quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

De Novo o Cinema "Histórico"


Dizia-me alguém a propósito do que noutro lugar escrevi sobre o cinema dito "histórico" qualquer coisa como isto: "Então você, falando de cinema histórico, refere-se ao Hawks, ao De Mille e ao Rossellini e acha que 'pouco mais se fez' do que aquilo que eles próprios fizeram nessa matéria??!! Oh, meu caro: então e o von Sternberg? E o Lang? E o Eisenstein? Por amor de Deus, e o Eisenstein??!! Você esqueceu-se do Eisenstein??"

Não! Não me esqueci do Eisenstein nem do Kubrick, nem seja de quem for.

O que eu acho é, todavia, que o que se passa aqui, neste domínio, tem muitas semelhanças com o que acontece, por exemplo, no cinema muitas vezes confusa e indiscriminadamente chamado "policial".

Ou seja, que é preciso compreender que existem, na realidade, dois tipos ou dois "géneros" de cinema dito «histórico»: um, composto por aqueles filmes que fazem da matéria "histórica" um campo de reflexão profunda e, ao mesmo tempo, ampla, alargada cujo âmbito excede largamente a época (embora não a "epocalidade", digamos assim...) directamente abordada no filme ou romance.

No "objecto narrativo" em causa.

Aquilo que interessa ao narrador, nesses casos, é claramente a análise ou a consideração dialécticas da realidade para o que circunstancialmente se debruça sobre a "passagem" dessa mesma realidade por um determinado quadrante, digamos assim, do tempo histórico---grafando nós "histórico" agora, por razões que certamente se compreendem, sem quaisquer aspas ou restrições.

Não por acaso, referi o facto (documentado) de Hawks ter começado por planear fazer o tal filme ("Land of the Pharaos") sobre a construção de um aeródromo na China tendo acabado por fazê-lo sobre a edificação de uma pirâmide no Egipto alguns milhares de anos antes.

Isto, como disse, por um lado.

Por outro, ao lado deste, há, também, um tipo de cinema (como chamar-lhe?) tendencial ou mesmo realmente "ilustrativo" para o qual a "História" (no sentido estr(e)ito da "anedota" ou da "crónica") constitui o fim último (ou, se calhar, até único) de si mesmo, considerando-se, em geral, implicitamente, por outro lado, que, sobre a História, pouco mais haverá (de facto e, se calhar, também "de direito"...) a fazer do que "re/contá-la" e "re/confirmá-la" continuamente através da ficção.

No cinema de De Mille ("The Ten Comandments") ou de Mervin Leroy ("Quo Vadis") ou no William Wyler de "Ben Hur" (ao contrário do de Kubrick em "Spartacus", por exemplo) a História é, então, ao menos tacitamente, concebida como algo, um «objecto factual» sólido e, muitas vezes, literalmente inamovível, ou seja, estruturalmente desprovido de qualquer hipótese sequer de espaço para a mudança, que é como quem diz para a intervenção (nem sequer crítica ou... "criticional") dos indivíduos relativamente a ela, situando-a, pois, realmente fora do alcance da vontade ou do desejo humanos.

É verdade que com "Barry Lyndon", Kubrick fez, também ele, um tipo de cinema a que poderíamos sem grande dificuldade chamar "ilustrativo".

Mas aí, Kubrick (que era, de facto, à semelhança de um Laurence Olivier quando se meteu a levar Shakespeare ao cinema, um narrador notável) escudou-se na sua espantosa capacidade pessoal para "efabular plasticamente", isto é, para 'pôr a própria Beleza directamente a reflectir' (senão sobre outra coisa, sobre si mesma, com certeza) mas não só: "Barry Lyndon" (como "Lolita" ou "A Clockwork Orange") tem inscrito em si a marca do "cru dedo profanador" do cineasta, isto é, da sua vocação narrativa particular para discorrer, com uma ferocidade por vezes verdadeiramente implacável, meticulosa e distintiva, sobre a crueldade e a abjecção, ou seja, sobre a espantosa vocação humana para a ferocidade, por um lado assim como, por outro, para a sordidez e a mais humilhante indignidade---senão mesmo para a total dissolução.

Que é, segundo ele (basta comparar "Lolita" com "Barry Lyndon") não de uma das de todas as Histórias.

Ora, é esta vocação específica para a universalidade, esta apetência crítica pela totalidade, que distingue(m) o Cinema histórico de um Eisenstein (ou de um Rossellini ou de um Kubrick e por aí adiante) do cinema pseudo-histórico de um De Mille ou de um Mervin Leroy quando se mete(m) a falar de coisas (em mais de um sentido, aliás...) para eles, intocáveis ou "sagradas".


Deus Nosso Senhor o veja ir!...


Acordo com metade de uma boa notícia: está demitido o (chamemos-lhe assim...) ministro da (chamemos-lhe assim...) saúde.

Ora, nós cá em casa temos uma espécie de "idiolecto familiar" interno de onde consta um amplo "glossário" de expressões que dão corpo à cumplicidade instintiva que, há anos, nos vem ajudando a unir solidamente a todos, à Mia, a mim próprio, à "velha" Tanas, em tempos a um periquito falante (que se chamava Luciano e que vivia numa casa de banho alugada cá em casa...) e agora, também, a uma autêntica 'preciosidade canina' que fez o favor de se juntar oficiosamente a nós e que dá pelo seriíssimo e nobilíssimo nome de "Nokas"...

