Desde que Henrique Medina Carreira, antigo ministro das finanças de um governo Soares, se referiu ao pessoal político dos dois maiores partidos políticos do espectro partidário nacional, com a drástica fórmula que dizia: "essa gente é um nojo" ["Essa gente??!! Mas essa gente é um nohjo!!] que se me tornou, confesso, especialmente difícil (por muito "simpático" e generoso que, para com a maioria dos políticos nacionais, pretendesse ser...) encontrar modo mais eloquente, ainda que indiscutivelmente brutal, de qualificá-los.
Devo esclarecer que coincido com o impiedoso "crítico" dos políticos do "establishment" partidário nacional, desde logo, na [evidente!] indignação e ["sonoríssima!] revolta relativamente ao modo como, de facto, aqueles que parecem ter "tomado de concessão" esse mesmo espectro---"pê-ésses" e "pê-pê-dês"---vêm, há muito, contribuindo, por inércia e pura inépcia, para, leviana e irresponsavelmente, bloquear sine die qualquer hipótese, mesmo remota, de modernização estrutural do País, trocando teimosamente as tarefas necessárias à realização desse desiderato nacional (que, se calhar, é até, cada vez mais, civilizacional) por todo um acervo ou parafernália de... "causas" onde o urgente debate colectivo sobre o que para muitos é já a questão essencial da viabilidade futura do País continua obstinadamente a naufragar.
Um dos iens básicos a considerar incontornavelmente naquele debate [que, repito, para "esta gente" parece representar um mero fait-divers por oposição a questões, essas sim, para "esta gente" questões-chave como a da co-avaliação dos professores pelos chamados 'encarregados de educação' [!!]] e/ou outras que, pura e simplesmente o não são como a das uniões ditas "de facto" e a que envolve o "casamento dos homossexuais" que são, afinal, na realidade, nestes dois últimos casos, coisas tão evidentes que nem deveriam ser objecto de "debate"]; um dos itens básicopas da verdadeuira discussão, dizia, prende-se com a questão ou questões da Educação e da educatividade, em Portugal, hoje.
Questão consistente [e persistentemente!] mistificada por gente que, se não é, como afirma Carreira, o tal "nojo" é seguramente de uma incompetência e falta de visão histórica e [não me canso de dizer] civilizacional que arrepia [Maria de Lurdes Rodrigues ou Maria do Carmo Seabra, as duas últimas ministras da educação, por exemplo e para não irmos mais longe, foram verdadeiros "aleijões técnicos e políticos que ilustram, afinal, na sua trágica perfeição a asserção de Carreira...]; questão persistentemente mistificada, dizia, ela é-o precisdamente na medida em que parte invariavelmente da des-consideração e des-peercepção da verdade básica de que todo e qualquer modelo ou paradigma de educatividade parte de uma situação de objectiva e dialéctica des-iogualdade configurável numa fórmula:
1. a 'educação', qualquer variante da relação educacional básica e nuclear genuína, existe porque um ou uns sabe[m] aquilo que outros não sabem.
2. a 'educação' [repito: qualquer variante do modelo educacionalbásico e genuíno] existe para que essa desigualicidade tética venha a ser anulada a prazo constituindo essa "anulação" ou "superação dialéctica" o objectivo mesmo da prática educacional e/ou educativa.
É versdade que um certo modelo de apropriação civilizacional e política do conhecimento tornou moderna e pós-modernamente "problemática" a relação objectiva da 'educação' e da respectiva utilidade técnica e social, por um lado e da 'educação' e, de um modo mais amplo e abstracto, dos paradigmas de apropriação e transformação crítica do real, por outro.
É verdade, dito de outro modo, que quando parte da sociedade tende a tornmar-se, como hoje acontece nas sociedades ditas "de capitalismo pós-industrial" excrescencial e redundante, próprias educação, tal como a concebíamos [se é preciso fixar uma data de referência] desde a Revolução Francesa se tornou, com ela, ela mesma potencial (ou mesmo realmente!) excedentária.
Ainda assim não há como "dar a volta" a isto: só há 'educação', repito, quando e, sobretudo, porque há uma reconhecível desigualdade inicial entre os indivíduos; só se justifica que a haja quando e porque as comunidades humanas [e até, num certo sentido, animais, em geral] estabelecem como objectivo, de um modo ou de outro, básico de intervenção na História e/ou na realidade que deixe de as haver. O fundamento epistemológico essencial da "autoridade" vem daí: da capacidade ou aptidão circunstancial que alguns têm de mediar e implementar o processo de nivelamento estrutural que tem a 'educação' no seu vértice, digamos assim.
A "autoridade" nos modelos de 'educatividade orgânica' chamemos-lhes "tradicionais" [os que, de um modo ou de outro, sairam das teorizações dos filósofos revolucionários franceses] não se dissocia dessa capacidade e/ou dessa aptidão.
Representa uma componente instrumental, primeiro e simbológica, em seguida, do próprio processo e, por isso, é dele epistemologicamente indissociável.
Quando as tarefas de 'educar' passaram dos anciãos para a "Escola" a autoridade, a efectiva e objectual como a simbológica passaram com ela.
E é só quando a "Educação" se torna, primeiro, potencial, em seguida, realmente inorgânica relativamente à própria sociedade que a "autoridade" se torna "problema" ou ou "questão" [problema em si ou questão em si] e pode começar a ser consistentemente concebida fora da utilidade ou 'utilicidade' que a fundamentava e tornava orgânica com a Educação.
O que eu quero dizer como conclusão é, pois, numa palavra, o seguinte: apenas quando/se [1] reencontrarmos como civilização para a Educação uma [nova?] utilidade social e quando [2] o Conhecimento deixar de ser uma propriedade privada estr(e)itamente integrada no [anexada ou mesmo indexada ao] processo de gerar contínua e ulteriormente capital, poderemos ter esperança de veer consistemente resolvida a "questão" da "autoridade" nas [e das] escolas e poderá ser reposta [resgatada] o esquema básico da educatividade: aquele que passa, como disse, nuclear ou verticialmente por uma relação contínua e estrutural/estruturantemente dialéctica da des-igualdade básica entre os indivíduos de uma mesma comunidade e um projecto de igualicidade organizada em que a técnica ou o Técnico mandam fazer e a Política ou o Político operativizam e operacionalizam.
[Imagem extraída com a devida vénia de tevescopio.blogger.com.br]