria mesmo à televisão onde foi produtor executivo de uma série de grande sucesso, de resto, ainda em exibição, "Law & Order".

Faleceu de ataque cardíaco com 88 anos.


[Na imagem: Arthur Penn dirigindo Faye Dunnaway e Warren Beatty em "Bonnie & Clyde"]

"Com Este Governo, Esta «Europa» e Estes «Políticos» e Estas Políticas: Nunca!"


O titular deste blogue pretende tornar pública a expressão veemente da sua total e sempre activa solidariedade para com toda e qualquer manifestação de rejeição da política orçamental do governo português que, mais uma vez, faz assentar o peso maior do que chama o "combate ao défice" resultante de erros e vícios sucessivos de um regime estruturalmente injusto e, por definição, económica, social e politicamente disfuncional---o capitalismo neo-liberal de que o governo vigente representa a expressão alegadamente humanizada e muito supostamente "de esquerda"---nas classes e sectores sociais que já eram, antes das medidas ora tomadas, os mais sacrificados e os mais penalizados pelo funcionamento normal do próprio sistema.

Um sistema que as referidas medidas de "combate" nada fazem para sanear e tornar histórica, social, económica e politicamente mais humano e mais tolerável antes pelo contrário, como acabo de dizer: enquanto, com efeito, as classes económica e socialmente mais sofredoras da sociedade portuguesa se mantiverem no gozo de um só que seja do conjunto de direitos que tanto lhe custaram a alcançar [muitos apenas surgidos graças ao 25 de Abril] e estes continuarem, como até aqui, a ser, uma a um, apropriados unilateralmente pelo poder e usados como moeda de troca na remediação puramente imediatista e meramente casuística, pontual, das várias disfunções geradas pelo sistema, este, em vez de, como é desejável [e até, em mais de um sentido, inevitável] dar lugar a um outro, essencialmente norteado pela consideração e defesa do interesse legítimo dos indivíduos e das sociedades por eles formadas pode, pelo contrário, à revelia desse mesmo legítimo interesse, ir sobrevivendo e continuando impunemente a gerar as injustiças e as perversidades de toda a ordem [de que as actuais medidas são mais um exemplo e um exemplo bem preocupante!] que constituem a sua expressão económica, social, política e, em geral, histórica inevitável e normal.


[Imagem ilustrativa extraída com a devida vénia de albforumi-dot-com]

domingo, 26 de setembro de 2010

"Eddie Fisher, 1928-2010


Embora nos E.U.A. [onde nasceu em Filadélfia, no ano de 1928, filho de russos imigrados] tivesse atingido o estrelato tendo sido trazido para o mundo do espectáculo por Eddie Cantor, um cómico de grande sucesso popular no seu tempo, em Portugal esteve sempre, com Perry Como ou Vic Damone, por exemplo, numa espécie de segunda ou terceira linhas de "crooners" "importados", incomparavelmente menos conhecidos [e apreciados] à cabeça dos quais se achavam nomes como os de Frank Sinatra ou [o para mim, muito melhor em tudo!] Dean Martin.

Entre nós, Fisher ficaria sobretudo associado a um "escândalo" mediático que foi o divórcio de Debbie Reynolds, com quem constituiu de 1955 a 1959, uma espécie de casal ideal intensivamente usado pela imprensa norte-americana e pelo seu próprio marketing profissional e comercial como modelo de juventude, beleza e sucesso.

No provinciano Portugal da época, Fisher, que deixou a mulher, muito jovem, para casar com Elisabeth Taylor, amiga do casal, pouco [de facto, coisa alguma!...] faltou para que fosse apresentado como um perigoso "immmoraliste" [para citar um título famoso de Gide] e uma ameaça para a solidez das instituições [o casamento era à época uma dessas instituições literalmente intocáveis para o opressivo conservadorismo "moral" da ditadura, hipocritamente apoiado num moralismo farisaico e repressor que se confundia amiúde intrinsecamente com o próprio 'regime', inclusive na sua vertente estrita---e estreitamente!---política].

Já Taylor vinha, pelo seu lado, pôr em causa a imagem dócil e discreta da 'Mulher ideal' católica e salazarista, sexualmente inexistente [ou apenas... "funcionalmente" existente] e, por isso, naturalmente desprovida do direito moral e especificamente político-jurídico à afirmação de um erotismo próprio e autónomo, independente do do homem [para uma parte da "hermenêutica" mediática da época ela foi, neste contexto, a Eva, mais velha e "experiente", que "roubou" o jovem Adão à inocente Reynolds, fornecendo assim um rosto e uma circunstância visível, a seu modo, tópica, ao paradigma abstracto, à época cultu(r)al e politicamente inquietante, aterrador, da Mulher que toma iniciativas em matéria amorosa e que conduz os ritmos e as formas específicas da nupcialidade ou que, de um modo mais geral, toma em mãos a condução dos "rituais de acasalamento", rompendo desse modo um tabu e uma ecologia da sexualidade que a igreja tinha conseguido impor como mandamento e imperativo moral absoluto e que o 'regime', sempre ávido de explorar e investir nas múltiplas formas de docilidade, contenção e renúncia, acolhera, por sua vez, entusiasticamente].

E se é verdade que a explosiva e torrencial, sempre excessiva, Taylor soube recuperar essa imagem de.... "vulva devoratrix" que tanto aterrorizava a, com frequência, no fundo, equívoca e 'problemática' virilidade oficial "fascista à portuguesa"; se é verdade, dizia, que Taylor soube muito bem recuperar [e inclusivamente 'reinvestir' de forma muito hábil na sua própria "ebuliente" imago profissional] essa citada componente de "devoradora de homens", já a de Fisher ficaria para sempre marcada por aquele [e uso aqui a expressão de um modo deliberadamente premeditado] "pecado original" que, de resto, a própria Debbie Reynolds mais tarde viria a "perdoar".

Em vida, Fisher publicou nada menos do que duas autobiografias "Eddie: My Life and Loves", já nos anos 80 do século passado e uma segunda, em 1999 intitulada "Been There, Done That" que despertaria, aliás, segundo a crónica, uma escandalizada rejeição, entre outros, por parte da própria filha que teve com Debbie Reynolds, Carrie Fisher, uma efémera estrela de "Star Wars" de George Lukas.

Fisher faleceu com 82 anos, vítima de complicações pós-operatórias.


Imediatamente a seguir um exemplo do que Eddier Fisher foi profissionalmente: música fácil, de irrecusável eufonia numa voz extremamente plausível, dúctil e elegante, globalmente muito móvel e muito agradável, nada... 'complicada': uma receita eficaz para o sucesso que logrou, como disse, de facto, a dado momento, alcançar.


sábado, 25 de setembro de 2010

"A Crise do Sistema, Tentativa de Releitura Não-sintomática"


Uma expressão a que, por sarcasmo, recorro com frequência sempre que abordo a magna questão da "crise" moderna do Estado dito 'social' é a de que sai tão caro hoje ter um povo, uma sociedade, que provavelmente dentro de meia-dúzia de anos teremos de vender os nossos.

Mais: que já estamos, de facto, há muito, a "vender para fora" povo e sociedade na forma de fluxos migratórios estáveis, permanentes [cujos valores, segundo as estatísticas, estão já--ou ainda?...---ao nível dos dos anos '60 do salazarismo] exactamente porque o modelo económico-financeiro, social e pretextualmente político por que como sociedade optámos faz com que o povo se tenha a breve trecho tornado num luxo literalmente incomportável para uma economia como a "nossa"...

A causa está, também o tenho dito, no modo como paradigma político e civilizacional decidimos que o Conhecimento devia ser integrado na História: como uma propriedade privada e um proto-capital cuja acção a prazo vai inevitavelmente levar à implosão e à desfuncionação nuclear da "ecologia da própria História", digamos assim.

Desde logo, através da ruptura do equilíbrio funcionante entre as componentes ou valências capital constante vs. capital variável que era em última [mas verdadeira] análise o que permitia recapitalizar continumente o modelo ou o sistema, ainda que muito rapidamente isso apenas fosse possível exactamente com recurso nuclear às valências erradamente ditas "sociais" do Estado.

Ora, nestas matérias, a minha tese é que a actual "crise" de que tanto se fala [e que hoje-por-hoje, tanto se sente!] não representa, na realidade, uma crise mas um estado e além disso um estado que só seria, em tese, possível corrigir com recurso a formas muito determinantes de "destecnologização" que, teria, de passar [e francamente não vejo que sem intervenção determinada e organizada das sociedades civis dos vários países capitalistas ou, pelo menos de alguns, tal seja, a curto prazo, previsível] por profundíssimas inflexões na estrutura política ou "politiforme" do 'regime'.

O grande sonho do capitalismo actual é o de que a sociedade civil "se pague a si mesma" sem intervenção [e sem "sacrifício"] portanto, do capital privado que permanece numa posição teórica e prática de obstinada indisponibilidade para envolver-se no refinanciamento autónomo do seu próprio mercado [e da sua própria, dele capitalismo, repossibilitação ulterior contínua]; isto é, indisponível para ceder parte de si próprio, "socializando-se funcionalmente", de modo, chamemos-lhe: espontâneo [perante o efeito gravíssimo de uma das mais sensíveis disfuncionações do modelo de integração política do Conhecimento ou "capitalicização contínua estrutural" deste que é o que resulta no aumento drástico da esperança de vida] a fim de dar resposta à necessidade de recapitalizar um sistema económico-político que o "social" alimentou satisfatoriamente durante décadas.