(Já agora, acrescento: há também quem lhe chame em privado "Gaitinhas" e ainda "Xuga" ou "Xuguinha", abreviatura carinhosa de "Texuguinha", 'nom-de-guerre' que se explica por razões que a 'desafogada' barriguinha da nossa nova Amiga explica, aliás, à saciedade mas cuja etimologia exacta pode também derivar do inglês "sugar"---tenho de apurar isso muito bem, um dia, quando tiver de elaborar a "carta nobiliárquica" da jovem em causa...)

Bom, mas isto para dizer que, "cá em casa", para os casos em que alguém, particularmente odioso e detestável, se decide finalmente obsequiar-nos com a sua ausência, a Mia trouxe (de casa dos pais, suponho) a luminosa frase: "Ora! Deus Nosso Senhor o veja ou (a veja) ir, com as pèrninhas a bulir" (ela diz mesmo assim, "pèrninhas", é mais giro, mais incisivo, mais... miosco!)

Pois, nem de propósito! Ao ouvirmos dizer que as tropelias em matéria de insensibilidade e mesmo 'selvajaria institucional', a que a criatura a que atrás me refiro vinha, aliás com um descaradamento e uma insolência verdadeiramente inomináveis, dando o rosto, olhámos um para o outro e de imediato disparámos ao mesmo tempo: "Olha! Só pecou por tardio! E por se tratar de um acto mais ou menos isolado e solitário!"

(Sim, que "a outra", essa coitada já há muito era uma tão gloriosa quanto absoluta vacuidade, uma total inexistência pessoal, cultural, estética, política, etc.!...).

Quer isto dizer que vamos finalmente (voltar a?) ter uma Saúde de gente civilizada ou, simplesmente, de gente com humanidade e sentimentos?

Bom, isso, como dizem os brasileiros, "já são mais quinhentos"...

Já deu para perceber (quero eu dizer: pelos vistos, já deu para que eu e poucos mais nos apercebêssemos) de que, histórica e politicamente, entre nós, nestes mais recentes, árduos, dificilmente imagináveis tempos de (im!) puro delírio neo-liberal "social", o velho Estado Providência (apesar de tudo, uma descoberta e uma conquista "generosamente burguesas", saídas da Modernidade revolucionária francesa de '89---por sua vez, um modelo de Estado a que eu, pessoalmente, prefiro chamar o "Estado-consciência", por razões que nem valerá a pena detalhar de tão evidentes são); pois, já deu para perceber, dizia, que até aquele modelo de Estado (que, em meu entender, o democapitalismo industrial e pós-industrial moderno havia já há muito desvirtuado e convertido numa espécie de "air bag institucional" da sua própria contínua sobrevivência...); até esse tinha já dado lugar a uma "nova" figura conceptual-política passível de ser designada pelo Estado... almocreve.

O "Estado almocreve" são primeiros ministros e presidentes da república (da "res... pública, não é?...) a viajarem para Angola ou para China "carregados de empresários" com os olhinhos ávidos a luzir de "corporativa felicidade" e era (ou é!) agora hospitais públicos a fecharem por falta de "fregueses" e "modernas unidades de saúde privadas" a saltarem do chão como cogumelos no próprio lugar onde não havia "fregueses" para os primeiros e era, por isso, "irracional" e "absurdo" manter abertos serviços de saúde pública...

É assim a vida: mais do que previsivelmente, nada irá mudar com a troca mas a gente ainda consegue, apesar de tudo, achar ali, no espacinho exíguo de um péssimo servidor público que parte e de outra qualquer desconhecida que chega, um momentinho de efémero conforto do mal que a (quase) todos como uma monstruosa, aparentemente ininterrupta, maldição assola!

"Les portugais sont toujours gais", espantava-se um francês que nos visituou em plena noite salazarista.

Pois são! E agora, ao que parece, mais do que nunca é preciso fazer apelo a essa espécie de "gaité" ínsita com que o Criador nos brindou para nos consolar e indemnizar da generosidade do "socialismo" de uns quantos "modernizadores" assanhados, "caught in the act" de... "refrescarem" (para mal dos pecados desta e de todos nós!) a nossa púbere "democracia".


Ou seja: chegámos desgraçadamente a um ponto da nossa existência nacional comum em que é quase apenas destas não-coisas (como um mau político que se vai finalmente embora ou uma não-política que o acompanha) que se faz a nossa pós-moderna felicidade... cidadã!

Pois que Deus Nosso Senhor nos acuda que é o único que pode!

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Uma "mutação" "pós-moderna" da velha propriedade 'burguesa'


É!

Já tínhamos começado a falar disto, noutro sítio---naquele em que se discutem alguns aspectos mais ou menos policiais (ou... "policiescos") associados àquela questão das "novas formas de propriedade" entronizadas pelo neo-liberalismo "terceiro-viísta" ou "social" no poder para multiplicar indefinidamente a mais-valia clássica, convertendo os "produtos" gerados a partir da apropriação que já se fez dos meios de re/produção contínua de conhecimento naquilo a que chamei a sua própria ultra-valia.

Deixem-me, agora, que atribua uma designação específica a estas formas ulteriores, a estas formas... avançadas, de (meta) propriedade 'burguesa', de acordo com as quais se tornou (des?) estruturalmente difícil, em última análise, distinguir justamente a propriedade de um objecto de uma espécie de "direito significado" ao respectivo uso sustido ou qualificado que, em termos práticos, tudo o indicia, já substituíu aquela.

