sexta-feira, 24 de setembro de 2010

"Educação, Política Educativa e Conversas em Família" [por rever]


Da imprensa diária deste início de ano lectivo, retiro a notícia "epustuflante" de que, impressionado talvez com as constantes exigências que, nesse domínio, lhe iam sendo feitas [na televisão, por exemplo] o governo fixou metas para determinadas valências no âmbito educativo.

Assim, segundo, por exemplo, o "Diário de Notícias" de 27.09.10 são metas do governo para o corrente ano escolar "baixar os chumbos no secundário de 20,1% para 12%", "reduzir a percentagem de alunos que desistem da escola aos 16 anos de 13,08% para 4% além de "aumentar em 4 pontos percentuais as positivas a Matemática e a Português nas provass externas, do 4º ao 12º anos".

Ora, é preciso desde logo começar por dizer que uma pessoa---um português razoavelmente normal destes [mais "sucáticos" do que propriamente "socráticos"...] tempos que deviam, como aqueles de que falava Garcia Márquez num título famoso, ser da mais viva e franca cólera [cólera contra os extremos de degradação intelectual, cívica, cultural, social, económica e política---e de adequada correspondência em termos de vileza moral, é preciso dizer, também...---a que esta gente novembrista e invariavelmente duvidosa que nos tem governado de '75 para cá deixou chegar o 'regime'; um português nestas condições de sanidade mental e cívica de que falo e que tem obrigação de conhecer de ginjeira toda essa realidade, dizia, fica logo de pé atrás quando ouve falar em "metas" para uma Educação que aparentemente nada mais tem para apresentar em termos de pessoal e de argumentário técnico-científico assim como de substância e de credibilidade política [em substituição da verdadeira "distaster area" que foi o consulado anterior de uma tal Maria de Lurdes Rodrigues de mais que tenebrosa memória] do que folhetinistas pop, autoras de romancecos manhosos para meninos e meninas na idade do armário, entretendo-se com "conversas em família", que é como quem diz, "cantando os patinhos" para os meninos irem para a cama enquanto, persistentemente desatendidos e considerados inessencialmente como "questões de tesouraria", os grandes problemas no sector se vão amontoando atrás uns dos outros, completamente por resolver e, pior ainda, sem aparentes perspectivas de o serem.

Quero eu dizer: alguém acredita que um governo que se permite avançar com "descobertas" como aquela que pretende que os valores de insucesso escolar são, de forma necessária e, pelos vistos, automática, inversamente proporcionais ao número de alunos de uma escola, partindo de um referencial "teórico" que começa por ser 10, num ano, para no ano seguinte, "se mudar" paulatinamente para o dobro, i.e. para 20 alunos; alguém acredita que este governo e a tutela específica, supostamente técnico-científica, que por ele se expressa, tem credibilidade para fixar metas no que quer que seja relacionado com Educação?

Alguém acredita, estando no seu juizo perfeito, num ministério de educação que se permite afirmar que "está provado" que as repetências não têm acção relevante sobre a correcção dos valores do insucesso, uma afirmação que é obviamente a negação total, já nem digo de qualquer conhecimento pedagógico e didáctico, mas do mais simples e elementar bom senso?

Um poder [e uma tutela pedagógica e didáctica] que não percebem que as repetências só por si não corrigem nem deixam de corrigir quaisquer valores de insucesso tudo dependendo do modo como são concretamente organizadas e institucionalizadas, a saber, do número e da qualidade dos professores que lhe são atribuídos, das respectivas condições de trabalho, da estabilidade que é ou não garantida nas carreiras [gestão da motivação dos docentes] nos estabelecimentos escolares; de todo um conjunto de pessoal peripedagógico [dos chamados auxiliares de acção educativa aos pedopsicológogos] atruibuido efectivamente de acordo com critérios de funcionalidade e operatividade e não segundo ditames de mera tesouraria e uma [im] pura "i/lógica de amanuense e de guarda-livros" que tem sido a grande base das "políticas" "educativas" entre nós, de há várias décadas para cá, agravando-se de forma aguda e crítica com estes mais recentes anos de poder "socialista".

Isto no plano estrita [mas não estreitamente!] escolar, interno, sublinho: porque em termos amplos [a escola e a educação---não a Cultura!---não contendo em si mesmas o seu objectivo] têm sempre de ser, em todos os aspectos que compõem a realidade que cada uma delas é, incluindo os dispositivos motivacionais realmente relevantes, orientadas para o exterior de si mesmas.