Agora, porém, na fase actual da evolução dos saberes e da sua capacidade para transformar-se, de forma aparentemente infinita e ininterrupta em tecnologia e esta numa classe trabalhadora "paralela" [mas cada vez menos paralela e mais central] que não alimenta já satisfatoriamente com os seus impostos e estes convertendo-se secundariamente em Estado "social" o mercado; agora, porém, dizia, na sua fase actual, o capitalismo acha-se naquilo a que os anglo-saxónicos designam por um "conundrum", um beco sem [pararente?] saída sistémica: como dispensar um proletariado humano conseguindo, todavia, mantê-lo como um indispensável mercado?

Como vai o sistema produzir; melhor: como, para quê [e, sobretudo, para quem?] vai ele produzir barato utilizando para tanto sem freio, i.e. sem limites e sem... "disciplina funcional" a "aptidão sistémica" do saber para converter-se em propriedade e a sua "vocação política" para transformar-se em capital?
Como vasi ele subreviver-se sem mercado?

Semptre chamei a atenção para essa espécie de disfuncionalidade sistémica nuclear teórica que consiste em des-integrar a figura igualmente teórica do "cidadão funcional" do capitalismo.

O que caracteriza a representação de episteme deste é o facto de o capitalismo tecnológico [0 "tecno-demo-capitalismo"] ter como projecto central dispensá-la [àquela cidadania a que, por essa e outras razões similares chamo "funcional"] por completo ou tendencialmente por completo num primeiro momento do processo produtivo [substituindo-o por máquinas por imperativos de economia] encontrando-se, todavia, "condenado" a "recuperá-lo" mais à frente na forma in-orgânica de um mercado, sem o qual o sistema fica obviamente por completo inviabilizado.

A minha tese é que é exactamente o resultado inevitável desta "esquizofrenia" na episteme localizada nos genes teoréticos do "tecno-demo-capitalismo"; o estado de coisas que daí resulta aquilo que passa hoje comummente por mais uma "crise" do mesmo.

A verdade, porém, é que, tal como vejo as coisas, não é, como disso, nem de longe disso que se trata e sim, nunca será de mais repeti-lo, de uma tipo de "estádio supremo", dificilmente regressível, da "volução" pós-industrial e "pós-moderna" do próprio sistema capitalista.

Sistema capitalista que deixou de conseguir encontrar formas eficazes de recapitalizar o mercado exactamente porque as mesmas circunstânciass e causas que lhe permitiram prosperar até um dado momento, foram as que o tornaram inevitavelmente disfuncional roubando-lhe, de dentro de si próprio, a possibilidade de ter à disposição um mercado "comprado" com dinheiro que não precisava de sair do seu próprio capital.

Fala-se muito, em termos pelo menos de debate teórico, hoje em dia [tal como aconteceu antes no período anteruior à II Guerra Mundial não conseguindo, porém,evitá-la...] em "desindustrializar"; ora, sucede que, de facto, o sistema já está a desindustrializar.

Como?

Desde logo, por exemplo, tornando impossível, através dos "usos significados" [económica, social e politicamente "significados"] da sua produção o acesso de grandes sectores da população aos próprios produtos que permite gerar.

Quando, com efeito, uma grande parte da população não consegue, por exemplo, comprar medicamentos, estudar em universidades ou até simplesmente alimentar-se convenientemente, de que se trata senão de "desindustrialização" [ou mesmo "destecnologização"] "significadas", isto é, "desindustrialização" e "destecnologização" num estádio apenas político?...

Concluindo: o grande problema do capitalismo actual está longe de ser uma questão circunstancial ou pontual e consiste, de facto nisto, no tal "conundrum": como alimentar, recapitalizando-o continuamente, um sistema económico inteiro, sem mexer nos lucros, conservando ao mesmo tempo uma aparência [que é cada vez menos só política e mais objectiva, mais real, mais estrutural e mais intrínseca] de utilidade orgânica para as pessoas em geral para substituir as quais como mercado ainda não se inventou qualquer máquina?...

À excepção talvez da guerra?...



[Na imagem: "Un Homme, C' Est Rare", colagem sobre papel de Carlos Machado Acabado]

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

"Fernando Riera 1920-2010"


Morreu Fernando Riera, o técnico chileno que, em Portugal, foi, entre outros, treinador do Belenenses [clube com o qual esteve a um passo de ser campeão nacional] e do Benfica.

Com o Benfica, foi em três passagens pelo Clube, duas vezes campeão nacional e esteve numa final das Taça dos Campeões Europeus que o Clube com Eusébio, Coluna e Costa Pereira perdeu para o Milan de Schnellinger e Rivera.

Foi a primeira final da Taça dos Campeões Europeus que o Benfica não ganhou [no ano seguinte, voltaria a perder a final, dessa vez com o ultra-defensivo Inter de Helénio Herrera] depois de, com Guttmann, o "velho feiticeiro" austro-húngaro, ex-bailarino e astutíssimo psicólogo, ter vencido duas, uma contra o Barcelona e outra contra o Real Madrid.

Depois de Guttmann, o homem que dizia "não se importar que as suas equipas sofressem quatro golos desde que marcassem cinco", Riera fez figura de treinador pouco ousado, defensivo e perdedor.

Na Luz sofreu, com efeito, sempre com a 'maldição de Guttmann' contra cujo futebol de ataque [o célebre "passa-ripassa-chuta"] a sua própria concepção, mais artística e elaborada, do jogo foi sempre julgado; Guttmann que jurava que, depois dele, nunca mais o Benfica seria campeão europeu, "profecia" que, como é sabido, se cumpriria embora tivesse com Riera, feito uma carreira brilhante, interna e externamente, chegando, como disse, a essa final com o Milan com uma equipa verdadeiramente fabulosa onde pontificava Eusébio, à época uma estrela internacional, cobiçadíssimo em Itália que era, à época, o "país do futebol", em termos europeus.

Morreu aos 90 anos.

"Educação, Política Educativa e Conversas em Família" [por rever]


Da imprensa diária deste início de ano lectivo, retiro a notícia "epustuflante" de que, impressionado talvez com as constantes exigências que, nesse domínio, lhe iam sendo feitas [na televisão, por exemplo] o governo fixou metas para determinadas valências no âmbito educativo.

Assim, segundo, por exemplo, o "Diário de Notícias" de 27.09.10 são metas do governo para o corrente ano escolar "baixar os chumbos no secundário de 20,1% para 12%", "reduzir a percentagem de alunos que desistem da escola aos 16 anos de 13,08% para 4% além de "aumentar em 4 pontos percentuais as positivas a Matemática e a Português nas provass externas, do 4º ao 12º anos".

Ora, é preciso desde logo começar por dizer que uma pessoa---um português razoavelmente normal destes [mais "sucáticos" do que propriamente "socráticos"...] tempos que deviam, como aqueles de que falava Garcia Márquez num título famoso, ser da mais viva e franca cólera [cólera contra os extremos de degradação intelectual, cívica, cultural, social, económica e política---e de adequada correspondência em termos de vileza moral, é preciso dizer, também...---a que esta gente novembrista e invariavelmente duvidosa que nos tem governado de '75 para cá deixou chegar o 'regime'; um português nestas condições de sanidade mental e cívica de que falo e que tem obrigação de conhecer de ginjeira toda essa realidade, dizia, fica logo de pé atrás quando ouve falar em "metas" para uma Educação que aparentemente nada mais tem para apresentar em termos de pessoal e de argumentário técnico-científico assim como de substância e de credibilidade política [em substituição da verdadeira "distaster area" que foi o consulado anterior de uma tal Maria de Lurdes Rodrigues de mais que tenebrosa memória] do que folhetinistas pop, autoras de romancecos manhosos para meninos e meninas na idade do armário, entretendo-se com "conversas em família", que é como quem diz, "cantando os patinhos" para os meninos irem para a cama enquanto, persistentemente desatendidos e considerados inessencialmente como "questões de tesouraria", os grandes problemas no sector se vão amontoando atrás uns dos outros, completamente por resolver e, pior ainda, sem aparentes perspectivas de o serem.

Quero eu dizer: alguém acredita que um governo que se permite avançar com "descobertas" como aquela que pretende que os valores de insucesso escolar são, de forma necessária e, pelos vistos, automática, inversamente proporcionais ao número de alunos de uma escola, partindo de um referencial "teórico" que começa por ser 10, num ano, para no ano seguinte, "se mudar" paulatinamente para o dobro, i.e. para 20 alunos; alguém acredita que este governo e a tutela específica, supostamente técnico-científica, que por ele se expressa, tem credibilidade para fixar metas no que quer que seja relacionado com Educação?