Tendo essa circunstância em conta, diria, então que, para certos domínios (até ver...) ligados sobretudo à chamada "propriedade intelectual" ou nela radicados, cada um de nós passou a ter, na realidade, acesso, por meio da aceitação do pagamento de um determinado valor fixado pelo intermediário na comercialização dos objectos em causa, não à propriedade mas à "proprietação tutelada" ou "significada" dos mesmos.

Assim é que está certo.

Está certo, quer dizer: assim é que deveremos, a meu ver, classificar essa espécie de "transacção... mitigada" porque, no fundo, imperfeita e sempre parcial que substituíu, nos casos atrás referidos, em termos práticos (e, pelos vistos, cada vez mais, também de direito) a noção tradicional de "aquisição" ou "transferência completa da propriedade" do objecto ou objectos em causa.

Como disse, assim é que está correcto porque assim é que é exacto (ou mais exacto) dizer; agora, se isso configura ou não uma limitação profundamente ilegítima porque injusta (e, por isso, completamente injustificável!) ao direito à propriedade, essa já é outra história...

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Agora é que eu vou mesmo falar de Democracia!...


Já sei que vão ficar chateados! Eu sei, pá! Sei porque também sei que as pessoas ficam invariavelmente chateadas quando se lhes toca nem que seja só ao de leve nos "preconceitozinhos" e essas coisas... Porque isto, bem vistas as coisas, essa tal Democracia, entre nós, pá (eu vou falar assim, à vontade porque, afinal de contas, a gente já se conhece, já somos todos tu-cá-tu-lá, não é?) tem muito de puro (ou impuro? Não sei...) preconceito (senão mesmo, pior ainda, de mera superstição).

Dizem-me, por exemplo, que é preciso respeitar a propriedade, que a Democracia "é" respeitar a propriedade.

Pois, mas não é!

Desculpem, mas não é.

É, isso sim, respeitar um único quadro ou modelo de propriedade que compete, precisa (ou---lá está: imprecisamente...) à "democracia" não deixar, em caso algum, mudar, o que bem vistas as coisas é até muito (mas mesmo muito!) diferente, ham?

Eu ainda um dia volto a falar disto, do modo como a propriedade que, na natureza, é um 'modo de vida' passou a constituir (a meu ver, pelo menos) em muitos casos, um modo de morte, nas sociedades humanas, ditas modernas e, ainda por cima, civilizadas!...

Agora queria mesmo era falar-vos (ou falar-me, se calhar é mais falar-me mas enfim, é como o "outro" que diz, eu já estou por tudo!...) daquilo que agora anda para aí a ser dito e feito em nome da defesa da propriedade intelectual. A gente liga uma televisão e leva logo com um "painel" de "Vossas Excelências" (como diria o O'Neill) a perorar, alto-e-bom-som, em nome da "defesa da música e dos artistas portugueses" et al.

Esses são o "braço legal" da ASAE---a qual, por sua vez, opera aí como o "braço armado" do politicamente correcto (E, porra, pá! Quem é que tem coragem de dizer que quer ver "morrer" a música portuguesa?! Vocês já imaginaram um Portugal sem Marcos Paulos, Tonis Carreiras e Toys??!! Sem Lopes Graças e Zecas Afonsos, ainda vá que não vá, pá. O que não falta para aí é comunas e não foi certamente sem se ter aconselhado previamente muito bem com Deus, de quem é íntimo, que aquele fulano dos bigodes fez a todos nós o favor de "despedir o Saramago" (que era para haver espaço para o Rodrigo Guedes de Carvalho, o último livro da Mónica Sintra e, se sobejasse algum, para as novelas da TVI, que isso sim, é cultura e da boa!

Porra, pá, eu nem consigo imaginar! Era---sei lá!---como ver Lisboa sem bandeiras portuguesas nas janelas ou um serão em família sem a galhofa que é ver o Marcelo Rebelo de Sousa a debitar disparates com aqueles trejeitos de Jerry Lewis e a outra gaja, muito séria, a conter heroicamente o riso como se acreditasse realmente naquilo que o tipo está a dizer! Era o fim da civilização do copo de vinho e dos livros do Sousa Tavares, pá! Nem é bom pensar! É sacrilégio, porra, pá, não me lixem e isso tudo!)

Não mas do que eu queria mesmo falar era disto: vocês já imginaram irem comprar um telemóvel e o gajo da loja ler-vos logo ali o catecismo: "Você leva isto mas veja lá! Não empresta a ninguém, não deixa os vizinhos falar, não liga para aquela gaja boazona do quinto com quem você sonha um dia agasalhar o palhaço, nada! Fala o meu amigo e é um pau, ham?

"Ah mas eu paguei, é meu et al!..."---diz você, assim a medo...

"Pagou e pagou bem---senão ia preso. Pagou e é seu mas não convém abusar, ham?... Quer dizer: você lá porque pagou já pensava que isto era roupa de franceses, não?! Se calhar também queria ouvir o que lhe dizem do outro lado, não?! Olha-me este, olha!"

Ou ir comprar o "carrito da sua vida" e o respectivo vendedor ler-lhe a sina: "Pshht, oh meu amigo, você leva o carrinho mas atenção! Agora veja lá bem quem é que mete cá dentro, ham? Isto não é para levar aqui gajas boas a passear, vizinhos para o trabalho, dar boleia a estranhos, nada! Vai sozinho e é um pau! Ah e não pode vender isto a ninguém, ham? Vender, alugar, levar estranhos aqui é mentira, ham? Veja lá! Veja lá se quer que lhe saia a sorte grande!"