Ou seja: se em torno da escola [e no que económica e socialmente se segue à escola] não houver capacidade estável, orgânica mesmo, sistémica, para absorver substantivamente a "produção" escolar, todo o edifício objectivo e subjectivo da Educação situado a montante perde [aí sim: automaticamente!] sentido e torna objectivamente impossível, por um lado, motivar as dinâmicas e dinamias primárias do sucesso e, por outro, no caso do insucesso, induzir secundariamente as necessárias dinâmicas correctivas e remediais.

Se eu souber, com efeito, que estou na realidade, sempre, de um modo ou de outro, a "estudar para desempregado" [ou para... "mal empregado", tendo em conta a degração aparentemente irregressível dos paradigmas e dos padrões de 'empregabilidade sistémica' actual] é isso, de facto, e não as repetências per se , como qualquer pesoa minimamente inteligente e normal sem dificuldade percebe, o que desincentiva sistémica e nuclearmente a eficácia dos programas e projectos remediais ainda antes de estes serem pensados e começados a pôr em prática.

Se, cumulativamente, estes forem... "pensados" "em cima do joelho" [muitas vezes por "pedagogos oficiais" que parecem ter adquirido a respectiva "habilitação" ou "capacitação" num qualquer curso postal de "Pedagogia para Tótós"], recorrendo a um corpo docente cronicamente desestabilizado, maltratado das mais diversas maneiras pela tutela, exercendo em escolas mal vigiadas, desprovidas de psicólogos e/ou sociólogos escolares assim como de dispositivos inteligentes de ocupação dos tempos e dos espaços não-lectivos; se, cumulativamente, dizia, for esta a realidade das nossas escolas sobretudo peri- e/ou sub-urbanas mas, infelizmente, não só dessas, o resultado final é a calamidade que se conhece [e reconhece!] hoje e que constitui, por tudo quanto disse, o terreno ideal para a acção dos charlatães e dos oportunistas de todo o tipo que acabaram por tornar a Escola em Portugal um verdadeiro exemplo acabado de "loucura organizada" e [mais grave ainda!] "institucionalizada"...

Não há planos de correcção do insucesso com metas como 4%... ao ano, como os juros bancários ou as taxas de interesse de qualquer outra instituição onde pratique a agiotagem...

Se já seria de encarar e considerar com reservas num universo educacional onde os técnicos fossem consistentemenmte recrutados entre os cientistas e investigadores efectivamente credíveis e não entre pessoal político e carreiristas "em trânsito", que dizer de um mundo onde são estes quem impõe os modelos educativos e confere forma concreta aos modelos por meio dos quais eles se expressam e se convertem em... "política"?

De resto, eu não creio que verdadeiros cientistas da Educação, considerando, desde logo, a realidade do nosso universo escolar público actual, tivessem a ousadia de avançar com qualquer coisa que se parecesse seque com uma "meta": com objectivos "horizontais", acredito---e acho não só desejável como essencial.

Apresentar metas como estas de 4% [não são 5%, um número exacto---como os 20 que estabelecem, vá-se lá saber... 'por alma de quem'!...---para os pensadores ministeriais a fronteira "absoluta" entre o sucesso e o insucesso enquanto "categorias" a priori, categorias kantianas, "filosóficas", "metafísicas", talvez, do "pensar pegagógico": são 4 e nem mais 1...]; apresentar valores como este, conhecendo nós "do que é que a casa gasta", cheira a manipulação---à criação de um "horizonte de pressão manipulativa"---à légua.
Soa a aviso e a "proposta que ninguém pode recusar".

Falta, claro, o "pormenorzinho" da substanciação técnica dos valores avançados: quem fixou [e o que foi que permitiu fixar?] os 4%?

Com base em que prospectiva, em que estudos técnicos, em que universo profissional e institucional?

É obviamente uma ideia [uma intenção, para já] virtuosa: agora, como quase tudo o que sucede em matéria educacional e educativa entre nós mais do que um ptrojecto, é um "supônhamos" onde a convicção parece mais uma vez substituir-se à opinião e onde a fé passa com a maior das naturalidades por prospectiva...


[Na imagem:]

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