Alguém acredita, estando no seu juizo perfeito, num ministério de educação que se permite afirmar que "está provado" que as repetências não têm acção relevante sobre a correcção dos valores do insucesso, uma afirmação que é obviamente a negação total, já nem digo de qualquer conhecimento pedagógico e didáctico, mas do mais simples e elementar bom senso?

Um poder [e uma tutela pedagógica e didáctica] que não percebem que as repetências só por si não corrigem nem deixam de corrigir quaisquer valores de insucesso tudo dependendo do modo como são concretamente organizadas e institucionalizadas, a saber, do número e da qualidade dos professores que lhe são atribuídos, das respectivas condições de trabalho, da estabilidade que é ou não garantida nas carreiras [gestão da motivação dos docentes] nos estabelecimentos escolares; de todo um conjunto de pessoal peripedagógico [dos chamados auxiliares de acção educativa aos pedopsicológogos] atruibuido efectivamente de acordo com critérios de funcionalidade e operatividade e não segundo ditames de mera tesouraria e uma [im] pura "i/lógica de amanuense e de guarda-livros" que tem sido a grande base das "políticas" "educativas" entre nós, de há várias décadas para cá, agravando-se de forma aguda e crítica com estes mais recentes anos de poder "socialista".

Isto no plano estrita [mas não estreitamente!] escolar, interno, sublinho: porque em termos amplos [a escola e a educação---não a Cultura!---não contendo em si mesmas o seu objectivo] têm sempre de ser, em todos os aspectos que compõem a realidade que cada uma delas é, incluindo os dispositivos motivacionais realmente relevantes, orientadas para o exterior de si mesmas.

Ou seja: se em torno da escola [e no que económica e socialmente se segue à escola] não houver capacidade estável, orgânica mesmo, sistémica, para absorver substantivamente a "produção" escolar, todo o edifício objectivo e subjectivo da Educação situado a montante perde [aí sim: automaticamente!] sentido e torna objectivamente impossível, por um lado, motivar as dinâmicas e dinamias primárias do sucesso e, por outro, no caso do insucesso, induzir secundariamente as necessárias dinâmicas correctivas e remediais.

Se eu souber, com efeito, que estou na realidade, sempre, de um modo ou de outro, a "estudar para desempregado" [ou para... "mal empregado", tendo em conta a degração aparentemente irregressível dos paradigmas e dos padrões de 'empregabilidade sistémica' actual] é isso, de facto, e não as repetências per se , como qualquer pesoa minimamente inteligente e normal sem dificuldade percebe, o que desincentiva sistémica e nuclearmente a eficácia dos programas e projectos remediais ainda antes de estes serem pensados e começados a pôr em prática.

Se, cumulativamente, estes forem... "pensados" "em cima do joelho" [muitas vezes por "pedagogos oficiais" que parecem ter adquirido a respectiva "habilitação" ou "capacitação" num qualquer curso postal de "Pedagogia para Tótós"], recorrendo a um corpo docente cronicamente desestabilizado, maltratado das mais diversas maneiras pela tutela, exercendo em escolas mal vigiadas, desprovidas de psicólogos e/ou sociólogos escolares assim como de dispositivos inteligentes de ocupação dos tempos e dos espaços não-lectivos; se, cumulativamente, dizia, for esta a realidade das nossas escolas sobretudo peri- e/ou sub-urbanas mas, infelizmente, não só dessas, o resultado final é a calamidade que se conhece [e reconhece!] hoje e que constitui, por tudo quanto disse, o terreno ideal para a acção dos charlatães e dos oportunistas de todo o tipo que acabaram por tornar a Escola em Portugal um verdadeiro exemplo acabado de "loucura organizada" e [mais grave ainda!] "institucionalizada"...

Não há planos de correcção do insucesso com metas como 4%... ao ano, como os juros bancários ou as taxas de interesse de qualquer outra instituição onde pratique a agiotagem...

Se já seria de encarar e considerar com reservas num universo educacional onde os técnicos fossem consistentemenmte recrutados entre os cientistas e investigadores efectivamente credíveis e não entre pessoal político e carreiristas "em trânsito", que dizer de um mundo onde são estes quem impõe os modelos educativos e confere forma concreta aos modelos por meio dos quais eles se expressam e se convertem em... "política"?

De resto, eu não creio que verdadeiros cientistas da Educação, considerando, desde logo, a realidade do nosso universo escolar público actual, tivessem a ousadia de avançar com qualquer coisa que se parecesse seque com uma "meta": com objectivos "horizontais", acredito---e acho não só desejável como essencial.

Apresentar metas como estas de 4% [não são 5%, um número exacto---como os 20 que estabelecem, vá-se lá saber... 'por alma de quem'!...---para os pensadores ministeriais a fronteira "absoluta" entre o sucesso e o insucesso enquanto "categorias" a priori, categorias kantianas, "filosóficas", "metafísicas", talvez, do "pensar pegagógico": são 4 e nem mais 1...]; apresentar valores como este, conhecendo nós "do que é que a casa gasta", cheira a manipulação---à criação de um "horizonte de pressão manipulativa"---à légua.
Soa a aviso e a "proposta que ninguém pode recusar".

Falta, claro, o "pormenorzinho" da substanciação técnica dos valores avançados: quem fixou [e o que foi que permitiu fixar?] os 4%?

Com base em que prospectiva, em que estudos técnicos, em que universo profissional e institucional?

É obviamente uma ideia [uma intenção, para já] virtuosa: agora, como quase tudo o que sucede em matéria educacional e educativa entre nós mais do que um ptrojecto, é um "supônhamos" onde a convicção parece mais uma vez substituir-se à opinião e onde a fé passa com a maior das naturalidades por prospectiva...


[Na imagem:]

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

gilbert becaud ET MAINTENANT 1962

Esta noite sonhei... não com Brueghel, como titulava Fernanda Botelho num dos seus últimos livros, mas com... Bécaud, o "epustuflante" misturador e agitador de desmesuras e vulgaridades sonoras, algumas das, todavia, queiramo-lo ou não, são hoje já parte de um imaginário colectivo europeu que, ainda quando começamos, por num primeiro [e às vezes, até num segundo e num terceiro...] momentos por recusá-lo, é hoje, indiscutívelmente nosso...

Senão mesmo, num certo sentido muito preciso, para o melhor e para o pior, o nosso...

"É Tempo..."


...de ser tempo?...

"Uma Coisa que Abomino!..."


A ideia muito... "Cristo de los gitanos, siempre con sangre en las manos, siempre por desenclavar" de que religiosidade e morte são sinónimos.

Dito de outro modo: a ideia de que "sagrado" igual a "sangrado"...

Para mim, não! Bem me basta que seja, pelos vistos, na sua versão mais terrenamente vaticana, igual a uma série de coisas absolutamente indignas e abomináveis onde se originou o hábito de haver sempre um Papa qualquer que vem regularmente pedir perdão a alguma coisa---ou alguém---evitando, todavia, cuidadosmente alterar o que quer que seja ou, no mínimo, adiando sempre quanto pode o instante absolutamente decisivo e inevitável de fazê-lo...

[Na imagem: "Deus É Alegria [Se Me Lembrasse Como Se Diz Em Latim, Dizia...", colagem sobre papel de Carlos Machado Acabado]

"Pride, Prejudice & the Mechanics of Progress"


Sem querer parecer [e ainda menos, ser!] retórico, diria que é cada vez mais firme convicção pessoal minha que grande parte do que entendemos serem as grandes "conquistas" civilizacionais se deve muito mais a vitórias arduamente obtidas pelos indivíduos e pelas sociedades por eles constituidas sobre os seus próprios pré-juízos e 'fantasmas' interiores [mentais, conceptuais, etc.] de toda a espécie do que propriamente aos que, indivíduos e sociedades humanas, julgamos ter conseguido vencer, com muita frequência pela força, nos outros.

Dou três exemplos que, um pouco ao acaso, me chegaram recentemente.

O primeiro tem a ver com feminismo e vem de uma obra de Joel Serrão ["Da Situação da Mulher Portuguesa no Século XIX", ed. Livros Horizonte, col. Horizonte, nº 48, Lisboa, 1987].

Na obra em causa, se debruça, como o próprio título expressa, Joel Serrão sobre a obra da pedagoga e estudiosa Maria Amália Vaz sde Carvalho, e diz textualmente:


[...] segundo pensava, a mulher "nunca será um funcionário pontual, nem um magistrado íntegro e inexorável, nem um operador de execução firme e rápida, nem um médico, nem um legislador.

Os que pretendem", insiste, "persuadir-lhe que exijka eses privilégios masculinos detestam-na, e querem perdê-la irremediavelmente". "E porquê essa condenação eterna ao limbo da secundaridade? Bem...É melhor voltar a conceder a palavra à escritora:

"A vida psíquica [da mulher] é periodicamente e crudelissimamente perturbada pelas crises da sua vida fisiológica. Eis o mistério sagrado e doloroso, que, revelado, dá a chave de todas as suas contradições e de todos os seus errros".