Vocês estão-se a rir? Mas isto não é para rir! A maneira como, hoje-por-hoje, se põe, quer em termos de 'politicamente correcto', quer em termos de acção policial concreta, a questão da propriedade dita intelectual (por que carga de água não assumem os tipos de vez que aquilo que está em causa é o negócio e nada mais e vêm com aquela lenga-lenga da Arte e dos "artistas" a ver se a gente escorrega mais depressa?!) configura, a meu ver, um abuso, um verdadeiro aborto jurídico, em que apenas um dos lados da propriedade está consagrada e devora leoninamente a outra. Se eu, por exemplo, quiser convidar um grupo de amigos para verem, em minha casa, um filme que comprei, estou tecnicamente (de acordo com aquela legenda que passa no início) a cometer um delito que me pode custar caro.

Ou seja, eu não comprei verdadeiramente a cassete ou o DVD.

O Direito dos poderosos intereses editoriais ali plasmado criou, na prática (e tem, até uma polícia para concretizá-lo) uma espécie de mutação tácita, isto é, não-escrita do direito constitucional dos cidadãos à propriedade de acordo com o qual estes podem usar dentro de certos limites (ou de certas limitações cujo fundamento em termos de legitimidade jurídica me levanta, com toda a franqueza, enquanto cidadão, um número infinito de dúvidas) certos objectos que supostamente adquiriram mas têm de aceitar ver essa propriedade que devia ser real sua permanentemente tutelada, sabe Deus com que substância ou verdadeiro fundamento jurídico por outrem.

O que acontece nesse tipo de "compra" ou nesse paradigma de "propriedade" é que um dos Direitos presentes (um autêntico meta-Direito, pois) invade de modo completamente abusivo e ilegítimo as fronteiras do outro e continua operar aí, onde já deviam ter cessado todas as formas de qualquer suposto poder seu sobre o objecto, neste caso e por isso mesmo, falsamente, transaccionado.

Ou seja, na prática, ninguém vendeu e ninguém comprou nada. Se compararmos com o que se passa com os telemóveis e os livros, é fácil perceber que ninguém comprou nem vendeu, como disse, realmente coisa alguma.

O que acontece é que um suposto comprador ganhou alguns direitos sobre um objecto relativamente ao qual, todavia, em termos práticos (e até legais, jurídicos) não deixou de agir o peso de um Direito ilegitimamente concorrente alheio que é, na circunstância "contrabandeado" para o interior dos direitos ou do Direito do apenas alegado comprador.


A minha proposta é, então, que cada um de nós reflicta muito bem sobre toda esta problemática e esta "democracia" que é usada para fomentar modalidades profundamente discutíveis de ultra-valia de certos objectos; que o faça de modo a estar sempre "de pé legitimamente atrás" quando um grupo de tribunos bem pensantes vier junto de si cantar-lhe a "canção do bandido" dos "direitos dos artistas" ou da "sobrevivência da pobre música portuguesa"...

É que, pelos vistos, também nisto de "propriedade burguesa" há os que a têm e os que, sobretudo, a vêem ter...

domingo, 27 de janeiro de 2008

"Diamante de Sangue"


Vi-o recentemente.

Devo confessar que tinha do Edward Zwiek, o realizador, a pior das impressões.

Vi "O Último Samurai" e achei-o simplesmente intragável!

Mas não é, de facto, fácil fazer filmes "históricos"! Há o Rossellini, claro, que fez "A Tomada do Poder por Luís XIV", há o Hawks que fez a "Terra de Faraós" com a 'ajuda' do Faulkner que começou, segundo o próprio (o próprio Hawks), por ser a "estória" da construção de um aeródromo na... China durante a 2ª Guerra e acabou como a da construção de uma pirâmide no Egipto dos faraós, um filme onde o Hawks quis "escrever" a "crónica" "daquilo que o Homem, servindo-se só das mãos, é capaz de fazer com areia e pedra", como ele próprio diz numa entrevista.

isso, há "Intolerance" e "Birth of a Nation" daquele "facho" de génio que era o Griffith e algumas coisas mais---mas geralmente a "coisa" fica-se ali por aquele nível rasteirinho e farfalhudo da "Cleópatra" e dos "Dez Mandamentos" ou, entre nós, do "Chaimite" e agora, mais recentemente, da "Inês de Portugal"...

Ah, pois, mas estava a falar do tal "Diamante"...

Pois surpreendeu-me.

Conquistou-me.

Ganhou-me.

Eu diria: é naquilo que a indústria dos "américas" é inigualável. Na construção de solidíssimos «objectos narrativos» que, ainda por cima, não envergonham nem ideológica nem em geral politicamente ninguém: nem quem os faz nem quem os vê.

"Aquilo" em si mesmo não resolve nada? Pois não!

Não resolve nada e ainda ganha dinheiro "à pala" disso? Pois ganha!

Mas dá um contributo potencialmente importantíssimo para quem quiser, se quiser, quando quiser, começar a resolver----o que já não é nada mau!

É como aquela "estória" dos campos de concentração: no caso d' "O Diamante..." depois de ver aquilo (onde é que os tipos vão desencantar actores como o Don Cheadle, do "Hotel Ruanda" e agora Djimon Hounsou, aquele actor que faz de "Solomon Vandy" e que é um actor fabuloso?!...) ninguém pode dizer que "não sabia" ou que "talvez não seja bem assim".

Eh, pá! Está ali para quem quer ver!

