domingo, 3 de abril de 2011

"Portugal Diatópico": algumas breves notas sobre a "Tanatopia ou pensar tanatópico nacional"


Do trabalho que tenciono elaborar tendo em vista um possível mestrado suberidinada ao tema da "Tanatopia Nacional", hipoteticamente designado por "Portugal Diatópico", consta um capítulo dedicado à ditadura de Salazar, na qual vejo claramente uma modalidade de fascismo. Não simplesmente de ditaduira política mas especificamente de fascismo. Convém, com efeito, como faz Fernando Piteira dos Santos [*] distinguir entre ambas as circunstâncias ou vategorias do viver comum. A ditadura é claramente um conceito político. Falar de ditadura situa-nos inequivocamente na Política. Mas falar de fascismo naquele sentido históricamente circunscrito que remete para os anos 20 e 30 do século passado é, na realidade, falar de economia.


Ou seja, para se estudar o fenómeno dos fascismos é necesário como faz Álvaro Cunhal quando questiona [e desautoriza!] o método de abordagem histórica dos historiadores burgueses, como Gama Barros e o próprio Al. Herculano, que acusa de possuirem uma visão socialmente redutora da História e das suas dinamias estruturais de natureza económica, social e política [**] a propósito da ascensão da burguesia comercial portuguesa na Idade Média; para estudar o fascismo, dizia, é absolutamente imprescindível em meu entender também, possuir um ângulo de abordagem dialéctico [i.e. não-fenoménico ou casuisticamente "fenomenalizador" da realidade, algo que não escapa, por exemplo, a Palmiro Togliatti ou ao grande Gramsci [***] os quais não se deixaram iludir pela aparência política do fenómeno fascista, fazendo-o, antes remontar do ponto de vista da respectiva génese e essência, a um estádio de desenvolvimento preciso e perfeitamente identificável do capitalismo industrial moderno. Estamos, neste ponto concretamente, perante a "distopia" envolvendo o conceito de [para remeter a uma paráfrase de Luddendorf [****] "capitalismo total" ou "totaler Kapitalismus" uma distopia alimentada pelo grande capital infustrial, ou seja, a projecção [ou a 'contaminação'] da Política por um determinado modo de entender e realizar historicamente a economia--especificamente o paradigma económico piramidal e violentamente expansionista nascido na [e da!] usina industrial saída da revolução industrial inglesa.

Começa aí, aliás, o que chamo o paradigma economocrático contemporâneo, assente na ideia de que existe um paradigma de relações de produção que se fixou firmemente à História [tão firmemente que passou, a dado momento teórico, pelo menos, a identificar-se com ela] paradfigma esse que todas as formas situadas na super-estrutura cultu[r]al do modelo [da Artee à própria Política] são chamadas a forçosa e forçadamente "demonstrar". Trata-se, pois, de usar a Política como um "argumento da Economia" e é por isso, impossível debater o fascismo sem lhe penetrar na estrutura até chegar ao respectivo núcleo que é, volto a insistir, económico e não político. Consiste, de resto nisto mesmo a economocracia: na utilização abusiva e disfuncional [completamente alienada] da Política, convertida, pois, num mero revestimento politiforme in-fixo e in-substantivo das formas de poder económico [económico -financeiro].
Os fascismos surgem a meu historicamente como a tentativa de encontrar na Política os instrumentos capazes de manterem a História económica e social dos povos compltamente imóvel, conferindo a posteriori a essa "ideal" imobolidade, o carácter vinculativo de lei.
O fascismo representa, pois, para as classes desprovidas de poder económico, social e político uma doença--uma infecção---da economia, não exactamente da Política que se deixou, neste contexto, aprisionar e até apropriar pela primeira. É o que perceberam os já referidos Gramsci e Togliatti [*****] e que, pelo contrário, desperceberam muitos dos que intervieram ainda não há muito numa polémica sobre a questão de saber se o salazariasmo e a ditadura foram ou não um fascismo genuíno, polémica em larga mediuda lançada por uma observação de J. Hermano Saraiva que defendia a suingularíssima tese de que Salazar foi um "antifascista" porque asim se terá, a dado passo declarado.


Escreve Togliatti [citado por F. Piteira Santos ******] que "o fascismo é o sistema de reacção integral mais conseqwuente que jamais erxistiu até hoje nos países em que o capitalismo alcançou um certo grau de desenvolvimento. Esta afirmação (...) é motivada pela supressão sistemática total de qualquer forma de organização autónoma das massas".


Em sociedades industrializadas como a alemã e a italiana dos anos 20 do século passado, onde a organização de massas alcançou formas particularmente eficazes e operantes, o fascismo atinge o objectivo em causa de esterilizar a organização autónoma dessas mesmas massas, através do recurso ao direccionamento tutelado da actividade das massas, especialmente [et pour cause...] proletárias.



É este facto que leva, a meu ver, que alguns não reconheçam primeiro ao sidonismo e, em seguida ao salazarismo, essa natureza tópica ou ortoxamente fascista.