É preciso dizer que esta visão inescondivelmente positivista e materialista da realidade que hoje não pode, repito, deixar de causar estranheza e mesmo, no imediasto, algum reconhecível [e entendível] desconforto intelectual e crítico, possui, mau grado isso, uma relevância dialéctica específica que seria leviano ignorar---isto na medida em que, exactamente porque a História [e dentro dela a cultura são como os "caminhos" de Machado, isto é, antes de mais "estelas en la mar" sendo que não existem verdadeiramente caminhos, fazendo-se na realidade caminho "a andar"] ela, visão positivista, representou, na realidade, em si mesma, um avanço considerável sobre as formas de pensamento providencialista e transcendentalista e, por isso, disfuncionalmente "finalicista", que, de um modo global, influenciaram as formas tópicas de representação da realidade que antecederam a emergência do positivismo no século XIX europeu e deram origem a muitas das visões "metalinguísticas da História" que ainda hoje, aqui e ali tendem, apesar de tudo, a perdurar.


Lido o texto de Maria Amália Vaz de Carvalho, hoje, é, com efeito, quase irresistível a tentação de questionar instintivamente: Maria Amália Vaz de Carvalho, cujo nome foi escolhido para a designação de um dos mais prestigiados liceus femininos da capital lisboeta um caso de... machismo?

Obviamente, a esposa [e depois jovem viúva] do poeta Gonçalves Crespo foi, na visão que teve da Mulher, um fruto natural das concepções do seu tempo em matéria de identidade [e/ou de estrutura biológica] de género [e até, em termos mais amplos, de condição humana] que teve---necessariamente, de resto---de fazer passar para a sua importante obra de pedagoga e educadora.

Está, por conseguinte, de um modo muito claro, longe de constituir propósito de quem aqui a cita proceder a qualquer absurdo 'julgamento' a posteriori das ideias de Maria Amália Vaz de Carvalho [aqui contidas na obra "Cartas a Luisa"] mas tão somente demonstrar o caminho que foi preciso percorrer até se alcançar o quadro de igualdade [formal, pelo menos: efectiva, é outra coisa...]

Exactamente ao contrário [quero voltar a sublinhar isto de modo muito claro, muito particular e muito terminante] para o tipo de abordagem marxista do real e especificamente da História que pretendo que seja em todos os casos a que de qualquer delas faço, nada do que sucede no tempo [no tempo político, no tempo cultural, no tempo social, no tempo civilizacional] é organicamente dissociável desse mesmo tempo em que ocorre, num processo contínuo de interacção dialéctica onde toda a realidade "é feita", é construida e é enviada [sempre inevitavelmente... por construir] para o futuro onde o processo prossegue sempre, tão activa quanto ininterrupta e sempre organicamente.

Aquilo que aqui moveu a transcrição do texto de Joel Serrão incluindo nele a citação de Maria Amália Vaz de Carvalho foi, pois, precisamente dentro dessa linha dialéctica e sempre escrupulosamente dialectizadora da abordagem da matéria histórica, evidenciar como a modernização formal do País, nesta como em diversas outras matérias, é antes de mais um processo recentíssimo, não sendo por isso, no fundo, de estranhar, como também escrevi, que muitos dos fantasmas e dos espectros cultu[r]ais que cada um de nós foi tendo de eliminar e enterrar definitivamente no curso deste último século em inúmeros domínios e matérias constantes da nossa existência histórica e mental ou cultural comum persistam teimosamente em reapresentar-se de forma recorrente à nossa vivência inconsciente [mas, não-raro, perfeitamente consciente, também!] colectiva ainda hoje e em muitos casos sem que disso [e do que isso pode em termos práticos significar] nos demos verdadeira conta.

Mas porque falei em Marx e porque o autor de "Das Kapital" representa assumidamente para mim um referencial estável de concepcionação das realidade, devo dizer que nem o própruio Marx estará possivelmente inocente de pré-juizo e meras convicções [ou "conviccionações" passando correntemente por juizos objectivos e sempre objectualmente argumentáveis .

É, pelo menos, essa a persuasão de Jean Barrué que, em "Bakunine e os «Anais Franco-Alemães» (1843)" escreve : "Bakunine pan-eslavista? Marx pan-germanista? São fórmulas de polémica exageradas ou caluniosas. Digamos que Marx era ferozmente anti-eslavo [artigos de «Nouvelle gazette rhénane» em 1848-1849, são testemunho); mas digamos também que Bakunine foi várias vezes anti-alemão.

O seu ódio ao pan-geramanismo, ao Estado e ao militarismo prussianos, estendeu-o ao povo alemão em geral, ou utilizou fórmulas, por vezes, confusas. Na «Confissão», fala com complacência do ódio natural do eslavo ao alemão"


[Cf. Jean Barrué, "O Anarquismo Hoje", trad. port. de José Gabriel, ed. port. Assírio & Alvim, Cadernos Peninsulares, nova série, nº 17, Lisboa 1976]

[Na imagem: Capa da edição original de "Pride and Prejudice and Zombies" de SethGrahame- Smithe]

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

"E, se de repente..."




...alguém lhe dissesse que, na realidade, Carlos Queiroz, "o técnico com a competência mais secreta do futebol português", era, afinal, "apenas" o actor Ralph Fiennes disfarçado que tinha vindo a Portugal escolher os locais para filmar o seu novo sucesso?

"Uma imensa surpresa!"---diriam seguramente alguns.

"Também isso!"---respondo eu---"Também isso!"

Mas não só, de facto!

Tanto ou mais do que isso seria, sem a menor dúvida, a melhor maneira de ficarmos todos a perceber o essencial do que foram estes anos mais recentes da "estória" da selecção nacional de futebol em matéria de [in] sucessos competitivos...

"Ora, vejam lá..."


"Como nas Telenovelas da Quatro!"


Se a vida fosse minimamente como naquelas inenarráveis "novelas" da "Quatro", alimento diário do [de resto, escassíssimo!] espírito dos "sobreviventes" de outras magnas patacoadas televisivas que vão do "Preço Certo" aos "Ídolos" e do inominável "Big Brother" às pornochanchadas cíclicas com a Catarina Furtado; se a vida fosse assim, dizia, como nesses resultados [felizmente apenas... ] ficcionais diários da não menos metronómica e infalível paragem quotidiana do cérebro de alguém [e das lobotomias de muitos outros...] que são as "histórias" da TVI com todos aqueles pais que, afinal, eram na realidade o cão da família disfarçado e aqueles primos que, afinal, são primas, talvez, um dia, se descobrisse que o antigo jogador de futebol do "Fê-cê-pê", Artur Augusto, um dos primeiros internacionais portugueses da modalidade, era, afinal de contas, o tio-avô há muito emigrado no Brasil do também ex-futebolista do Glorioso [e hoje seleccionador nacional] Paulo Bento, algo que as semelhanças entre ambos parecem, aliás, confirmar em pleno...

"Birds of a feather" diria, talvez, o meu Tio Wilfred que [se calhar por ser inglês, não sei...] passava a vida a pensar e a falar nessa língua...

Por que creio em Jesus... [rascunho, muito incompleto]


Eu explico já, se me dão licença as razões para a minha conversão...
Devo começar por dizer que eu era completamente ateu até aquele que é o actual técnico do Benfica ter ido treinar o "velho Belém" ...
Ai, vi a... luz.

Estou a brincar, obviamente.

O Jesus de que falo aqui é o Jorge, o "Monas", o antigo futebolista de nível mediano que se converteu num extraordinário treinador que [felizmente, para mim e para o Clube!] decidiu elevar esta segunda carreira profissional---a de treinador---à máxima potência ou maior denominador nacional comum que é obviamente o "meu" Benfica.

Gosto de Jesus, primeiro, porque é um técnico extraordinário e eu sou adepto de um Clube extraordinário; depois, porque não é [deixem-me lá recorrer aqui à ajuda de um lugar-comum que dá sempre muito jeito, nestes casos!] porque não é politicamente correcto e eu detesto gente dessa "família" ou desse "clã", infelizmente tão comum em Portugal; por fim, porque me parece ser das poucas pessoas entre nós que, quando fala, transmite a ideia de saber exactamente o que quer dizer e por que o diz e não de estar a ler [ao sabor do acaso, ainda por cima...] palavras soltas de um dicionário malaio-cipriota ou turco-servo-croata...

Há quem diga que não sabe falar---o que num país de gente que SÓ SABE falar temos de reconhecer não deve ser coisa fácil de digerir---e, sobretudo, de perdoar...
Não saberá mas também, "isto é como o outro", com o tal acordo que os sábios "socráticos" nos querem impingir quem é que pode gabar-se de saber, não é?...

Ainda se fosse inglês técnico ou coisa assim... agora Português!...

Bom mas, dizia eu, que há muita gente de "sólida cultura" e invejável "erudição" no futebol português [daqueles que mandam médicos para a não-sei-quê-da mãe e batem em jornalistas---"vocês sabem de quem é que estou a falar"!... Eh!Eh!Eh!] que podia aprender com o 'portuguezinho das dúzias', esclarecido e cheio de talento a exprimir aquilo que os... "sábios" [entre os quais me incluo, por razões que mais abaixo, se tiver tempo, detalharei...] ou alguns deles [os que ainda sabem como se faz e já não são assim tantos como isso...] pensam.