Se a gente quiser acabar com o "neo-colonialismo dourado" tipo-Cimeira Europa-África já sabe por onde começar.

Mais: sabe PORQUÊ começar.

É claro que, se a gente começar mesmo, lá têm os tipos de voltar a chamar o De Mille e esses fulanos todos mas, enquanto isso não se passa, é aproveitar, rapaziada!

É ver e perceber!

É perceber que não é a África que está errada.

Ou que, se está, não está errada... sozinha.

A África está errada, em larguíssima medida, porque é do interesse da "Europa" que ela permaneça incapaz de transformar as suas próprias riquezas em produtos de modo a não deixar, em caso algum, de permanecer sempre exportadora de matérias-primas, numa fase, e compradora dos produtos que não 'deve' ser capaz de produzir ela mesma, noutra.

É tão simples quanto isso!

Há uma personagem no filme que diz, por estas ou por outras palavras, esta coisa verdadeiramente espantosa: "Que Deus não nos dê, um dia, a desgraça de termos petróleo, também!..."

Em termos cinematográficos, o filme é "A Desaparecida" ("The Searchers") do Ford vista a quatro décadas (e muitos anos, muita prática de cinismo cultu(r)al e político ou de... "filha-da-putice civilizacional e, sobretudo, pós-civilizacional"!...) de distância...
A "Debbie", hoje chama-se, "Dia" e é um miúdo negro notável, o velho "Ethan" é aqui "Danny Archer" a personagem de Di Caprio e "Martin Pawley", feito no filme do Ford pelo Jeffrey Hunter, é, neste caso, "Solomon Vandy", Djimon Hounsou, o tal actor negro de que falava atrás. No essencial, a "estória" é a mesma. E até um fulano como eu (que tende mais ou menos instintivamente a ser parcial em relação a tipos como o velho Ford...) tem de reconhecer que, por muito grande realizador que este tenha sido (e foi, inquestionavelmente!) o Zwick, o Zwik de "Diamante de Sangue", não tem nada que se envergonhar por ter feito este "remake clandestino" da obra-prima do Mestre, muito longe da qual, é preciso ter a lucidez e a coragem de reconhecer, não fica, com certeza. ´

[Na imagem: o actor Djimoun Hounsou, do elenco de "Blood Diamond"]

Lapso de...QUÊ??!!