Tudo [ou quase tudo] na relação entre o salazarismo e as massas vai, ao contrário do que ocorre com o regime imposto à Itália pelo truculento Mussolini ou pelo fácil demagogo Hitler, no sentido da discrição e do cinzentismo oratório e sócio-político mas isso, corresponde, a meu ver, a um traço essencial da sociedade portuguesa, adaptando-se o projecto do grande capital, sobretudo agrário, nacional a um paradigma de sociedade onde inexistiu sempre até ao século XIX um movimento operário unitário e actuante, devido Ao modo como se organizou economicamente a sociedade portuguesa: fora das grandes unidades industriais, topicamente substituidas por uma rede dispersa onde predominavam os núcleos atesanais dificilmente indutores de formas de intervenção social e de organização política unida e consistente.


O 28 de Maio, efectivamente, porta de entrada histórica [e especificamente política para o salazarismo] vem, como é sabido, pôr forçadamente termo a um período de agitação política resultante dos conflitos entre várias facções republicanas, i.e. ele vem ocorrer numa sociedade cansada de guerras sociais que muita da população não entende de tal modo, são os extractos mais escalrecidos da burguesia republicana quem os desencadeia, não na forma de revolução popular genuína mas muito mais na de golpe ou intentona militares.


É precisamente isso que explica, a meu ver, que o salazarismo chegue ao poder dispensando-se de fazer o que fizerem Mussolini em Itália e especialmente Hitler, na Alemanha: desviar ou ter de "recuperar" para si, ganhando-o à esquerda revolucionária, um movimento operário pré-existente e asctivo.


Ou seja: aquilo a que os líderes nazi-fascistas aspiram, a saber: o ordem social e política nos exactos termos em que a concebe e deseja o grande capital financeiro, vai o salazarismo encontrar de mão beijadsa na medida em que a portuguesa da época é uma sociedade sedente de acalmia social e predisposta a submeter-se a um líder que a assegure ou, no mínimo, a prometa.


Daí, diria eu, não se pôr ao 'regime' a necessidade de "vir para «a rua»", inexistindo no salazarismo esse tipo de movimentação "callejera" que sem dificuldade reconhecemos na Alemanha hitleriana e pré-hiteriana assim como na Itália de Mussolini.


Se nos colocarmos no tal ponto de vista fenoménico ou fenomenalizador que não é o de Gramsci e Togliatti [ou Dimitrov, que também analisou o fascismo sobre ele produzindo reflexões hoje clássicas] tendemos a deixar, como sucedeu com alguns intervenientes na polémica que atrás refiro, envolvendo a [in] admissível natureza fascista do salazarismo, que aspectos realmente circunstanciais como este da [quase] inexistência de movimentos de massas à [erxtrema] direita, como o que na Alemanha foi liderado pelos S.A. de Röhm, nos iludam.


Mais do que a forma circunstancial, está em causa para uma definição ou identificação consistente do fascismo, aquilo que nele é projecto económico-político determinante e profundo, aquilo que nele é programa teórico de articulação entre a Economia e a Política---entre os "deveres# históricos de cada uma delas, um quadro no qual vigora primariamente um conceito perfeitamente reconhecível que poderá ser identificado pelo lema "politica ancillae economiae". A política é uma projecção institucionalizável [mais tarde: institucionalizada no paradigma corporativo] da economia, do modelo de relação vertical-funcional vigente na fábrica cabendo à política a missão primária de conferir feição operativa obrigatória ao referido modelo.


E isso, o salazarismo consegue fazendo-se alfaia funcionante dos grandes interesses agrários que numa sociedade eminentemente rural como a portuguesa representam as forças do capital plutocrático.


A portuguesa é, pois, uma sociedade estruturalmente disponível para a ordem, que não é, ao demagogo necessário pacificar porquanto ela está mentalmente predisposta, ou seja, a aceitar sacrificar uma autonomia de intervenção siocial e política que lhe é, por razões históricas precisas, estranha, à passividade e à percepção da História como uma mera étapa [quasi-sacrificial, em muitos casos] no caminho de uma perfeição que, muito mais do que política é de natureza metafísica e, portanto, essencioalmente contemplativa.


Até um "socialista" como Antero não parece hesitar em discorrer, aliás com característica eloquência poética, num soneto ["Nirvana"] dedicado ao republicaníssimo Guerra Junqueiro sobre "um vácuo tenebroso aberto para além do Universo luminoso" o qual, uma vez atingido pelo "pensamento absorto" faz com que este veja "com tédio [...] tudo quanto fita".


Até um "socialista" pode, pois, colocar-se nessa posição, em meu entender, cultu[r]almente estabilizada e tópica, de situar o horizonte natural do pensamento humano para além da realidade concreta, num ponto nebuloso só atingível pela supressão ou suspensão da vontade , situado para além da própria existência física dos indivíduos.


Mas Antero é apenas um dos escritores e poetas que conferem dignidade intelectual a um modo de abordar a realidade que visa sempre a respectiva superação ou "empochement" não-dialécticos. De facto, toda uma plêiade de ultra-românticos faz gala em existir fora e já para aklém da realidade, numa espécie de «circuito cosmovisional» não apenas não interrompido e não detido pela Morte como até, ao invés purificado por ela que é usada para testar a consistência desse amor perfeitro porque naturalmente desmaterializado.

Possuem esta natureza, por exemplo, os amores, os "noivados do sepulcro" descritos por Soares de Passos em algumas das suas melhores e mais populares poesias, onde a Morte [Thanathos] aparece sinvariavelmente como a entrada iniciática num além-mundo completamente espiritualizado cujos limites [ou ausência deles] ela, como disse, experimenta e testa, sendo daquela a pedra de toque literalmente essencial.




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