Do "Diário de Notícias" de 12.09.10, com efeito, retiro a citação de uma coisa que há muito eu próprio penso e que eu tenho de reconhecer que dificilmente diria com a precisão e o esclarecimento com que o faz o treinador do meu Clube.

Ora vejam.

A propósito do jogo com o Vitória de Guimarães em que uma arbitragem absolutamente inqualificável de má [de um árbitro que já tinha antes demonstrado estar convencido de que uma bola palmo-e-meio-dois-palmos dentro da baliza não é golo...] fez demonstravelmente o resultado e baralhou por completo uma classificação que, sem isso, seria, obviamente outra, substancialmente diferente.

Sucede que, após o jogo em causa, os jogadores do Benfica retiraram para os balneários cabisbaixos, desmoralizados, revoltados, com a moral feita em... fanicos.
E como geriu isto Jorge Jesus?

Bom é aqui que faço entrar a citação de que há pouco falava.
Diz, então, o jornal:
"Prejudicados ou não, o técnico, que sentiu o balneário desanimado com o trabalho de Olegário Benquerença, apontou logo baterias para o futuro, tentando deixar para trás o que se tinha passado no relvado do Dom Afonso Henriques.

Mas a conversa de balneário.
Alguns pontos:
Primeiro, como é que se sabe tudo isto, cá fora?

Não tenho resposta certa, segura, obviamente mas, sendo Jorge Jesus o homem astuto que é e Rui Costa o dirigente avisado e esclarecido que já demonstrou, pelo seu lado, ser, gostaria de acreditar que se soube porque o Clube quis que se soubesse a fim de que aos sócios e simpatizantes benfiquistas chegasse mais ou menos... 'obliquamente' a mensagem de que os jogadores estão determinados a não deixar-se abater pelos acidentes de percurso como aquela deplorável arbitragem de Guimarães e que assim eles próprio adeptos [e por mim falo que, confesso, não fiquei exactamente empolgado após a terceira derrota consecutiva no campeonato...] o devem estar, também.
O que se "encaixa", aliás, perfeitamente naquela outra iniciativa envolvendo comunicados e... recomunicados aos órgãos de comunicação social que são, do lado do Clube, outros tantos movimentos estratégicos de intervenção e... sério aviso no sentido de se pôr um ponto final num estado de coisas com influência [negativísima!] directa numa indústria que envolve investimentos vultuosos e por isso riscos financeiros consideráveis, na proporção directa daqueles.

[Pode-se, noutro plano discutir, como ainda há pouco, um amigo meu fazia, aliás, se não é questionável---para não dizer: se não é escandaloso...---não só que tanto dinheiro vá para o futebol como, sobretudo, por outro lado, que muitos daqueles que mobilizam e se mobilizam para intervir contra "coisas" como esta num domínio reconhecivelmente não-determinante e não-essencial para a vida das pessoas e das sociedades como é o futebol seriam incapazes de fazê-lo para intervir precisamente naquelas áreas e domínios da nossa vida colectiva que o são.

Eu acho que sim e em ambos os casos, devo desde já dizer sem reservas.
Agora, sobretudo neste último caso, uma coisa não exclui a outra, ham?
A diversão das pessoas como aqueles aspectos da vida que são determinantes para o bem estar e para a dignidade delas possuem o seu lugar específico na própria vida e o problema não é, em última instância, necessariamente se se intervém demais num dos dois domínios: é, exactamente ao contrário, se se intervém de menos no outro, o que faz a sua diferença, ham?...]

Bom mas voltando à nossa análise das declarações de Jesus:
Segundo ponto: o Benfica foi clamorosamente prejudicado no jogo de Guimarães tal como, em menor escala o havia sido no anterior com a Académica de Coimbra, isso é tão mais irrefutável quanto o próprio dirigente máximo da arbitragem em Portugal, já o reconheceu expressamente.
Agora, uma coisa é a "ajuda" que nos dão de fora para perdermos; outra, é aquela que nós próprios para isso involuntária mas de modo algum irrelevantemente damos.

E o Benfica deu-a.

Deu-a com a dispensa [vista do exterior, precipitada] do guarda-redes experiente e genericamente qualificado que fora campeão na época anterior.
Deu-a com a contratação pelo preço de uma estrela de um guardião que o não era e que, por isso, para valer o investimento, devia ter sido contratado no pressuposto da manutenção do anterior a fim de que ele pudesse ir-se gradualmente adaptando e encaixando nos mecanismos e dinâmicas de jogo da equipa.

Deu-a com a dispensa [aliás, em si mesma, inevitável] de dois jogadores absolutamente essenciais para a conquista do título, Ramires e Di Maria, uma cedência, porém, muito mal preparada em termos de suplentes ou da alteração bdo próprio modelo de jogo.
E deua-a obviamente com o facto de o investimento feito no guarda-redes espanhol de que atrás falo que, de tão vultuoso, bloqueou uma série de soluções exactamente para este último aspecto de que falo.

Portanto, se é estrategicamente avisado, começar já muito determinadamente a "marcar terreno" em matéria de comunicação para o exterior ["to whom it may concern", como dizem os anglo-saxónicos nestes casos...] não o é menos [e eu tiro o meu chapéu a Jorge Jesus por ter tomado, ele próprio a inciativa---absolutamente essencial---de não deixar escapar esse... "pormenor"] reflectir muito setiamente sobre aquilo aquilo que há a fazer internamente para resolver os problemas do rendimento da equipa de futebol, profissional do Clube.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

"Como 'Pensa' a Desumanidade e 'Argumenta' a Injustiça' [Por rever]


Por uma razão qualquer que se prenderá, talvez [na melhor das hipóteses... ] com imperativos de um súbito... "pudor humanitário e civilizacional" temos sido ultimamente poupados às "explicações e reflexões" pró-israelitas de Ester Mucznik no "Público" onde houve um tempo em que eram, como se saberá, mais comuns que as batatas fritas com o bife ou e mais assíduas do que as sua 'irmãs' cozidas com o bacalhau...

De uma hipotética "fase" intermédia, retenho aqui um texto intitulado "Árabes israelitas, uma ponte para a paz?" dado à estampa a 23.10.08 onde, de acordo com o título pomposo, se aborda a questão da minoria árabe "integrada", no Estado de Israel.

Começando por traçar um quadro aparentemente risonho da condição em esta vive [há "já" "diplomatas", "embaixadores" e até juízes árabes em Isreal---há, na realidade, um, diz esta "regular frequentadora" do país...] meia dúzia de linhas mais adiante a já, porém, a reconhecer que, sob esta [e cito] "autêntica revolução" operada no Estado de Israel desde "os anos sessenta" [lenta revolução esta, sem dúvida!] subsiste---acaba a autora por reconhecer---uma situação em que "existem muitas desigualdades que alimentam o descontentamento e o sentimento de exclusão".

Ora, perante isto, diria eu que, com sorte e se a... "revolução" for capaz de superar o "descontentamento" e de se impor às dinâmicas profundamente disfuncionais e disfuncionantes que resultam da contínua pressão desintegradora das "desigualdades" [até uma acérrima advogada das posições oficiais do colonolianismo israelita tem de reconhecer a existência de situação de exclusão e de "graves incidentes" envolvendo a "condição árabe" dos "integrados" em Israel...]; com sorte, dizia [e a não haver qualquer "azar" daqueles que referi pelo meio...] daqui a, por este andar... meio século teremos, "idealmente" novo passo em frente na luta pelos direitos humanos e pela dignidade dos árabes "integrados" em Israel...

Se não formos muito exigentes [como a autora, desde logo, manifestamente não é] poderemos até concluir dizendo: nada mau, ham?...

Bom mas o que é engraçado [e justifica o títrulo que decidi dar a esta "entrada"] é a constatação que aquela, a autora, faz de que apesar da "revolução" [pontuada embora pelos tais "graves incidentes"] [e volto a citar] "nenhum árabe quer abdicar da sua cidadania israelita em troca de uma eventual cidadania palestiniana".

Ora, este é sem dúvida um caso de "manta curta" muito característico, aliás, do argumentário típico das opressões onde quer que elas surjam mais ou menos astuciosamente disfarçadas de "liberdade" e de "democracia"---uma "manta curta" que, puxada, quando dá jeito, de um lado, destapa inevitavelmente o lado oposto, deixando fatalmente o desajeitado "puxador" "argumentativamente ao frio"...

Primeiro, porque com passagens como aquela em que se 'descai', admitindo, de forma expressa, por exemplo, que "nos anos sessenta poucos árabes circulavam nas ruas, a não ser nas aldeias onde se concentravam"] diz seguramente quase tudo sobre o Israel brutal, supremacista, desordeiro e mesmo abertamente terrorista das origens do qual se chegou, como se sabe[andando em muitos domínios, na realidade, muito pouco...] ao Israel "educadamente para-genocida" dos nossos [mal-disfarçadamente concentracionários] dias de "apartheid" anti-árabe de facto e, sob diversos aspectos, de jure também.