"Lapso de activação cognicional".
Vou agora falar (ou falar-me?) dele.
Trata-se de um conceito que fui continuamente re/formulando e re/experimentando (sucessivamente re/consolidando) ao longo da minha própria prática profissional e que se contrapõe (que se opõe! Que eu concebi não propriamente para se opor mas, em qualquer caso, opondo-se!) ao tão idiótico quanto paternalista "motivacionismo bem-pensante oficial", ao "motivacionismus oficialis", tendência Daniel Sampaio e Eduardo Sá.
Fundamentalista e impraticável, portanto.
Ora, este "motivacionismo" é, diria eu, o suporte teórico (ou teorético--não diurético, teorético!...) electivo do pós-escola.
Ou seja: durante décadas a fio, foi existindo sempre uma conjunção mais ou menos global e "operativamente burguesa" ou "burguêsmente operativa" entre a "produção escolar" e a produção tout court.
Inserida de forma angular e/ou verticial entre ambas, a Escola era um elemento orgânico fulcral, senão em todos os casos no que respeita à activação dos mecanismos de mobilidade económica e social, pelo menos num número significativo deles.
E quando não... "mobilizava", mantinha, conservava, perpetuava---o que, de um certo ponto de vista 'estabilizador' lato, já não era mau e sugeria, na perfeição possível, a operatividade global do sistema.
Isto é, se não fazia do filho de cada barbeiro ou de cada merceeiro um arquitecto ou um caixa de banco, permitia, ao menos, aos filhos dos médicos permanecerem no patamar económico e social dos papás, outro tanto acontecendo com os dos advogados, professores, engenheiros, etc.
A outro nível, possibilitava, por exemplo, aos filhos da "ganga", da "ferrugem", com muito esforço e sacrifício, se estudassem "à noite", virem a ser contínuos de bancos ou de companhias de seguros.
Subvertia isto o rígido sistema de castas sobre o qual assentou (e no qual cevou ampla e vorazmente) o velho fascismo "descafeinado" à portuguesa?
Era bom, era... mas não.
Não subverteu coisa alguma (senão "ia preso"...): acomodou um pouco a injustiça e deu um jeitinho, em larguíssima medida, aparente às desigualdades estruturais do sistema.
Para muitos, durante muito tempo, foi, como se sabe, o que bastou.
Foram os pós-modernos, os neo-liberais "sociais" que se esconderam (que vieram "de contrabando"...) no fluxo da Revolução quem trouxe para a História entre nós os primeiros paradigmas reconhecíveis de inorganicidade na relação cada vez mais disfuncional e inorgânica entre a "produção escolar" e a produção tout court.
Concebendo a "democracia" (a "arquitectura demomórfica" da mesma...) como uma espécie de mero revestimento exterior, (im) puramente 'funcional' da economia (daí o ser possível chamar ao regime rigidamente imutável sob o qual vivemos "economocracia"), os tais neo-liberais "sociais" rapidamente perceberam que o povo "era uma chatice" das grandes e que a Nação podia perfeitamente passar sem ele se conseguisse convencê-lo de que o que fazia (institucional ou realmente!) com esse objectivo era "para bem dele".
Ou seja, que se poupava muito mais fingindo não vê-lo quando ele dava sinais de começar a "miar" pedindo coisas como Saúde, Educação ou Justiça do que tratando-o ou educando-o deveras (sai caro educá-lo e depois para que serve a gente estar a fazer isso se não precisa verdadeiramente hoje-por-hoje dele para produzir---embora ainda não se tenha inventado maneira de, a jusante, substituir o "mercado" por máquinas, o que é uma chatice danada e não dá jeito nenhum!...).
A Escola "motivacional" (regressando, então, a ela) resulta daí, desse "encolhimento" drástico da velha Escola "burguesa", quando esta começou a deixar de ser economicamente (não vou dizer "capitalisticamente", senão ainda me prendem ou arranjam maneira de me baixar a reforma...) funcional do ponto-de-vista da re/produção orgânica ou sistémica de Capital.
Se a Escola, a escolaridade, o conhecimento por ela veiculado deixou de contar como factor essencial de produção mas se, por outro lado, as tarefas de garantir a persistência global da ficção de uma "democracia" (pronto! Não resisto! Tenho de dizer:) as tarefas associadas ao objectivo de assegurar a persistência exterior de uma ficção "democapitalista" mais ou menos estável ou estabilizada exigiam que o "serviço nacional educativo" se mantivesse como "direito do povo"; se assim era, dizia, o remédio era (re) inventar uma Escola que produzisse "exclusivamente para si própria", isto é, que contivesse o seu próprio fim ou que se bastasse (ou que se fosse bastando) por inteiro a si mesma.
Ou seja: o povo é dispensável?
Interfere com a produção?
"Sai caro?", isto é, "sai caro ter" um "povo"?
Mete-se na Escola a "marinar" ou a "tomar sal"!
Cria-se a "ilusão perfeita" da Democracia e vai-se "par dessus le marché" mantendo a parte mais jovem do "povo" (pelo menos, essa! As outras, logo se vê!) fora do caminho da produção e fora, claro, das estatísticas do desemprego!
Mas para manter os "putos" presos numa Escola que não lhes serve rigorosamente para coisa alguma, é preciso criar a ilusão pedagógico-didáctica da "felicidade educativa" ou da "felicidade educacional" perfeita.
Imediata.
Instantânea como os pudins e aqueles cafés que amargam muito.
Isto é, é preciso criar a ilusão da Escola como grande FNAT sem janelas para a realidade.
Ou sem outras "janelas" senão a "alegria" e a "felicidade de cartão" que vêm da ilusão de se ser "o coração, o núcleo vivo do próprio esforço educativo no seu todo".
No Maio de 68 gritava-se que era "preciso ser realista e exigir o impossível"?
Pois bem, o neo-liberalismo escolar inventou, cunhou, o seu próprio grito de guerra, à semelhança desse.
É: "a realidade é ilegal"
É vital que a "juventude do regime" não olhe, em caso algum, a direito para ela senão, coitadinha, pode cegar!
Em '74, havia em Portugal um fulano muito castiço chamado Leonel Santos (autor de um livro que intitulou com a truculência característica do radicalismo senão da simples estupidez, "Nós, Povo") onde defendia a tese de que "se o povo não percebe a realidade, tanto pior para ela".
"Vai à faca".
Ao "bûcher", como a Joana d'Arc.
Corta-se à medida.
Era a ideia que o autor fazia do maoísmo...
...E como muitos ex-maoístas são hoje respeitabilísimos comissários "europeus" e coisas assim, essa (in) visão da realidade terá vindo com eles para a direita do sistema.
A realidade nas escolas "atrapalha"?
Corta-se! Refaz-se! Encurta-se nas mangas!
É preciso é manter, a todo o custo, estavelmente, a ilusão de que se está a aprender "qualquer coisa"---e que sempre que "for gira", a "Educação" é "boa".
Vestir a "Educação" "de giro" chama-se "motivar".
Ora, o "meu" lapso de activação cognicional diz exactamente o contrário: diz que a única boa liberdade é a que sabe permanecer, em todos os casos, uma autêntica e genuína teoria da realidade e que as "leis" desta são precisamente aquilo que baliza, com o rigor e a necessidade epistemologicamente exigíveis, a arquitectura (vou dizer assim:) ideal das nossas concepções básicas e essenciais de liberdade.
Que não é por mera vontade e muito menos capricho do desejo humano que a realidade passa a operar desta ou daquela maneira de modo a podermos todos "entendê-la" e apreendê-la "em tempo real".
Que é preciso, pelo contrário, integrar nas tarefas pedagógicas e didácticas essenciais uma componente estrutural de humildade intelectiva ou intelecccional que, conferindo fundamento epistemologicamente substantivo, à autoridade do/discente permita perceber que nem sempre a "essência da realidade" e o grau de maturidade intelectiva ou inteleccional de cada um vão a par e que há, por vezes, que ter a humildade de, a fim de evitar mutilar arbitrariamente a própria realidade, de alguma coisa, provavelmente essencial, do seu próprio funcionamento lógico e natural, "armazenar" ocasionalmente informação que, só mais tarde, "despertará" por completo para as tarefas de organização da relação essencial de cada um com a própria realidade enquanto tal.
Ou seja, que não é vergonha nenhuma nem mal algum aceitar a "autoridade significada"; a autoridade fundamentada; a autoridade epistemológica e, portanto, também politicamente substanciada da instituição escolar quando esta diz que este conhecimento deve surgir neste momento preciso das operações ínsitas à aprendizagem, à EDUCAÇÃO sem que um reinvestimento específico e concreto do conteúdo em causa seja necessariamente operável ou realizável no imediato.
Mas a todas estas questões havemos de voltar brevemente---e com mais detalhe neste ou naquele aspecto.
Por agora, já terei escrito o bastante para dar a mim próprio (não é essa, por definição, a lógica típica do pensamento blog como tal?) que pensar durante uma boa horinha ou duas!
Até breve, pois!