Eu diria mesmo [não sejamos nós, aqui, ingénuos a ponto de deixar-nos "enrolar" pela propaganda oficial do colonialismo israelita!] que que aquilo subjaz, nas próprias palavras da autora, em termos de imagética [in-, des-] cultural [mesmo habilmente "dourada" com a alusão directa à "revolução"] ao seu argumentário é um tipo de eco ou de réplica persistente e muito nítida do quadro mental e social de "um certo sul" "hillbilly" e "redneck" dos Estados Unidos segregacionistas e "ku-klux-klanianos" ou sul-africano seu contemporâneo e [por que não ter a coragem de rechecê-lo?] não completamente erradicado, num caso e noutro, ainda hoje.

Falo obviamente do Sul de Rosa Parks e de Luther King, o Sul e dos linchamentos regulares de negros [nunca levados a cabo, porém---há que, apesar de tudo, reconhecer em seu abono---pelo exército norte-americano, sob a forma de uma prática tópica generalizada e organizada, agressora e invasora, como acontece com Israel relativamente à faixa de Gaza e até com o Líbano onde, todavia "as coisas fiaram bem mais fino" e o invasor viu atónito as sua brutais políticass de "guerra total" terem uma réplica que lhe terá seguramente ensinado qualquer coisa...] ou a África do Sul das "townships" e dos Terres Blanches de tenebrosa memória.

Segundo, porque tudo o que a autora tem para substanciar a ideia de "revolução" deste status quo social, civilizacional e humanitariamente inquietante que é a vida das populações palestinianas em geral, é a tal estatística de um "token judge", um "token candidate" às eleições, "muitas desigualdades" "exclusão" e, "comme par hasard", de vez em quando uns... "graves incidentes"... "para aquecer" ou para "decorar" a situação---e nada mais, na verdade do que isto...

Ora, isto é "pâuco", como diria uma conhecida locutora nortenha de rádio, transvestida de apresentadora de um [aliás, inenarrável] "concurso" televisivo, ainda não há muitos anos, entre nós...

Mas o que há de verdadeiramente interessante na tal "tese" da "revolução" é mesmo a afirmação de que "árabe" algum deseja perder o referencial de prosperidade que é o Estado de Israel para os judeus.

O que está pressuposto nisto é evidente por baixo da "leitura significada" feita pela propaganda oficial, pelo marketing do opressor.

Desde logo, que o fosso entre israelitas e árabes é imenso.

A autora do artigo reconhece-o, aliás, com todas as letras.

Não vale a pena voltar a citar do texto para atestá-lo.

Depois, que, se assim é para os "token arabs", o que será e como será para "os outros", para os que estão, em geral, fora e longe dos focos da sempre útil e decorativa "token-hood", diga esta respeito aos árabes, às mulheres ou às minorias de qualquer índole e natureza, conforme... a "hora e o local em que nos estejam a escutar"...

... por exemplo aqueles que em S. João de Acre protagonizaram os "graves incidentes" a que se refere a autora e que, recordo, envolveram "milícias populares", "vigilantismo" civil e "caça ao árabe" durante vários dias, tudo isso organizado pela maioria judaica naquela cidade portuária do Norte de Israel...

Mas, na realidade---e esta é que é a questão de fundo que a propaganda oficial sionista tenta desajeitadamente apresentar completamente... "às avessas"; na realidade, dizia, quem é que, em seu juízo perfeito, perante o quadro aterrador das "muitas desigualdades", da "exclusão" e da ameaça constante de "graves incidentes", opta conscientemente por eleger "o lado errado" da iniquidade e da opressão, representado pela duríssima realidade da situação [ou da... condição racial e social?] da comunidade palestiniana, atentatória dos mais elementares direitos humanos, escolhendo-a como referencial cívico, social e político senão mesmo civiliacional??!!!

Qualquer indivíduo normal que, perante as indignidades, as abjecções, as violências, as exacções, as brutalidades de todo o tipo; numa palavra: perante a tragédia humanitária, o para-genócio social e até físico do seu próprio povo às mãos de outro; qualquer indivíduo que, colocado perante essa realidade, optasse conscientemente por lutar para manter tudo isso exactamente como está ou para que tudo o que, mau grado os obstáculos, se logrou melhorar regressasse à abjecção original, só poderia ser considerado ou louco furioso ou, pura e simplesmente, traidor.

E isto exactamente porque ninguém, a começar pela autora do artigo do "Público", é suficientemente desonesto em termos intelectuais para ser capaz de negar que a situação económica, social, política etc. da maioria israelita é incomensuravelmente superior, a todos os níveis, à dos árabes tal como ninguém nega que o que está certo---ética e civilizacionalmente certo---é precisamente que o estatuto económico, social e político dos israelitas se alargue a toda a população e não obviamente que os pouquíssimos árabes que conseguiram vencer a barreira da segregação e da exclusão regressem para estas!!!

Isso não cabe na cabeça de ninguém---com, pelos vistos, a única excepção da propaganda oficial ou oficiosa do sionismo...


Para mais quando é o próprio opressor e os seus porta-vozes internos e externos quem reconhece, ponto por ponto, aliás, a situação que as vítimas e todos quantos não aceitam trocar a moral e a defesa dos direitos humanos mais básicos e fundamentais por... petróleo ou lítio ou outra matéria-prima ou mercadoria qualquer vêm, de resto, há muito denunciando...



[Imagem ilustrativa representando um soldado do exército israelita envergando uma T-shirt com uma mulher árabe grávida e a legenda "com um tiro, duas mortes" extraída com a devida vénia de hollow-hill-dot-com]

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Heaven For Everyone

Kitsch? Art Déco? Musique... Déco?

Com certeza!

Talvez seja mais correcto, aliás, até dizer: "Campitsch", ou seja, uma [aliás, musicalmente eficientíssima!] mistura de "camp" e de "kitsch".

A verdade é que deste muito... "queenianamente" envolvente [sonoramente "arquitectónico" e caracteristicamente barroco] "Heaven For Everyone" se desprende uma tal generosidade [musical e, claro, tratando-se de Freddy Mercury, interpretativa mas, também, e num certo sentido, sobretudo, de ideias e propósitos] que é impossível ficar-lhe indiferente e não experimentar por ele a [assumida!] simpatia com que aqui é republicado lado a lado com diversas outras coisas, musicais e não só, que o Tempo acabaria por revelar serem, afinal, a seu modo, tópicas e até, em mais de um sentido, clássicas e definitivas...

"Ah Ganda Benfica!"


Eh! Pá! Vocês matam-me do coração!...
Se não for com os choques, é com as alegrias como a de ontem!...
Ah! "Ganda Benfica"!
Bolas! Pá! Se é da sorte de um homem nesta Terra fazer figuras tristes, ao menos que seja... por uma boa causa, não?...
Vivó Glorioso, pá!...

domingo, 19 de setembro de 2010

The War Song ( English & Portuguese)

Falemos, agora, um pouco do Afeganistão, do Iraque, do Médio Oriente, do lítio, do petróleo, das petrolíferas, do Karzai, do Bush e do Obama, do Netanyahu---e dos imbecis que, em todo o mundo, contribuem todos os dias com o seu silêncio ainda quando o não fazem de forma directa e activa, para que todas essas coisas e pessoas continuem impunemente a fazer da Terra um lugar de horrores e abjecções de todo o tipo, de Ruandas, de Zimbabués, de Abu-Ghraibs, de Faixas de Gaza ou de Guantánamos e de onde apetece, por isso, cada vez mais de uma vez por todas fugir para nunca mais voltar...

"Metade da História Chega Perfeitamente Para Se Ser Feliz..."


Sejamos sérios: não existem "meias Histórias" nem "três quartos de" Política ou de Civilização"...

A História [como a Política e as Civilizações] resulta necessariamente de circunstâncias humanas, muitas vezes imprevistas porque imprevisíveis, outras, por outra razão qualquer, algumas, exactamente ao contrário, extremamente fáceis de antecipar e de prever mas nem por isso menos determinantes que as anteriores.

Todas elas com as respectivas consequências objectivas e subjectivas entram no Tempo juntamente com todo um conjunto mais ou menos preciso e demonstrável, de decorrências e responsabilidades de natureza material e cultural, eticamente ao menos, indissociáveis da realidade [e da identidade] dos povos e dos indivíduos que as corporizaram e lhes deram rosto e existência concretos.

Essa é, quanto a mim, aliás, uma das características mais importantes da visão marxista da História de que, devo dizer, conscientemente me reivindico---essa de que que não há "metades de História" ou de que esta é, como já não sei que distante entidade mítica, perdida algures no fundo de uma já frágil memória dos meus remotos tempos de liceu, "una e indivisível" e [acrescento eu, agora] "intrinsecamente insusceptível de redução ou... atenuação".

É certo que há em toda a parte e em todas as épocas quem acredite ser possível precisamente "atenuar" ou "amortecer a História", o seu impacto nas sociedades e nos povos, "afofá-la" ou "abrandá-la", talvez até, muitas vezes... "enternecê-la" a fim de "bolear-lhe as arestas" demasiado vivas, tornando-a globalmente mais "cómoda" e mais facilmente habitável.