Lembrei-me agora de "uma": uma adivinha para blog-readers perspicazes e com certos conhecimentos de "música de intervenção"...


O Zeca, o Zeca Afonso, tem, como sabem, uma canção chamada "Os Vampiros", não é?

E o Sérgio Godinho e o Zé Mário (o grande Zé Mário: o maior depois do Zeca!), uma outra cujo título é "O Charlatão", certo?

Pois eu aposto que, se o Zeca pudese voltar e o Zé Mário quisesse, ainda havíamos de ter uma terceira chamada... "Os Cipaios".

Não é por nada mas parece-me...

"Tropas Indígenas", "Comandos Locais" parece-me pouco eufónico, é mais tipo-Tino Flores...

E mais não digo---que o "outro" também era professor e lixou-se!...

" Gente gira" [é outra coisa!]...


Num daqueles estranhíssimos "onvis impressos" que ninguém lê e com que agora deu aos jornais para nos bombardearem (leia-se: que custam "os olhos da cara" às florestas de todo o mundo, além, claro, dessa curiosíssima particularidade que invariavelmente possuem de não servirem rigorosamente para nada a não ser para dar trabalho aos tipos da Resin ou lá como é que se chama aquilo que passa a vida a levantar contentores de todas as cores e a poluir ainda mais as ruas das nossas cidades com camiões tão velhos como "àquilo que a gente faz de cócoras"...); numa dessas coisas impressas em "off side" ou "off set" ou lá o que é e que se pegam hoje-por-hoje aos jornais e dão uma trabalheira para levar para casa, pois, ia eu dizendo, dei, um dia destes com um texto intitulado "Menos tabaco=mais desemprego".

O tal "ovni" chama-se ambiciosa (ou talvez: misteriosa?) mente "perspectiva" (assim mesmo, "à... Saramago" com minúscula) e o tal "artigo" vinha, então, fazer-se publicamente eco da "preocupação" e (claro!) da "indignação" (cívica, com certeza! Social e talvez mesmo pró-sindical, sem dúvida: não está lá a insinuaçãozinha dos "postos de trabalho" e essa coisa toda?...) dos donos de uns quantos bares da zona do Porto reunidos em concílio ou conclave ou lá o que é por verem "reduzida", dizem eles (e que parece significativamente!) a respectiva "clientelle".

Pois...

Podiam ver a "coisa" ao contrário, não é?

Assim tipo: cada fabiano que deixa de abancar num desses locais de cultura em resultado de ter aproveitado o (imprevisto) acesso de bom senso do poder político para deixar "cair" de vez o viciozinho da passa (da passa "boa", claro! Da passa "limpa" que até tem, para a advogar, prosélitos que são ao mesmo tempo fumadores e respeitadísimos cirurgiões assim como génios literários de profissão além de sumarentos artigos de fundo em tudo quanto é jornal); ou seja, cada fabiano que "viu de repente a luz" dos bons hábitos inalatórios por causa disso e não em consequência, por exemplo, desse pós-moderníssimo desporto nocturno que consiste em abater noctívagos a tiro de RPG à porta de bares e discotecas ou discoquecas ou como é que chamam àquilo; cada tipo desses, pois, que agora fica em casa a ver o cérebro a apodrecer gradualmnte com as novelas da TVI ou os sermões do Marcelo, é, afinal (o diabo não está sempre atrás da porta e nem tudo é Sócrates na vida não é?...) menos um que se arrisca a ficar a falar como o Sousa Tavares antes de se ir juntar de vez aos antepassados num "paraíso qualquer perto de si"...

Mas não: a luta dos donos dos bares é, como disse, decididamente mais "para o" sindical: morre mais gente mas é um descanso: tudo empregado, tudo com o "postinho de trabalho" garantido, ali, a sniffar SG ventil por tudo quanto é orifício do corpo mas tudo bonito, tudo bom, tudo "democrático" e "livre", cada um a exercer os seus direitos, "morte ao fascismo higiénico, pá!" et al...

Esta gente é muito 'gira'!

Faz-me pensar que, um dia, ainda havemos, se calhar, de ver e ouvir os donos das leitarias chungosas da Rua da Palma (o que fizeram à "minha" velhinha e tão burguesinha, tão compostinha, Almirante Reis, meu Deus!...) unidos aos das cavilosas hospedarias da Meia Laranja (ou talvez seja ao contrário, não sei: para o caso tanto dá!...) a juntarem dinheiro para pagarem um espaçozinho publicitário num jornal qualquer onde possam "exigir" o regresso dos drogados ao Casal Ventoso e o apoio das autoridades aos passadores do Intendente (talvez um "espaço dedicado ao consumo legal da branquinha e do equídeo", sei lá...) em nome dos "postos de trabalho" dos fabricantes de bolas-de-berlim com caca-das-unhas de quem as fez no vão de escada lá do prédio ou dos empregos das vacas que dão o leitinho para aqueles "panachés" de lactose e "suco de EPAL" que eram o cartão-de-visita das leitarias de antigamente!...