Há, de facto, sempre gente caridosa e, algumas vezes, bem intencionada que acredita ser possível "comover a História" e, de um modo mais lato, a realidade e levar mesmo, no limite, uma e outra a cederem aqui-e-ali onde os utópicos "reformadores" entendem que ela "fica demasiado justa aos povos" tornando-se o seu uso, individual e colectivo---o seu "uso social, cultu[r]al e político"---excessivamente... desconfortável e, por isso [para muitos essa constitui mesmo a consideração fundamental] potencialmente "perigoso".

Para o marxismo trata-se pois de "substituir a História" onde ela funciona mal ou, como é o caso dos tempos que vivemos, tende mesmo a deixar definitivamente de funcionar.

Aquilo que aqui proponho, agora, como projecto de reflexão é precisamente que todos quantos partilhamos deste olhar global e real---epistemologicamente!---redentor que o marxismo lança contínua mas, sobretudo, estruturalmente sobre a realidade nos dediquemos a um brevíssimo exercício de análise e reflexão incidindo sobre as observações que Campos e Cunha produziu no "Público" de 17.09.10, num texto intitulado "Visto prévio".

Neste debruça-se o ex-ministro de Sócrates sobre a recente "questão" do "visto prévio" a apor pela chamada Comissão Europeia aos orçamentos nacionais dos não-sei-quantos países que compõem o actual "catálogo" de nações constituindo a "Europa institucional".

Sintetiza Campos Cunha, a dado passo---a meu ver com a dificilmente refutável lógicas das evidências: "Quem está contra o chamado visto prévio por Bruxelas das intenções orçamentais de cada país é estar contra a nossa participação na União Europeia".

Está a ideia aí contida expressa num português "esquisito", macarrónico mesmo, que surpreende por constar do discurso de um professor universitário?

Pois está mas é preciso reconhecer que é absolutamente correcto como ideia.
Ao lê-lo, pensei num episódio ocorrido comigo numa escola onde leccionei e onde era forçado a ouvir constantemente referências "cordialmente condescendentes", chamemos-lhes assim, "lá aos teus camaradas", sempre que um tópico qualquer de política educativa entrava nas nossas discussões profissionais.

"Cá os meus camaradas" [não vale a pena identificá-los: nunca escondi onde politicamente me situava e continuo, de resto, a situar...] serviam [à mistura com um brumoso e mítico, muito convenientemente vago, "depois do 25 de Abril"] nesse contexto... "amigavelmente distanciador" para situar muitos dos males, dos erros, dos absurdos e até das genuinas aberrações de política educativa com que, a cada passo, nos íamos deparando, com a curiosidade [dificilmente explicável, aliás] de esses e essas terem invariavelmente sido cometidos e cometidas por outros: obviamente por aqueles que, instalados no poder, dispunham da possibilidade efectiva de cometê-los o que estava longe de acontecer com tais "os meus camaradas"...

Um dia, porém, chegou ao grupo pedagógico por nós formado a informação de que "uma tal C.E.E." que, de supetão e sem perguntar fosse a quem fosse se a queria [como é, de resto, seu apanágio---não se afastaria, aliás, como é sabido, um milímetro dessa linha autocrática e impositiva depois de ter sofrido a brutal mutação de laboratório que a tornaria de "comunidade económica" que nunca deixou de ser numa suposta "União" que dificilmente, por esta via, chegará alguma vez a constituir---e isto é ser optimista...]; um dia, porém, dizia, então, chegou ao grupo a informação de que, de acordo com as leis dessa "tal C.E.E." que assim fazia a sua aparição na vida concreta de todos nós, professores de outras nacionalidades passavam, ao abrigo da política de livre circulação no espaço da mesma, a dispor da possibilidade legal de leccionar em Portugal.

Ora, sendo nós, professores de Inglês e Alemão, a nova legislação vinha [como dizer?] embater de frente no futuro profissional de cada um de nós, como era evidente.

Se, de repente, os corpos docentes das escolas portuguesas se enchessem de alemães e alemãs ou de ingleses e inglesas, a leccionar em igualdade de circunstâncias connosco os respectivos idiomas, que iria ser de nós profissionalmente?


Podíamos, claro, aspirar a ir, em... "troca", ensinar portugês para Berlim ou Londres mas... quem honestamente podia acreditar que alguém, fosse quem fosse, em Londres ou Berlim estava realmente interessado em aprender português?...

E, de súbito, quem passou, bruscamente, a "ter razão" foram , nem mais nem menos, do que "cá os meus camaradas" e, não menos de repente, "tornou-se urgente" fazer qualquer coisa para proteger o sector particular, "específico", da docência das línguas vivas e evitar que a tal livre circulação fosse válida no âmbito delas...

Por outras palavras: "não mais de metade da História [dois terços dela, vá lá!...] era a quantidade certa da mesma", ou seja, "metade da realidade chegava-nos perfeitamente para sermos completamente felizes"...

Dito isto, volto um pouco atrás, ao início destas notas, para concluir que, por tudo quanto disse, por uma vez, ao menos, não posso honestamente deixar de dar razão a Campos e Cunha e às observações que produz no seu artigo, designadamente às que constam da [mal-enjorcada, embora] frase que citei.

Ou seja, dito de outro modo: eu sou um fulano normalíssimo que, como qualquer outro, não gosta que o intrujem, impingindo-lhe por todos os meios [e alguns deles francamente indignos de gente séria, como o tal Tratado de Lisboa que constitui demonstravelmente um dos mais gritantes e escandalosos exemplos de ilegitimidade democrática e de indignidade política e até pessoal de uma série de gente, infelizmente grande parte dela portuguesa]; impingindo, dizia, uma "Europa" feita "por medida", i.e., à medida dos grandes interesses económico-financeiros que não mudaram um milímetro de objectivos desde que, há meio século, estavam a tentar alcançar os mesmíssimos resultados que hoje visam---por uma via, que, por sua vez, conduziu à emergência histórica das 'ditaduras tópicas' dos anos '20 e '30 do século passado e, no limite, a uma segunda guerra mundial, duas décadas apenas após os "unfinished businesses" que, nessa área da afirmação histórica e política de um determinado modelo de organização sobretudo económica, resultaram da primeira.

Mais ainda: discordando, de forma assumida, dessa "Europa a martelo", reservo-me o direito de me opor a ela pelos meios que entender serem os justos e adequados, aceitando naturalmente assumir as respectivas consequências, seja a que nível for.

Agora, aquilo que honestamente não posso deixar de reconhecer é que, insisto, não é, de facto, possível ter uma História "para os dias de semana e outra para os feriados" que é como quem diz: ter uma moeda "única" comum a todos os países da "Europa" para, logo a seguir, agir como se isso não fosse, afinal, verdade e a tal moeda de "única" tivesse tão somente a [tão pomposa quanto desgraçadamente ilusória...] designação oficial.

Uma moeda "única" com "descentralidade" e até eventualmente "policentralidade económica" total, ou seja, com múltiplas i/lógicas de política económica meramente sobrepostas e não-organicamente de facto inter-referenciáveis faz tanto sentido quanto pretender alcançar, segundo o proverbial anexim popular, uma situação em que haja "sol na eira e chuva no nabal", de acordo com uma formulação bem conhecida.

Isto é: não é o tal 'visto prévio', com esse ou outro nome, que está errado: é todo o modelo, toda a i/lógica que lhe subjaz e que o torna objectiva e materialmente imperativo, inevitável.

E nem sequer são nem o "rigor" nem um cada vez mais perceptível "distanciamento" alemão e eventualmente francês relativamente aos esforços de "solidariedade intra-europeia" que estão em causa: é o bom velho pleno senso comum que assim o determina---e exige.


Dito de outro modo: porque a História "não são... iogurtes que se vendem à unidade", quem quiser 'ficar com ela' tem de estar preparado para comprar aos "grossistas" do eixo Bruxelas- Estrasburgo e levar [com] o "produto" todo por atacado, goste ou não de cada uma das embalagens e produtos avulsos que o compõem...

[Imagem ilustrativa extraída com a devida vénia de sideshowworld-dot-com]

sábado, 18 de setembro de 2010

I Love You More And More Every Day - Shane McGowan

"Um País de Silvas..."


Com um aparato de página inteira, Mário Soares continua, no "bom e velho" "Diário de Notícias", a cobrar, junto do sistema económico-político [que, nessa centenária---e aparentemente fatal---instituição, ao longo dos tempos sempre prestável porta-voz de todos os poderes estabelecidos sejam eles quais forem, regularmente se faz ouvir]; com o aparato em causa, continua, pois, dizia, o antigo P.R. e ex-primeiro ministro de vários governos [se bem me lembro, todos incompletos] a cobrar a dívida que o sistema em causa, há muito, demonstravelmente contraíu para com o autor do "Portugal Amordaçado".

Prossegue, desse modo, a ficção de uma relevância e de uma existência [cada vez mais de uma mera sobrevivência!] pessoal e política que deixou há muito de ser, no mínimo, límpida e incontestável.

Sobre Soares e o pretenso estatuto "papal" e [mais grave ainda!] icónico relativamente a uma revolução, em larguíssima medida, gorada com a qual, porém, a figura em causa, em meu entender, muito pouco [ou nada!] teve a ver e para a qual, ainda menos, feitas as contas, contribuiu; sobre Soares e sobre o papel que alguns pretendem atribuir-lhe no contexto d0 25 de Abril, dizia, já falei, e ainda há bem pouco tempo, aqui neste mesmo "Quisto".