Progresso? Saúde? Juizinho na mona e vergonha (cívica) na carinha?

Eh, pá, não me lixem! Estamos a falar de coisas sérias!

Tipo "postos de trabalho", "alicerces do aumento da taxa de desemprego" e coisas assim!




sábado, 26 de janeiro de 2008

Explicação da designação do próprio blog


O meu gosto pelas viagens (pelas viagens, quer dizer: pelas viagens que o salário de professor--no tempo em que os havia--tornava possíveis...) levou-me a ter um razoável conhecimento da Europa mais próxima--muito antes de haver "Europa" (que era, afinal, exactamente quando havia Europa mas enfim!...)
Conheço razoavelmente a Andaluzia (a Espanha "sanguínea e africana"...); conheço (um pouco menos bem, admito) a Espanha "germânica" (Catalunha e Países Bascos); e conheço (como dizer?) assim-assim-para-o-meu-gosto (que era conhecer a fundo) a Espanha rústica e seminal: a Galiza.
Conheço de lá ter vivido a Holanda, a Bélgica e esse Portugal ideal e perfeito que foi, para a minha geração, a França.
Sempre me gabei de fazer um turismo orgulhosamente "contra-corrente": evitava os hotéis (mesmo aqueles que podia, se quisesse, pagar: detesto a "gentileza de hoteleiro" (que é o nome "fino" que a abjecção e a subserviência mais vis tomam quando se está perto do mar...); fugia (como o diabo da cruz!) dos campings "com court de ténis e piscina" com a mesma convicção e a mesma rapidez com que fujo dos livros do Sousa Tavares e das homilias do Marcelo) e fazia absoluta questão de viajar sem itinerário.
Cheguei a planear (vagamente! Vagamente! Sempre planeei vagamente: é a única maneira de planear sem que isso se transforme num dever e, pior ainda, numa vocação...); cheguei, dizia, a planear sair de Lisboa para ir a Paris, derivar para sul e acabar não passando de Córdoba!... Foi maravilhoso! (Para alguma coisa sou Aquário, não?...)
Conheço de Paris (onde, como disse, vivi nesse ventrudo "Alto do Pina maiorzinho" que é ou era Montparnasse-Bienvenu...), a Torre (não preciso de dizer qual, pois não?...) e essas "coisas" todas mas conheço também as catacumbas, o Père Lachaise, a casa de Balzac e mais uma série de coisas que a maior parte das pessoas que conheço... não conhecem e "até têm raiva a quem conhece"...
De Bruxelas (para onde as gracinhas e, sobretudo, os delírios imperiais de um regime de "velhas damas políticas" ou "de velhas gaiteiras da política" me empandeiraram em tempos) cheguei a conhecer um a um (e não é exagero, ham?!...) os buracos de algumas ruas que percorri, vezes sem conta, aos comandos de um eléctrico que parecia um avião e com quem mantinha excelentes relações porque era quem, nesse tempo, me dava, afinal, de comer e de beber, a mim e à minha companheira de desventuras.
Bom, mas isto para dizer o seguinte: houve em todos esses lugares um sítio que NUNCA deixei de visitar: a Escola ou o Liceu locais.
Lembro-me de estar em Estrasburgo com um grupo de alunos e colegas e, enquanto eles iam ver o "não-sei-quantos-europeu" corria eu, "avenida qualquer-coisa" acima, em busca do liceu!
Um dia, farta de se esgueirar por portões dos mais inverosímeis liceus e escolas por esse mundo fora, a minha mulher saiu-se com esta: "Como é que era aquela doença de que o teu pai (o meu pai, que já faleceu, era veterinário: é preciso explicar isto para se perceber a "coisa") estava sempre a falar?

O "quisto hidático", não era?

Pois, olha, tu deves ter uma variante dessa doença: dever sofrer de um quisto... didáctico!"
E "quisto didáctico" ficou para sempre a minha doença "de eleição".
É uma expressão fabulosa, verdadeiramente genial!
Todos quantos por amor a uma profissão (hoje morta) comungam dessa doença talvez incurável de querer ver o próximo saber (o pouco, embora) que eles mesmos sabem; todos quantos sonham que Portugal possa, um dia, ter também Políticos, um Governo e um ministro da Educação como alguns países civilizados já hoje têm, ou seja, todos quantos partilham , por isso, (leia-se: por imperativo de consciência: pessoal, profissional e até civilizacional) o desprezo e o profundo asco que é devido às imitaçõezecas baratas (bem, baratas é como quem diz, não é?...) de qualquer dessas coisas; todos quantos, pois, numa palavra, mau grado as instituições, se obstinam em ser, apesar de tudo, professores conhecem, claro, os sintomas: a gente lê um livro e pensa: "Isto era giro era para uma aula sobre tal ou tal assunto".
Vê um filme e pensa: "Se se pudesse passar isto na escola podia perfeitamente servir para dar aquela ou aquela matéria".
E assim por diante.
Vinte e quatro (ou mesmo vinte e cinco ou vinte e seis...) horas por dia, estamos a "pensar escola", a "raciocinar escola", a "respirar escola".
Todos temos, afinal, o... "quisto didáctico".
Pois este blog é para eles.
Beijinhos!
Escrevam.

[Na imagem: a gare de Port Bou onde a minha relação com a espécie humana por razões que talvez, um dia, aqui recorde, ganhou um grande e decisivo impulso... Ao fundo, o túnel que liga Port Bou a Cérbere]