Não valerá, por isso, a pena voltar ao tema.

Quero, desta feita, apenas, deixar aqui, isso sim, ainda uma vez, registada a prodigiosa vulgaridade da abordagem do tema [num texto caracteristicamente baço, desengonçado e, sobretudo, por tudo isso, completamente inútil a que chamou---de forma despropositada e injusticissimamente sarcástica, aliás---"As catástrofes naturais", numa tentativa de "chegar" até àquele que é, esse sim, queiramo-lo ou não, um ícone do nosso tempo, Fidel Castro].

Destaca-se no texto, antes de mais, além do que, como veremos, só pode ser desatenção ou simples ignorância, a total ausência de um pensamento ou de uma perspectiva intelectual [e, ainda menos, teórica] própria---nesse que, vá-se já adiantando, será provavelmente o grande "segredo" daquilo que foi, a dado passo, a enorme [e fácil] popularidade [a condição pop...] de Soares.

Num país de "éfes" [Fátima, Futebol e Fado] que o é também de "ésses" [Salazar, Sócrates e o próprio Soares: um autêntico "país de Silvas", hoje-por-hoje, mais até do que "das Uvas"...] uma figura como Soares está, "por definição" condenada a tornar-se num verdadeiro emblema.

Nada nele, de facto, se parece com substância, com profundidade ou consistência---com essa suprema "chatice" tão visceralmente pouco 'meridional' que é pensar.

Ler, por exemplo, uns famosos "Escritos Políticos" de Soares consegue ser ainda mais enfadonho e soporífero do que ouvir uma prelecção de Carlos Queiroz à selecção para já não falar na experiência única de aborrecimento que deve ser ler uma 'biografia oficial e autorizada' do próprio Soares.

Com tanta gente possuindo uma noção precisa do que está a dizer e, por conseguinte, realmente competente para abordar temas e figuras de genuína relevância histórica e política como Fidel ou a Revolução cubana assim como para, por outro lado, falar de alterações climáticas e das trágicas consequências a todos os níveis para o curto prazo da nossa futuridade global comum não se percebe, de facto, por que exactos motivos e [falta de] razões, se lembrou o "D.N." de, de repente, ir buscar Soares à dourada reforma das várias coisas que não vale a pena referir aqui e que constituem o que chama a sua "carreira de estadista", para debitar meia dúzia de banalidades que estamos todos, aliás, fartos de ouvir, ditas, de resto, de um modo bem mais estimulante e, por isso, bem mais inspirador e mobilizador por quem sabe verdadeiramente aquilo de que está a falar e por que o faz.

Claro que cada um é obviamente livre de pegar em meia dúzia de lugares comuns, ideias e frases, colar tudo e pespegar tudo num jornal que se disponha a aceitar o resultado da "tarefa".

Alguém devia, porém, ter o cuidado e, sobretudo, o escrúpulo intelectual de relativizar complementarmente, em nome do rigor científico e da premente necessidade de esclarecimento das sociedades, designadamente da portuguesa relativamente ao tema ingente da ecologia, explicando-lhe que tremores de terra e marés negras não são, de modo algum, realidades da mesma natureza e envolvendo exactamente o mesmo tipo de responsabilidade ambiental e cívica o mesmo sucedendo, aliás, com a actividade vulcânica e os incêndios florestais, para dar apenas outro exemplo.

Ou seja, em síntese: cada um produz as "análises" que entender e, sobretudo, aquelas que estão ao alcance dos seus conhecimentos e da sua inteligência.

Cada jornal, cada classe política e até cada sociedade entroniza quem quer [e quem ela merece e a merece] e faz os ídolos que entender e que a dimensão da sua responsabilidade histórica e política justifica.

Mas, por amor de Deus, quando qualquer dessas entidades quiser "brincar às ideias" e "aos proselitismos" que vá fazê-lo para onde a sua falta de substância técnica e científica não lance a confusão, não aumente ainda mais os equívocos e não crie ainda mais ameaças ao já bem ameaçado futuro de todos nós!

Não havendo dimensão nem competência, que haja [ao menos algum!] pudor, não?!...


[Imagem "gentilmente cedida" por drzeus-dot-best-dot-vwh-dot-net]

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Rio Bravo

É a segunda vez que surge aqui no "Quisto" esta que é, definitivamente, uma das mais prodigiosas sequências cinematográficas que conheço.

Só um narrador fabuloso, completo, conseguiria meter dentro de uma sequência de cinema com a duração de não mais de quatro/cinco minutos tantos sentidos revelando um controlo do "tempo" narrativo do Cinema tão absoluto e tão perfeito.

A sequência possui um parentesco irrecusável [fascinante!] com a Música não apenas na aptidão revelada para gerir [sem parecer, aliás, em momento algum, fazê-lo!] a relação subtil que existe no próprio real entre o concreto e o abstracto, o visível e o não-visível, o relativo e o absoluto [ou algo que, de forma irresistível se lhe assemelha] como no controlo [eu diria] quase "assustador", quase... diabólico por pate do Artista das "ferramentas" da narrativa assim como das modulações que com elas se podem arrancar à realidade num sentido [e de um modo] nos leva, por vezes, mais do que a admirar a genialidade do cineasta a, como digo, quase literalmente temer o poder taumatúrgico [o controlo perfeito não apenas da realidade enquanto tal ou enquando imagem de si como, sobretudo, das nossas mais íntimas emoções e da nossa capacidade para produzi-las] de que ele parece investido...

Limerick You're a Lady - Denis Allen & Denis Carey

"Um Tributo à Irlanda"


Um dos meus países-fetiche.
Melhor e mais precisamente: uma das minhas culturas-fetiche...

Pessoalmente, tenho a «tese» de que todos precisamos de ter um país assim: um país para nunca visitarmos de modo a podermos sobre ele construir todas as excitantes ficções que a imaginação aliada ao desejo é capaz de produzir e, desse modo, mantermos intacta a ilusão de que a perfeição existe, que está por aí algures, à mão de semear e que ainda um dia [que sabemos nunca há-de chegar precisamente porque antecipadamente já assim há muito decidimos que haveria de acontecer] havemos de conhecer "in the flesh"...
O meu é a Irlanda.

De cada vez que releio um ou dois dos «delírios textuais» de Joyce [sobretudo do Joyce de "Finnegan's Wake", o mais textualmente subversivo e libertador dos Joyces que conheço...] ou, noutro plano distinto, oiço coisas como esta sublime "Limerick" que vem imediatamente antes, visito extasiado, de uma vez só, a minha ideia pessoal de perfeição---de toda a perfeição que preciso e que, de qualquer modo, seria [sou!] física [e até mentalmente!] capaz de suportar...


[Imagem ilustrativa "gentilmente cedida" por thewildrover-dot-blogs-dot-ie]

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"Quiz"


Esta mulher tem a expressão horrorizada de quem acaba de saber

a] que as sondagens colocam o inefável Passos Coelho à frente do embaraçoso Sócrates e provável próximo primeiro-ministro;

b] que as sondagens colocam o embaraçoso Sócrates à frente do inefável Coelho e provável próximo primeiro-ministro;

c] que, afinal, aqueles trejeitos da ministra da educação não são o resultado de um ataque epilético emanado da Providência nem de uma intoxicação alimentar fatal com cogumelos, gorando-se, desse modo, mais uma oportunidade única para a resolução a curto prazo de uma grande quantidade de problemas na área da Educação em Portugal?


[Imagem extraída com vénia de afeatheradrift-dot-wordpress-dot-com]

"Democracia e Demomorfia"


É essencial que entendamos que propugnar para que sejam agilizados [ou mesmo completamente 'liberalizados'] os mecanismos de acesso à acumulação privada de capital, mantendo, todavia, no essencial inalterada a infra-estrutura económico-financeira [e até instrumentalmente politica] do sistema [falo fundamentalmente do modelo de propriedade e do paradigma das relações de produção mantido intacto da ditadura para cá politicamente revestido de um sistema parlamentar electivo formalmente incondicionado] não faz de um projecto político um projecto necessariamente democrático: faz dele [fê-lo, em todo o caso, na passagem do marcelismo para o "novembrismo" de '75 vigente até aos nossos dias] um instrumento de implantação do modelo demomórfico de organização económico-política---aquilo a que poderia [a que, facto, deveria!] chamar-se "democracia funcional" que é o regime que vigora nas sociedades ocidentais de hoje caracterizado basicamente pela atribuição à "política" do papel meramente ancilar e instrumental de legitimação social e política do status quo económico-financeiro, tido, por seu turno, por constante referencial absoluta de um modelo de exploração da realidade de que a "política" representa, pelo seu lado, na prática, a variável e um mero 'revestimento politiforme' móvel, forçosamente insubstantivo [i. e. desprovido de conteúdo intrínseco, próprio] do núcleo economocrata activo do 'regime'.

[Imagem ilustrativa extraída com a devida vénia de zazzle-dot-com-dot-pt]